A Morte de Emmet Till, tragédia racista virou canção de Bob Dylan

Um garoto de 14 anos brutalmente assassinado por dois brancos 55 anos antes de George Floyd
JoséTeles
Publicado em 12/06/2020 às 19:38
HOMENAGEM Bob Dylan compôs a canção movido pelo horror que cercou o assassinato do jovem negro Foto: DIVULGAÇÃO


The Death Of Emmett Till é uma das mais obscuras composições de Bob Dylan, ele a cantava em shows no inicio de carreira, mas nunca a incluiu em seus álbuns. A música foi criada à maneira das antigas baladas folk, que têm um pouco a ver com os folhetos de feira: eram reportagens de fatos e feitos marcantes. A melodia utilizada na canção é quase idêntica à de The House of the Rising Sun, de domínio publico, que está no disco de estreia de Dylan.
Porém o próprio Dylan, num programa de rádio, de 1962, que circula há décadas em discos não oficiais, revelou à apresentadora, Cynthia Gooding, que roubou a melodia de Len Chandler, um cantor folk negro (ainda vivo): “Ele usa uns acordes engraçados, e vive me ensinando os acordes dele. Veio me mostrar uma música e perguntou se eu tinha gostado dos acordes. Disse que gostei, e roubei”, disse o jovem Bob Dylan, então com 21 anos, nesse programa. Bob Dylan arvorava-se a um cantor folk nos moldes de um Peter Seeger, Woody Guthrie, seu ídolo. As canções podiam ser reaproveitadas com outra letra, ou mudanças na melodia. Blowing in the Wind, que sedimentou a fama de Dylan vem de uma canção folk chamada No More Auction Block, que ele conheceu num disco do grupo New World Singers.
A morte de Emmett Till foi um dos mais brutais assassinatos de um negro por brancos no Sul dos EUA, quando Bob Dylan, ainda era Robert Zimmerman, um estudante do ginásio, em Duluth, no Minnesota. Onde leu sobre o caso que provocou uma comoção nacional. Ele confessou que não teve estômago para olhar as fotos no jornal. Em agosto de 1955, Emmett, um adolescente de 14 anos, que morava em Chicago, foi passar as férias na casa de parentes em Money, no Mississippi. Ignorando o nível do racismo do Sul, ele foi comemorar bombons com amigos numa mercearia. Segundo moça da loja, de 21 anos, branca e casada, o garoto deu em cima dela. Anos mais tarde ela negaria o assédio.

O marido da moça e outro homem pegaram Emmett Till, o levaram para uma área rural e o massacraram Quebraram-lhe quase todos os ossos, mutilaram-lhe o rosto, deram-lhe um tiro na nuca, prenderam, com arame farpado, um pesado ventilador de cem quilos no pescoço do menino e o jogaram num rio. O corpo, no entanto foi encontrado. Emmett Till voltou para Chicago num caixão de aço.
A mãe do garoto não apenas denunciou o assassinato, como fez questão de que o corpo fosse velado num templo com a tampa do caixão aberta, para que todos vissem o estado do filho. As imagens do cadáver de Emmett Till foram tão chocantes que pessoas desmaiavam ao vê-lo. Fotos se espalharam pelo país, e suscitaram não apenas questionamentos sobre o racismo, como também sobre a própria democracia americana. A morte do garoto contribuiu para impulsionar o movimento pelos direitos civis nos EUA. Quando o crime aconteceu, Bob Dylan tinha a mesma idade de Emmett Till.
LETRA
A letra é longa, e contada no formato dos trovadores: “Aconteceu no Mississippi muito tempo atrás/quando um garoto de Chicago passou pela soleira de uma porta sulista/a terrível tragédia desse garoto, dela eu me lembro muito bem/negra era a cor de sua pele, e seu nome era Emmett Till”, a primeira das sete estrofes. A sétima: “Esta canção é só um lembrete para que nossos camaradas se lembrem/que este tipo de coisa permanece vida até hoje na Ku Klux Klan e suas roupas de fantasmas/ mas se todos nós que temos o mesmo pensamento, se a gente der tudo o que podemos/poderemos fazer desta nossa grande terra um lugar bem maior para se viver”

 

 

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