O uso do Fundo de Garantia do Tempo de Serviço (FGTS) para o financiamento de imóveis está no seu menor patamar desde 2016 e tem sido uma preocupação a mais para o setor da construção civil. Para o ano que vem, manter o ritmo de queda significa deixar mais pessoas fora do mercado, sem conseguir comprar a casa própria. O agravante para 2022 é que se esperar o repasse mais forte da alta de juros e do custo da construção dos imóveis, encarecendo as demais linhas de financiamento e o ativo em si, freando os resultados esperados pelo setor pelo lado da demanda.
De acordo com o compilado de dados do fundo feito pela Câmara Brasileira da Indústria da Construção (Cbic), nunca se financiou tão pouco com recursos do FGTS desde 2016. Só em 2021, até o começo de dezembro deste ano, a queda foi de 14% sobre o acumulado no ano passado. Se levado em conta o total de unidades, o recuo bateu os 17%, no mesmo período comparativo.
E o problema não é a falta de dinheiro, pelo menos no que diz respeito às liberações do fundo. A questão maior está no bolso do consumidor.
"O problema é que na parte mais baixa da população, se tem ativos onde a renda não alcança.
Uma família com renda que compra imóvel de R$ 100 mil, financia R$ 80 mil e paga R$ 20 mil de entrada. Quando o imóvel passa para R$ 120 mil, e a capacidade de pagamento se manteve em R$ 80 mil, a diferença é paga na entrada (dobrando para R$ 40 mil a necessidade de investimento). Além de não alcançar o valor do imóvel ele precisa de uma poupança dobrada para financiar, e não tem isso", diz o presidente da Cbic, José Carlos Martins.
A situação não chegou a afetar os resultados da construção em 2021, mas pode ser um grande calo para o setor em 2022. Este ano, os financiamentos com recursos da Poupança (SBPE) alavancaram os resultados, dando ao setor o marco de crescimento na casa dos 7,6% este ano - melhor resultado dos últimos 10 anos.
FGTS
Unidades financiadas (até 09/12/2021)
2016 569.430
2017 456.306
2018 469.644
2019 433.159
2020 400.787
2021 332.447
Valores financiados (até 09/1202021) em milhões
2016 51.604
2017 54.409
2018 54.817
2019 51.831
2020 21.290
2021 44.057
SBPE
Unidades financiadas (até 09/12/2021)
2016 199.689
2017 175.619
2018 228.380
2019 297.961
2020 426.771
2021 734.373
Valores financiados (até 09/12/2021) em milhões
2016 46.610
2017 43.149
2018 57.387
2019 78.702
2020 123.974
2021 171.847
"As classes de mais baixa renda estão perdendo a capacidade de acessar o crédito e isso é extremamente ruim, porque lá está concentrado os 90% do déficit habitacional. Por outro lado, observamos o SBPE indo em caminho contrário, com crescimento forte. O aumento do SBPE é um dos motivos para otimismo e demonstra o movimento de pessoas com maior renda", avalia a economista da Cbic Ieda Vasconcelos.
A pressão que o setor deve fazer sobre mais mudanças em relação à curva de subsídios deverá se intensificar porque, a situação do SBPE pode não estar tão mais favorável em 2022. O aumento da taxa de juros e a expectativa de repasse dos custos da construção em 2022 devem desacelerar o ritmo de vendas nessa faixa e, consequentemente, de lançamentos e empregos.
"Teremos o repasse do custo para o preço. Desde o início da pandemia vimos que a demanda corria e a oferta vinha atrás. Nunca tivemos, até metade do ano, o suficiente para fornecimento no mercado. Nossa preocupação é que esse equilíbrio se dê através da redução de consumo e não da maior oferta. Colocamos ainda mais essa responsabilidade muito forte sobre a nossa produção e a falta de possibilidade para o setor", pondera Martins.
Para este ano, a construção civil mantém a expectativa de crescimento na casa dos 7,6%, sobre uma queda de 6% registrada no ano passado. Já para 2022, o avanço deve ser de 2% (caso o PIB cresça entre 0,5% e 1%). O incremento de novos empregos poderá chegar aos 110 mil, num cenário considerado de base, sem levar em conta as previsões mais negativas ou mais positivas.
No fim de novembro, o orçamento operacional do Fundo de Garantia do Tempo de Serviço até 2025 previa R$ 326 bilhões para a contratação de projetos nas áreas de habitação, saneamento básico e infraestrutura urbana. Do total previsto até 2025, R$ 278 bilhões serão destinados a financiamentos para a construção de novas residências. Outros R$ 34 bilhões serão disponibilizados para a concessão de descontos nos financiamentos para a aquisição da casa própria a pessoas físicas com renda familiar mensal de até R$ 4 mil, o que significa um incremento de R$ 4,5 bilhões para essa modalidade, de acordo com o ministério do Desenvolvimento Regional.
Em 2022, o orçamento operacional aprovado é de R$ 75,4 bilhões para a contratação de obras e de mais R$ 8,5 bilhões em subsídios para a aquisição de moradias.