Um dos principais desafios do chamado coronavoucher é chegar, de maneira rápida, às mãos das mais de 30,5 milhões de pessoas que deverão ser beneficiadas pelo benefício proposto pelo governo federal. Porém, um dos entraves é que cerca de 45 milhões de pessoas não têm conta bancária ou não fizeram movimentações financeiras nos últimos seis meses. Ou seja, 29% da população brasileira é desbancarizada.
Os dados são de uma pesquisa do Instituto Locomotiva, realizada em 2019. O estudo traz dados ainda mais preocupantes: 86% dos desbancarizados estão nas classes C, D e E, público-alvo a ser beneficiado pela liberação do auxílio de R$ 600, por três meses, durante a pandemia do novo coronavírus.
» Acompanhe as últimas notícias sobre o novo coronavírus
» O drama de quem precisa ir ao banco no Recife em tempos de novo coronavírus
"O que a gente tem visto no último ano é um aumento crescente e gradual da bancarização dos brasileiros, mas ainda assim, temos 45 milhões de pessoas que não movimentam uma conta corrente ou conta poupança, ou sequer chegaram a abrir uma", comenta Renato Meirelles, presidente do Instituto Locomotiva. Ele pontua ainda que esse grupo chega a movimentar mais de R$ 800 bilhões por ano.
Meirelles ressalta ainda que, por não terem histórico bancário, muitas vezes, essas pessoas também não têm "crédito na praça" e isso impede que façam a economia girar por meio do consumo de bens duráveis e que poderiam ser comprados a prazo.
Como solução imediata para a questão do benefício a ser sancionado pelo presidente Jair Bolsonaro (sem partido), a empresa que é dona dos terminais do Banco24Horas, TecBan, anunciou ontem a criação uma nova função para o serviço de Saque Digital.
A medida permitirá que as pessoas possam sacar dinheiro nos 23 mil caixas eletrônicos espalhados no Brasil usando apenas o CPF e um código que deverá ser enviado ao celular do beneficiário do coronavoucher. Em Pernambuco são 750 caixas eletrônicos do Banco24Horas.
O head de novas plataformas da TecBan, Tiago Aguiar, explica que a solução oferecida pelo Saque Digital permite que órgãos do governo, bancos públicos e outras instituições financeiras enviem um código numérico para o beneficiário do auxílio governamental. "Criamos o novo Saque Digital como uma alternativa para minimizar a crise econômica do coronavírus", afirma. Vale ressaltar que o serviço já existia, por código QR, para o público bancarizado.
Na opinião de Bruno Diniz, especialista em inovação para o mercado financeiro e autor do livro 'O Fenômeno Fintech', esse tipo de medida deve desafogar as agências bancárias previstas para serem a ponte com os beneficiário do auxílio emergencial. "É preciso aguardar como o governo federal vai se posicionar sobre essa oferta da TecBan, mas não há dúvida que é uma medida que deve ter aderência", observa.
O especialista alerta que a aglomeração nas agências bancárias não é saudável neste momento de pandemia, mas admite que, além do fato das pessoas não terem conta bancária, outra grande parcela não se sente à vontade com as ferramentas tecnológicas. "As filas do bancos estão cheias de pessoas que ainda não têm o traquejo com as soluções tecnológicas. Isso é potencializado pelo fato dos bancos terem reduzido o quadro de funcionários e o horário de atendimento, o que faz muito sentido neste momento", ressalta Diniz.
Para ele, o governo federal deve ter cuidado ao criar as regras de recebimento do coronavoucher para impedir uma corrida dos beneficiários aos bancos. "Diz um ditado popular que o remédio, se dado da maneira errada, também pode matar", diz. Bruno Diniz pondera que este momento de isolamento social, porém, pode fazer acelerar o processo de inclusão digital dos usuários de banco, em especial os idosos.
"Em parte, o coronavírus tem acelerado a transformação digital das empresas e das relações de trabalho. Acredito que isso possa se refletir nas operações bancárias, já que as pessoas estão tentando resolver a vida de forma digital", analisa Bruno Diniz. Segundo pesquisa da Federação Brasileira de Bancos (Febraban), divulgada no passado com dados de 2018, seis em cada dez transações bancárias já eram realizadas pelo celular ou pelo computador.