Preço da cerveja disparou em 2020 e vai continuar pesando no bolso este ano

Câmbio, commodities e falta de insumos vão permanecer impactando o preço da bebida em 2021
Adriana Guarda
Publicado em 26/03/2021 às 20:40
MERCADO Consumo de bebida alcoólica aumentou durante a pandemia, mas cervejarias tiveram que subir os preços por causa da produção mais cara Foto: FELIPE RIBEIRO/JC IMAGEM


Quem toma cerveja sabe que, no ano passado, o preço da bebida aumentou. Enclausurados em casa para obedecer o distanciamento social exigido pela pandemia da covid-19, o consumo em domicílio também pipocou. No Recife, o reajuste acumulado em 2020 assustou. Dados do IBGE mostram que a alta foi de 10,22% superando, em muito, a inflação oficial (IPCA) de 5,66%. No mercado, a explicação para o avanço no preço inclui uma série de fatores: desvalorização do real, aumento das matérias-primas dolarizadas e falta de insumos. Para 2021, a expectativa é de que o custo de produção da cerveja continue subindo e que os consumidores permaneçam sentindo no bolso. 

"A indústria também foi afetada pela pandemia, porque os custos de produção aumentaram e tivemos dificuldade de repassar para os preços porque o desemprego foi grande e a perda de renda também. O dólar subiu e puxou para cima o preço de matérias-primas dolarizadas, como o malte e o lúpulo. Mesmo existindo produção nacional de malte, como se trata de uma commodity, é cotado em dólar", explica o Diretor Executivo da Ekäut Cervejaria Artesanal, Diogo Chiaradia. Além das matérias-primas usadas direto na produção, o empresário conta que também subiram os preços de insumos como vidro (12%), papelão (50%) e outros. 

O consumo em domicílio aumentou, mas foram as grandes cervejarias que se beneficiaram desse movimento, que possuem grandes acordos com redes de supermercados e plataformas próprias de entrega, como a Ambev, com o seu Zé Delivery. No caso das cervejarias artesanais, muitas têm os bares e restaurantes como seu principal canal de comercialização. Com o fechamento desses estabelecimentos durante boa parte do ano passado, e agora do novo lockdown, muitas artesanais passaram por dificuldade e outras fecharam as portas. 

Procuradas pelo JC para comentar os reajustes nos preços, Ambev e Heineken informaram que se pronunciariam por meio do Sindicato Nacional da Indústria da Cerveja (Sindicerv). Questionamos a entidade sobre produção, preços, consumo e falta de produtos, mas a entidade limitou-se a responder sobre o último ponto. 

"Sobre a ruptura apresentada em alguns pontos de venda, o Sindicerv informa que trata-se de um reflexo do impacto no fornecimento de insumos - questão que vem afetando diversos segmentos em um contexto atípico motivado pela pandemia. Tanto na cadeia de insumos como na retomada acelerada dos últimos meses. Especificamente no setor cervejeiro, estamos enfrentando desafios pontuais com alguns insumos inerentes ao negócio, mas buscando junto aos fornecedores soluções para a normalização e menor impacto possível ao processo", diz, por meio de nota. 

BALANÇOS 

No seu balanço financeiro de 2020, publicado em fevereiro, a Ambev reportou uma queda de 3,7% no lucro sobre 2019, que diminuiu de R$ 12,1 bilhões para R$ 11,7%. Essa diminuição reflete a necessidade de diminuir a margem por conta do aumento dos custos. Apesar da redução no lucro, a cervejaria registrou aumento de 12,3% na receita líquida, alcançando de R$ 58,3 bilhões. 

Atenta ao crescimento do consumo em casa, a Ambev turbinou seu aplicativo de entrega em domicílio. "No Brasil, nossa plataforma de entrega direta ao consumidor (D2C), Zé Delivery, continuou crescendo exponencialmente no trimestre, estando presente em mais de 200 cidades em todos os 27 estados brasileiros e atingindo quase 50% da população total do país. O Zé entregou mais de 27 milhões de pedidos em 2020", diz o balanço. 

PERSPECTIVAS

Para 2021, a Ambev sabe que vai continuar enfrentando os custos de produção da cerveja, especialmente por conta da persistência da alta do dólar.  Na avaliação da cervejaria, o custo dos produtos vendidos ainda vai acelerar entre 20% e 23%. Mais uma vez isso vai pressionar novos reajustes do preço da bebida ao consumidor. A empresa afirma que no ano passado evitou repassar a alta dos insumos ao preço do produto final.

Apesar do aumento dos casos de covid-19 no Brasil, que obrigou a suspender o Carnaval - evento mais importante do ano no calendário das cervejarias -, a Ambev iniciou o ano com crescimento de 10% nas vendas de cerveja. Segundo a companhia isso se dá "graças à implementação de nossa estratégia comercial e melhor mix, serão dois dos principais drivers para compensarmos parcialmente as pressões sobre o custo", afirma. No balanço, o chamado custo do produto vendido (CPV) foi o maior desde 2017, alcançando R$ 160,6 por hectolitro em 2020, enquanto no ano anterior foi de R$ 134,9 por hectolitro. 

Já a Heineken não conseguiu manejar tão bem a estratégia no ano passado. O balanço mundial do segundo maior grupo cervejeiro do mundo apresentou um prejuízo de 204 milhões de euros (R$ 1,34 bilhão pela atual cotação do dólar) no ano passado. A companhia também anunciou que vai demitir 8 mil funcionários, o que representa cerca de 10% dos trabalhadores globalmente. O objetivo é economizar US$ 2,4 bilhões até 2023. A empresa também espera um 2021 difícil. 

EM ALTA 

O ano já começou dando demonstrações de que a alta da cerveja em domicílio vai persistir. Levantamento do IBGE em Pernambuco, realizado a pedido do JC, mostra que a inflação da bebida continua subindo em janeiro e fevereiro. No Recife, as altas foram de 0,50% e 1,28%; respectivamente, e no Brasil de 0,25% e 1,11%. "O primeiro semestre ainda deve ser bastante difícil, mas estamos otimistas de que a vacinação avante e que a segunda metade do ano possa ser melhor. Nós na Ekäut estamos traçando cenários de curtíssimo prazo, em função do nível de incerteza. O que cabe a nós empresários é sermos resilientes para nos manter competitivos enquanto a vacina avança", aposta Diogo Chiaradia.  

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