A decisão da Ford de fechar suas fábricas no Brasil caiu como um míssil provocando prejuízos em vários setores da economia e trazendo incertezas para o mercado. É inegável que os próximos capítulos da Ford serão bem difíceis, mas tentar entender o processo é importante para a gente não falar qualquer coisa por aí e engrossar as especulações com as famigeradas fakenews.
Instalada em nosso País faz mais de um século, a Ford não está indo embora de vez. A marca mudou o foco do seu negócio para tentar continuar viva por aqui. Deixa de produzir carros nacionais para vender somente importados, modelos de maior lucratividade.
Para o Brasil não é bom. A mudança vai causar, ao longo de 2021, o fim de 5 mil postos de trabalho em três fábricas de São Paulo, Bahia e Ceará. Mas o número de impactados será bem maior. Neste primeiro momento, a desconfiança do consumidor vai castigar ainda mais as vendas da marca que já não iam tão bem. Certamente vão ficar longe das revendas pelos próximos dias esperando novidades.
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A Ford alegou que desde 2013 a marca sofre com perdas e a pandemia acentuou o problema. Apesar das justificativas, faz um tempão que a montadora não goza do mesmo prestígio do passado, quando teve décadas de glória com o Mustang ou o Del Rey, nos anos 60, 70 e 80. Nos anos 90, largou na frente das concorrentes ao lançar o EcoSport, o primeiro SUV “baratinho” do mercado. O carro veio com a missão de fazer o papel de ser um veículo de porte ao preço de modelo intermediário. E isso numa época que só marcas de luxo vendiam automóveis desta categoria. Foi um sucesso por 20 anos, mas a concorrência avançou e o EcoSport ficou pra traz.
Os encalços dos últimos tempos deram a Ford a má fama de possuir um pós-venda frágil, com dificuldade na reposição e de ter peças caras. Esse é um de seus rótulos mais marcantes.
Agora a Ford aposta em veículos vindos da Argentina e Uruguai, países que possuem acordo comercial com o Brasil e que permite a entrada de veículos de alta qualidade a preços competitivos. Entram em cena SUV Bronco, nova picape Ranger, Maverick e alguns elétricos. Além do chinês Territory e outros mexicanos, País que também tem parceria forte com o Brasil.
E essa mudança no portfólio vai mexer na rede. Hoje, o tíquete médio de vendas das lojas é de R$ 70 mil. Com a chegada dos novos importados, o valor será de R$ 200 mil. E isso vai implicar no volume menor de vendas, redução de custos operacionais com lojas compactas e vendedores mais atualizados.
E muita gente se pergunta...Devo comprar um Ford a essa altura do campeonato? Acompanho o setor Automotivo faz 20 anos. Vejo diariamente o cliente sair de casa disposto a comprar um carro X, mas como o crédito dele só permite levar o Y, mais barato, compra do mesmo jeito. Pensando assim, digo: se tiver em busca de custo-benefício e conseguir um bom preço, a resposta é sim. Pode ser um bom momento. A marca vai continuar as operações de atendimento no País. As concessionárias vão ter de limpar seus estoques de modelos nacionais para ceder espaço para os novos importados. Quem souber negociar, pode levar um carro zero-quilômetro sem ter desembolsar tanto. Sobre o pós-venda o que se tem notícias é de que será mantido.
E quem tem um Ford? Deve antecipar a venda para não perder tanto dinheiro? A resposta é não. Não precisa correr para entregar seu veículo de todo jeito. Deixa a poeira baixar. A ânsia de se livrar do carro agora pode lhe causar prejuízos. Ele pode até desvalorizar um pouco acima da média, mas não despencar tanto. E vale o lembrete que veículo seminovo subiu muito nos últimos meses.
E o jipe Troller? Esse é um mercado bem específico, com fãs em todo País. Certamente vai deixar saudades por ser um dos melhores 4x4 do Brasil. Boa sorte pra Ford e pra todos nós.
Sílvio Menezes é jornalista automotivo faz 20 anos, comanda o canal Carro Arretado, e já esteve presente nos principais salões de automóveis do mundo.