Aumentou o risco de apagão (falta de energia) e de racionamento de energia - quando o governo federal obriga todos os cidadãos e as empresas a cumprirem metas de redução do consumo - ainda este ano, segundo pelo menos três executivos entrevistados pelo Jornal do Commercio. Até o presidente Jair Bolsonaro (sem partido) disse, na quarta-feira (26) que "estamos no limite do limite" e alguma hidrelétricas podem deixar de funcionar, caso continue a atual crise hídrica. O presidente também pediu para a população apagar "um ponto de luz da sua casa". Ou seja, 20 anos depois do último racionamento, o Brasil continua esperando quase, que milagrosamente, pelas chuvas para ter energia elétrica. O País vai precisar de um adicional de geração de 5 mil megawatts (MW) a partir de novembro para suprir a carga do atual consumo de energia a partir de novembro, caso não ocorram chuvas que melhorem a situação nos reservatórios das hidrelétricaas do Sudeste/Centro-Oeste do País.
A necessidade ter um adicional de 5 mil megawatts é como se tivesse que implantar metade do parque gerador das hidrelétricas da Companhia Hidro Elétrica do São Francisco (Chesf) até novembro. O primeiro fator que está contribuindo para esta situação é a falta de planejamento dos empreendimentos de geração do setor elétrico. E não é só do atual governo. Os executivos do setor apontam que esta falta de planejamento está ocorrendo há pelo menos uma década. "Energia tem que se planejar antes. Em cima da hora não dá para fazer nada na área de geração. Em termos de chuva estamos pior do que em 2001. E o consumo de energia está aumentando", resume o diretor da Kroma Energia, Rodrigo Mello.
Responsáveis por 70% de toda a água que pode ser armazenada para gerar energia no País, os reservatórios do Sudeste/Centro-Oeste estavam com 22,32% da sua capacidade de armazenamento na quinta-feira (26). A expectativa é de que eles cheguem a 10% em novembro, quando começa o período úmido (chuvoso) nas duas regiões. Se as chuvas não vierem, algumas hidrelétricas das duas regiões poderão ficar sem condições de gerar energia.
O consumo de energia aumentou em 19% pela indústria e 5% pelos clientes residenciais em junho último, segundo números do Sistema Interligado Nacional (SIN). A indústria consome cerca de 60% da energia do País e o crescimento em dois dígitos ocorreu também porque a comparação foi feita com o mesmo mês do ano passado, quando o setor passou por redução da produção devido ao impacto da crise provocada pela pandemia do coronavírus. Já o aumento do setor residencial foi puxado pelo clima seco do Centro-Oeste que provocou o aumento do consumo de energia.
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Para tentar frear o consumo de energia, o governo federal anunciou, nesta penúltima semana de agosto, algumas medidas que podem contribuir para um menor consumo, como os órgãos públicos federais gastarão menos energia até abril do ano que vem, serão divulgadas medidas que estimulem o consumidor residencial diminuir a sua conta de energia e um bônus para os grandes consumidores, como a indústria, - que pode ser até em dinheiro - para eles gastarem menos. Pelo lado da geração, foi anunciada a contratação de térmicas que vão funcionar em contêineres de forma emergencial. "Estas medidas foram tomadas tardiamente, porque desde outubro do ano passado, se sabia que este ano seria ruim de chuvas. O governo disse que vai dar um bônus para a indústria, mas não disse qual o prêmio que será dado e de onde vai sair o dinheiro. Por exemplo, se uma fábrica muda o horário de um turno de trabalho contribui para gastar menos energia. São muitas variáveis para dizer se vai ter racionamento, mas o que a gente percebe é que aumentou o risco de ter black out (apagões) em diferentes regiões do País e também o de racionamento", resume o diretor do Centro Brasileiro de Infraestrutura (CBIE), Adriano Pires. E acrescenta: "Temos que diminuir a dependência do clima na matriz energética brasileira". Para ele, isso ocorreria se o País tivesse implantado mais usinas térmicas a gás natural.
IMPACTO
O principal impacto que este cenário de falta de planejamento traz para o consumidor é que a conta de luz vai continuar subindo. Primeiro, porque será cobrado um valor maior na bandeira vermelha no patamar 2 que deve ficar em torno dos R$ 15 para cada 100 quilowatt-hora (kWh) consumidos. Este valor será definido pela Aneel na próxima semana.
Com a escassez de água dos reservatórios, mais térmicas estão trabalhando, há alguns meses, para que o consumidor tenha energia e elas são mais caras do que as hidrelétricas. O custo dessa geração das térmicas que não for bancado pela bandeira vermelha será pago pelo consumidor no reajuste anual da conta de energia em 2022.
"As tarifas vão continuar elevadas, mesmo que ocorram boas chuvas a partir de novembro, porque há o risco de chegarmos em abril do ano que vem com os reservatórios destas hidrelétricas mais baixos do que em 2021", argumenta Adriano Pires. Então, para o consumidor só tem uma saída: tentar economizar porque é ele quem vai bancar os custos da falta de planejamento do setor elétrico brasileiro.