COMBATE À VIOLÊNCIA

Com queda histórica de homicídios, o que o Espírito Santo tem a ensinar a Pernambuco?

Integração com municípios e com a sociedade civil organizada tem contribuído para queda dos números no estado que fica no Sudeste do País

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Cadastrado por

Raphael Guerra

Publicado em 16/04/2024 às 14:43 | Atualizado em 17/04/2024 às 12:18
Notícia

Apesar da criação de um novo programa de segurança pública e da promessa de mais investimentos na área, Pernambuco segue registrando alta nas mortes violentas intencionais. Entre janeiro e março deste ano, 989 pessoas foram mortas. O aumento foi de 9,16% em relação ao primeiro trimestre de 2023, quando 906 vidas foram perdidas. Na contramão, o Espírito Santo tem se destacado entre os estados brasileiros por causa da redução histórica dos homicídios. 

Ao longo de 2023, o Espírito Santo somou 967 assassinatos. O número é o menor desde 1996, quando o governo estadual passou a contabilizar as estatísticas. Houve uma queda de 47,59% em relação a 2010, quando foi criado o programa Estado Presente. Naquele ano, o Estado somava 1.845 mortes e tinha a segunda maior taxa de violência do País. Nesses números não estão incluídos os óbitos em decorrência da intervenção policial. 

A queda a partir de 2011 foi observada até 2017, quando ocorreu um pico de violência. Naquele ano, 1.408 pessoas foram assassinadas. Um aumento de 19% em relação a 2016. A estatística pode ser explicada pela greve da Polícia Militar, iniciada em fevereiro de 2017 e que durou 22 dias. Ao todo, 219 mortes foram somadas no período de paralisação. 

Nos dois anos seguintes, houve queda contínua dos números. Mas em 2020, com a chegada da pandemia da covid-19, houve um novo pico, com 1.107 assassinatos. Nos três anos seguintes, houve mais uma sequência de reduções. 

Interessante notar que o modelo de segurança pública adotado pelo Espírito Santo é muito parecido com o Pacto pela Vida, lançado em 2007 pelo então governador de Pernambuco, Eduardo Campos (PSB). 

"Temos três focos estratégicos: prisões de homicidas e traficantes, apreensões de armas de fogo e operações ostensivas. Nessas operações, são realizadas prisões a apreensões, mas elas também demonstram a presença do Estado. Além disso, fazemos análise permanente, com reuniões mensais para entender, em cada uma das cinco regiões integradas, qual eventualmente apresentou escalada da violência e o porquê. Um delegado e um comandante da PM são responsáveis por cada uma das áreas", explicou o delegado federal Eugênio Ricas, secretário da Segurança Pública e Defesa Social do Espírito Santo. 

Entre 2014 e 2022, foram investidos mais de R$ 500 milhões em segurança pública. 

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Eugênio Ricas, secretário da Segurança Pública e Defesa Social do Espírito Santo - DIVULGAÇÃO

Ricas disse que o Pacto pela Vida foi um dos programas que inspiraram o Estado Presente. Assim como em Pernambuco, o governador Renato Casagrande (PSB) participa de reuniões periódicas para acompanhar os resultados e tomar decisões em relação aos investimentos que devem ser feitos para atingir as metas. Nos encontros, o Poder Judiciário também está presente.

Desde fevereiro deste ano, após intensas críticas da oposição e de gestores do próprio governo, a governadora Raquel Lyra passou a fazer reuniões semanais de monitoramento das estatísticas da violência em Pernambuco

TECNOLOGIA E CÂMERAS

O delegado federal Eugênio Ricas pontuou que houve forte investimento em tecnologia no Espírito Santo e que isso resultou no aumento das prisões de criminosos. Só no monitoramento das rodovias, foram gastos R$ 140 milhões nos últimos anos. 

Em 2022, o governo lançou o Cerco Inteligente, um sistema integrado de monitoramento e combate aos crimes de trânsito, ambientais, fiscais e outros. A rede de câmeras transmite, em tempo real, a circulação de veículos em todo o Espírito Santo. 

Há 235 pontos de fiscalização e 967 câmeras ativas, segundo balanço divulgado no início do ano. Só em 2023, o Estado apreendeu 567 veículos nas rodovias. 

Desde dezembro de 2023, o governo de Pernambuco não conta com câmeras de videomonitoramento. Uma licitação deve ser lançada nas próximas semanas. Uma das promessas é de que parte dos novos equipamentos terá leitor de placas de veículos

INTEGRAÇÃO COM MUNICÍPIOS

Uma das propostas do Juntos pela Segurança, lançado pela governadora Raquel Lyra em novembro do ano passado, é melhorar a integração entre o governo de Pernambuco e os municípios, com foco na prevenção social - eixo mais que necessário para reduzir a situação de vulnerabilidade que atinge os mais jovens (principais vítimas da violência)

No Pacto pela Vida, houve acenos nas gestões de Eduardo Campos e de Paulo Câmara, mas não houve avanços concretos. Nem mesmo com o Recife, também governado por prefeitos do PSB desde 2013. 

No Espírito Santo, segundo Eugênio Ricas, foram criados gabinetes de gestão integrada municipais para melhorar a integração com cada prefeitura e realizar o monitoramento de ações importantes, principalmente no interior do Estado.

"Nas reuniões dos gabinetes, há a presença do delegado, do comandante da PM, do Ministério Público, do Judiciário, secretários municipais e também da sociedade civil organizada, o que é fundamental. E são tomadas decisões importantes. Um exemplo: festa que acaba com bebedeira e violência. O Ministério Público dá uma solução para isso. A questão da iluminação pública e da ampliação de câmeras também é observada", disse.

"O Estado Presente tem um foco na proteção social, com meta de redução da vulnerabilidade e na transformação dos territórios. Fizemos o mapeamento das áreas de maior vulnerabilidade social para a realização de ações necessárias, como mais escolas em tempo integral. Nossa preocupação é evitar que os jovens sejam cooptados para o crime", completou. 

Estatísticas da Secretaria de Defesa Social (SDS) revelam que 49% das pessoas assassinadas em Pernambuco, em 2023, tinham entre 18 e 30 anos. Além disso, 5% tinham entre 12 e 17 anos. Na maioria dos casos, as vítimas eram do sexo masculino e tinham ligação com atividades criminais - principalmente o tráfico de drogas. Por isso, a necessidade urgente de investimentos em prevenção social. 

RECOMPLETAMENTO DO EFETIVO POLICIAL

WELINGTON LIMA/JC IMAGEM
Ingresso de novos policiais militares é necessário para diminuir o déficit histórico em Pernambuco - WELINGTON LIMA/JC IMAGEM

Com uma população de pouco mais de 3,8 milhões de habitantes, segundo o Censo 2022, o Espírito Santo conta com quase 9 mil policiais militares - profissionais que trazem a sensação de segurança à população e reprimem os crimes nas ruas. Eugênio Ricas afirmou que o ideal seria chegar a 10 mil. 

"Temos 1.158 policiais na academia. Eles devem se formar em outubro. Também está em fase de planejamento outro concurso", disse.

Pernambuco tem mais de 9 milhões de habitantes. O efetivo da Polícia Militar é de pouco mais de 16 mil, mas o ideal seria pelo menos 27 mil. 

O Estado está realizando concurso público. A meta é convocar até 5.250 aprovados até o final de 2026, número ainda bem distante do necessário. 

SISTEMA PRISIONAL AINDA É DESAFIO NOS DOIS ESTADOS

Em Pernambuco e no Espírito Santo, o sistema prisional ainda é um desafio. E os problemas são os mesmos: superlotação e falta de controle do Estado para evitar a comunicação de presos com comparsas que estão em liberdade.

Há cerca de 29 mil detentos em regime fechado em Pernambuco, mas só há vagas para pouco mais de 15 mil. 

O secretário de Administração Penitenciária e Ressocialização, Paulo Paes, reforçou que o governo estadual vai manter a promessa de criar 7.950 novas vagas para diminuir a histórica superlotação no sistema prisional de Pernambuco.

"Até o final deste ano, a gente vai ter 1.923 vagas geradas no Estado", disse o gestor, em recente entrevista ao JC.

No Espírito Santo, a população carcerária é de 24 mil homens e mulheres. Mas só há espaço para 14 mil. "Houve um investimento grande. Nos últimos anos, 26 novas unidades foram construídas para diminuir esse déficit", alegou Eugênio Ricas. 

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