Com a chegada da pandemia do novo coronavírus, a construtora Rio Ave se viu obrigada a adotar novas práticas para evitar a disseminação da covid-19 nos canteiros de obras e escritório da empresa. “Foram instalados dispensers de álcool em gel. Além disso, a temperatura de todos é medida ao entrar nos ambientes de trabalho e o uso dos espaços coletivos, como refeitórios, acontece sob regime revezamento”, afirma a diretora de mercado da empresa, Carolina Tigre. Esse tipo de cuidados deverá virar rotina para até 7 em cada 10 empresas, de acordo com uma pesquisa do Instituto Brasileiro de Economia da Fundação Getulio Vargas (Ibre/FGV).
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O levantamento mostra que 90% das companhias fizeram alterações em sua operação durante a pandemia. Dessas, 27% acreditam que as mudanças serão temporárias. Outras 56% dizem que as medidas continuarão valendo parcialmente ou totalmente, e 17% ainda avaliam a questão.
Uma das que vão incorporar total ou parcialmente as mudanças é a MV, empresa que atua com soluções tecnológicas para área médico e hospitalar. Desde março, a companhia colocou parte dos colaboradores em home office, o que deve continuar mesmo quando a pandemia passar. “O trabalho remoto veio para ficar. Bem como as reuniões, que antes eram presenciais, daqui para frente, serão realizadas através das plataformas digitais”, diz o presidente da MV, Paulo Magnus.
Entre as alterações vividas pelas empresas estão o desenvolvimento de novos produtos ou serviços, apontado por 18% das empresas. O home office foi adotado por 83% para atividades administrativas, mas apenas por 20% para atividades operacionais. Essa é uma das medidas que tendem a perdurar nas empresas. Por isso, o advogado especialista em direito trabalhista, Geraldo Fonseca, do escritório Martorelli Advogados, alerta para a responsabilidade das companhias na hora de colocar os funcionários para trabalharem de casa. "Com a MP , que autorizava o teletrabalho não valendo mais, as empresas precisam arcar com os custos do home office, como determina a CLT. Isso é, o empregador deve fornecer equipamentos e indenizar eventuais gastos, como energia, que o funcionário venha a ter ", diz Fonseca, ressaltando que tudo precisa estar descrito no contrato de trabalho.
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As mudanças não se restringiram aos escritórios. Um terço das empresas afirmou ter utilizado novos meios de vendas. No caso do varejo, isso se aplica a 57% das companhias, sendo cerca de 65% em três segmentos: supermercados, vestuário e calçados e móveis e eletrodomésticos. A opção pelo delivery é citada por 41% das empresas do comércio.
"Nos supermercados, muitos ofereciam apenas a venda em loja física e passaram a fazer o delivery, incluíram vendas por aplicativos", afirma Viviane Seda Bittencourt, pesquisadora do Ibre/FGV responsável pela sondagem. Segundo ela, esse setor foi o menos afetado pela crise dentro do comércio, porque oferece bens essenciais. “Além disso, os supermercados conseguiram se adaptar para a venda online, para a entrega em domicílio, mais rápido do que os demais setores”, pontua.
O levantamento revela também que os comerciantes que realizam vendas online se tornaram maioria após o isolamento social. Antes da crise, 47% realizavam pelo menos parte das suas vendas por e-commerce — 53% só vendiam por lojas físicas. Agora, os dados estão invertidos. 62% vendem canais online, e 38% continuam restritas às vendas presenciais.
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A rede de lojas Maria Donata ajudou no crescimento deste modelo de negócios. Quando foi decretada quarentena e os shoppings centers precisaram ser fechados, a diretora de criação e marketing da rede, Thaís Barreto, disse que a empresa percebeu a falta que um e-commerce faz. “Nosso site começou no meio da pandemia, porque era inevitável não apostarmos no e-commerce como forma de rentabilidade nessa época”, explica. Para ela, a solução tende a ganhar muita relevância daqui para frente. “Estamos muito felizes com o resultado do site, que virou mais um braço da empresa e, com certeza, continuará nos aproximando dos clientes de agora em diante.”
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Viviane Bittencourt destaca que apesar de ser um dos setores mais prejudicados pela crise, o segmento de vestuário teve um comportamento interessante. Nesta área, cerca de 77% das empresas vão manter pelo menos parcialmente as medidas adotadas na quarentena. "A cadeia inteira desse setor foi bastante prejudicada pela pandemia, tanto na indústria como no comércio, mas foi o que mais conseguiu desenvolver novas formas de venda e novos produtos", ressalta Bittencourt, lembrando que 70% do empresariado da varejo e indústria de vestuários desenvolveu novos produtos e serviços e 80% adotaram novos canais de venda.
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Também se destacam entre os que devem manter as mudanças, a indústria de informática e eletrônicos (75%), os serviços de informação e comunicação (73%) e, novamente, os supermercados (72%). O desenvolvimento de novos produtos também é destaque na indústria têxtil (57%), de limpeza e perfumaria (42%) e nas farmacêuticas (35%). Na média, 29% da indústria de bens não duráveis investiu em novos produtos. "Essas empresas tiveram que se adaptar a esse momento de pandemia de alguma forma. Muitas tiveram que se reinventar", afirma a pesquisadora.
Na avaliação de Viviane, essas mudanças sentidas nas companhias do país seguem uma tendência global. "Isso não é só no Brasil, está acontecendo no mundo inteiro. Houve uma aceleração dos processos de automatização, do home office, do comércio eletrônico", diz ela, afirmando que a pandemia acelerou mudanças que aconteceriam a longo prazo.