Opinião

Bolsa Gucci é vendida por R$ 22 mil no Roblox (e pode ter sido pechincha)

Depois de conferir se não foi seu filho que comprou, vale refletir sobre como o digital está mudando a percepção de valor e status dos itens virtuais. Leia a o opinião de Guilherme Ravache

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Guilherme Ravache

Publicado em 04/06/2021 às 6:42
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Tempos atrás escrevi sobre o Roblox e como ele poderia garantir o futuro emprego do seu filho. O game é uma febre entre as crianças. Agora, o jogo dá mais uma mostra de seu poder. Semana passada, uma bolsa Gucci foi vendida por R$ 22 mil dentro do Roblox. Detalhe, a bolsa é virtual e só pode ser usada dentro do próprio jogo. E mais, ela custa mais caro que o valor da mesma bolsa no mundo real.

Disponível por apenas uma hora em 17 de maio como parte da exposição virtual Gucci Garden, a bolsa Dionysus with Bee foi vendida originalmente por 475 Robux (equivalente a R$ 182) no site de jogos (Robux é a moeda virtual do jogo). Mas após a venda da bolsa, o mercado paralelo começou a negociar o item virtual por preços exorbitantes.

Muita gente se recusou a pagar os valores que estavam sendo cobrados, mas um usuário desembolsou cerca de 350.000 Robux, cerca de R$ 22 mil, para ter a bolsa virtual. Isso são R$ 4.320,00 a mais do que a bolsa Dionysus with Bee de verdade, que é vendida por R$17.680,00.

O fundador do Reddit, Alexis Ohanian, compartilhou no Twitter os valores, lembrando às pessoas que o acessório do jogo não tem valor monetário fora do domínio virtual da Roblox. “Lembre-se: esta bolsa Roblox não é um NFT e, portanto, não tem valor / uso / transferibilidade fora do mundo Roblox - mas vale mais do que a (versão) física. Observe este espaço”, escreveu.

 


Hoje, as pessoas pagam fortunas por itens virtuais. O game Fortnite faturou R$ 46 bilhões em dois anos (2018 e 2019) apenas vendendo acessórios para personagens dentro do game. Os items são meramente estéticos, não melhoram a performance dos personagens no game que tem mais de 350 milhões de usuários. Já a empresa dona do Roblox já vale mais de R$ 234 bilhões e deve pagar mais de R$ 2,6 bilhões para criadores de games (em boa parte pessoas comuns) que desenvolvem jogos dentro da plataforma.

Mas além dos games, há uma crescente oferta de memes, gifs, vídeos e trabalhos de arte virtuais sendo comercializados como NFTs por milhões de reais. Como já comentei aqui, os NFTs (Non Fungible Token ou tokens não fungíveis) são um novo tipo de ativo digital. É como se fosse uma carta Pokémon ou uma figurinha de álbum da Copa, mas como um certificado digital que garante sua autenticidade. A propriedade desses ativos é registrada em um blockchain — um registro digital semelhante às redes que sustentam o Bitcoin e outras criptomoedas.

Mas, ao contrário da maioria das moedas virtuais, você não pode trocar um NFT por outro da mesma forma que faria com dólares ou barras de ouro. Cada NFT é único e atua como um item de colecionador que não pode ser duplicado, o que os torna raros.

O NFT não impede que a imagem seja copiada e duplicada digitalmente - você ainda pode tirar uma captura de tela de uma obra de arte digital ou compartilhar um GIF do Nyan Cat - mas o NFT mostra quem é o "dono" de uma imagem original, da mesma forma que a imagem do seu RG contém seu nome, idade e um número de identificação. O fato de alguém copiar seu RG não a torna dona do seu RG. O princípio se aplica aqui para NFTs.

Note o potencial da ideia à medida que cada vez mais marcas decidem criar seus espaços e produtos virtuais/digitais. Você pode achar isso distante, mas não faz tanto tempo, poucos acreditavam que lojas virtuais poderiam ser maiores que lojas físicas. Mas veja o Amazon, um e-commerce avaliado em mais de R$ 8,3 trilhões que tirou do mercado dezenas de varejistas.

O valor de uma bolsa Gucci de milhares de reais não está atrelado à sua função. Uma sacola de supermercado pode ser usada como bolsa e custa centavos. O valor de uma marca de luxo está no status que ela confere e na sensação que proporciona para quem a usa. Pela mesma lógica, um punhado de pixels pode valer milhares e até milhões de reais pelo simples fato de dar status e deixar o dono feliz. E se esse item no futuro esse item pode valer mais, se torna inclusive um item colecionável.

À medida que mais pessoas passam mais tempo no mundo virtual, maior será a busca por status e símbolos de riqueza também no universo digital. Hoje, R$ 22 mil por uma bolsa Gucci parece caro, até uma loucura, mas se de fato ela se tornar um item de colecionador, valerá muito mais no futuro (ou terá valor zero, se a moda não pegar).

Como eu sempre digo, os empregos da próxima geração ainda estão sendo criados. Quem sabe seu filho no futuro não se torne um negociante de itens de luxo virtuais dentro do Roblox? Há pouco mais de uma década, se uma criança passasse horas no YouTube ou redes sociais e dissesse que ficaria rico trabalhando como influenciador, os pais ficariam preocupados. Bom, sabemos o que aconteceu.

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