Com a retomada da economia, vários estados e municípios, começam a permitir a reabertura das companhias. Em Pernambuco, por exemplo, alguns setores da economia já voltaram a funcionar de maneira parcial ou integral. Com isso, muitas pessoas estão deixando o home office e regressando ao trabalho presencial. Outras, porém, permanecem em casa ou têm se reservado entre as empresas e o trabalho a distância.
Esse é o caso da agência de publicidade, onde trabalha o designer Lucas Feitosa, 26 anos. Às terças e quintas, ele vai à empresa prestar seus serviços. Nos outros dias da semana, desempenha suas atividades de casa. “Quando soubemos que poderíamos voltar, a agência preparou uma escala que permitisse o revezamento dos funcionários”, conta ele, que voltou ao trabalho na última segunda-feira (6). “Ainda é estranho não trabalhar em apenas um lugar, mas a gente vai se acostumando”, afirma o jovem.
Assim, aos poucos, empresas e funcionários vão se adaptando à nova realidade do mundo corporativo, mesmo diante das persistentes dúvidas sobre direitos e obrigações no retorno ao trabalho. Na avaliação da advogada especialista em direito trabalhista e segurança da informação, Anna Carolina Cabral, do escritório Queiroz Cavalcanti, é normal que as dúvidas surjam. “É muito comum que diante de uma grande quantidade de mudanças em um período relativamente curto, a gente fique cheio de incertezas”, diz ela, afirmando que, embora as dúvidas existam, é preciso que as empresas se planejem para mitigar riscos sanitários e trabalhistas, seguindo orientações das autoridades de saúde.
Para ajudar no planejamento, conta Anna Carolina, uma portaria do Ministério da Economia estabelece medidas que devem ser levadas em consideração na hora de traçar estratégias para o controle e prevenção à transmissão da covid-19 no ambiente trabalho. “Essa portaria é muito importante, porque consegue abranger os principais riscos e serve para todos os setores”, explica Anna Carolina, ressaltando que ela não impede a criação de protocolos específicos por área da economia.
“Não se atentar a esse documento pode adoecer o trabalhador e trazer problemas jurídicos para a empresa, caso se comprove a negligência da organização”, afirma a especialista, lembrando que o STF decidiu que a contaminação de um funcionário por covid-19 pode ser considerada uma doença ocupacional. Para atestar isso uma investigação será feita para encontrar a origem da infecção.
Anna diz ainda que seguidos os protocolos definidos pelas autoridades de saúde, os trabalhadores não poderão ser recusar a se adequar às medidas preventivas e de contenção da doença adotadas pelas empresas. “A não utilização de EPIs, por exemplo, pode e deve acarretar em aplicação de penalidades ao trabalhador”, declara ela, segundo quem, a negativa do funcionário pode resultar em demissão por justa causa.
Após mais de três meses fechado, o escritório da transportadora onde o faturista Sérgio Cavalcanti, 42, trabalha retoma as atividades nesta segunda-feira (13). Mesmo autorizada a voltar na semana passada, a empresa decidiu adiar o retorno para se adequar às medidas de prevenção. Apesar disso, o profissional, que é asmático e faz parte do grupo de risco da covid-19, não se sente seguro para regressar ao ambiente de trabalho. “Eu tenho medo de voltar agora, porque esse vírus não está para brincadeira”, diz Cavalcanti, afirmando que conversou com o patrão, que o deixou permanecer em home office.
Para Anna Carolina, Sérgio agiu corretamente. Segundo ela, caso a empresa não siga todos os protocolos para o setor ou o trabalhador não se sinta confortável para regressar às atividades presenciais, este deve firmar acordo com o empregador para continuar com seus serviços à distância e evitar penalidades. “A palavra-chave é diálogo. Patrão e empregado devem conversar e chegar a um consenso para decidir a modalidade de trabalho”, diz a especialista, sugerindo a manutenção do home office sempre que possível.
Por isso, a advogada acredita que muitas companhias vão entender os riscos de seus funcionários mais vulneráveis à covid-19 e, assim, devem continuar adotando o home office, integral ou parcialmente, e até fazer uso de escritórios compartilhados visando a redução de custos.
Uma dessas empresas é a WS Cont, especializada em contabilidade. Até março, a organização ocupava um imóvel no bairro das Graças, na Zona Norte do Recife, e, com a retomada das atividades, decidiu não mais voltar para lá, deixando a maior parte dos funcionários em home office. Quem precisa trabalhar presencialmente, agora o faz em um escritório compartilhado em Boa Viagem, Zona Sul da cidade. “Tivemos uma redução drástica no faturamento da empresa e optamos por economizar e preservar ao máximo a saúde dos nossos colaboradores”, explica Márcio Rodrigues, sócio da WS Cont.
Segundo Anna Carolina, ao mesmo tempo que essas mudanças protegem a saúde das pessoas, elas podem gerar vulnerabilidades antes não existentes para empresa. “Durante esse período de isolamento social, com o home office, muitas empresas sofreram ataques de pessoas tentando roubar seus dados”, diz a advogada.
Por pouco, a WS Cont não entrou no hall das organizações que tiveram informações importantes roubadas. Por isso, Márcio diz que a empresa se prepara para garantir a segurança dos dados com que trabalha. “Com o compartilhamento do escritório e, consequentemente, da rede, teremos que nos preparar ainda mais, porque, quando estávamos cada um de suas casas, por pouco, não tivemos um grande problema”, conta o empresário.
Ele lembra que em maio o computador de um dos funcionários foi invadido por um vírus, o que deixou todos em alerta. “Agora, sem a necessidade de se preocupar com as burocracias operacionais, como IPTU, água, luz e internet, podemos fazer um bom investimento em segurança digital”, declara Rodrigues, afirmando que a WS Cont aprendeu a lição e vai se prevenir.
Para a advogada Anna Carolina, este é o caminho. Ela sugere que as empresas adotem cuidados, como orientar todos os colaboradores para os riscos do trabalho fora do sistema de segurança empresarial, criar backup frequente desses dados, armazenar eles em nuvens com segurança, contratar especialistas na área, visando a preservação desses dados. “Ações de prevenção e de reação a falhas na segurança são fatores fundamentais neste momento, que é um cenário novo para a maior parte das pessoas e corporações”, sentencia Anna Carolina Cabral.