As transmissões audiovisuais de jogos de futebol no Brasil podem mudar bastante, a partir da Medida Provisória nº 984 assinada pelo presidente Jair Bolsonaro nesta quinta-feira (18). Isso porque, a partir dela, fica a cargo da equipe mandante o direito de transmissão da partida. Anteriormente, era preciso haver acordo com as duas agremiações envolvidas. A MP tem o prazo de 60 dias, renováveis por mais 60, até a votação por parte do Congresso para torná-la lei. As aplicações devem ocorrer em maior escala a partir de 2024, quando grande parte dos clubes encerram seus contratos de transmissão com a TV Globo, detentora dos direitos do Campeonato Brasileiro na TV aberta e de grande percentual da TV fechada e pay-per-view. Porém, no curto prazo, algumas mudanças já podem ser sentidas.
No período de pelo menos dois meses, alguns jogos já serão influenciados pela medida provisória. Um caso? A retomada do futebol agora no Brasil em meio à pandemia do novo coronavírus, com Bangu x Flamengo, pelo Campeonato Carioca. O Bangu, por ser mandante do jogo no Maracanã, tem o direito de escolha quanto à transmissão da partida, e autorizou que a emissora detentora dos direitos do Estadual transmita a partida. Entretanto, a partida ficou mesmo sem televisionamento.
Mas para o longo prazo, as mudanças mexerão com a forma que nos acostumamos a assistir as partidas. Isso porque abre a possibilidade de uma maior concorrência para a transmissão dos jogos na TV aberta, TV fechada e pay-per-view, também torna mais abrangente a entrada do streaming no futebol brasileiro através de grandes marcas, como a DAZN - que já tem os direitos da Série C -, entre mais marcas que podem começar a investir no serviço por aqui. Outro ramo em que pode-se haver investimento é na transmissão própria por parte dos clubes em seus canais no YouTube ou plataformas de streaming, como o Athletico Paranaense e o Bahia fazem.
A negociação individual trará um novo horizonte ao futebol brasileiro. Existe uma visão de que os clubes maiores poderão crescer ainda mais, “engolindo” os menores. Mas, por outro lado, os menores também ganham poder de barganha, pois em uma Série A, por exemplo, terão jogos de interesse das emissoras contra os gigantes nacionais. Daí cabe a cada um deles se planejar e até, quem sabe, formar grupos ou ligas, tal qual a Premier League age na Inglaterra.
Lá, apesar dos clubes terem também esse direito individual para a transmissão no seu mando de campo, eles se organizaram em conjunto para tornar o campeonato mais lucrativo para todos. Pensamento que não é possível de se garantir que haverá no Brasil, mas é um viés muito interessante. Fazendo o recorte do futebol nordestino na Série A deste ano, com quatro clubes, em um cenário em que nenhum deles tivesse contrato televisivo, a junção deles para a venda desses jogos em um pacote poderia trazer resultados muito bons para cada. Possibilidades a serem trabalhadas e um cenário que ainda vai se desenhar ao longo dos próximos anos, caso a lei vigore realmente.
"É uma conversa importante da maneira como se conduziu os direitos de transmissão dos jogos. Vale frisar que os contratos atuais não serão afetados. Para os clubes que tem contrato de transmissão, dificilmente haverá uma mudança nesses contratos. E é até importante explicar que essa MP é provisória e ela vale por um tempo até o congresso votar, para ver se ela terá validade plena depois desse tempo de vigência que ela tem inicialmente. A gente tem que aguardar como vai ser essa apresentação para o congresso, pois hoje temos uma medida provisória que pode ser utilizada pelos clubes que não detém contrato de televisionamento", avaliou o diretor de futebol e membro do Núcleo de Gestão do Santa Cruz, Fred Dias.
A Medida Provisória nº 984 também alterou outros pontos que eram regidos pela Lei Pelé. Até o dia 31 de dezembro deste ano, os clubes poderão fazer contratos de 30 dias com jogadores por conta da crise causada pela pandemia. Anteriormente, o prazo mínimo era de 90 dias. Clubes menores, que tem só a reta final dos seus estaduais para disputar neste ano, podem se beneficiar com a alteração.
O 'direito de arena', percentual de 5% pago aos jogadores em cima dos direitos de transmissão das partidas, não tem mais a obrigação de ser repassado para o sindicato dos atletas de cada estado e depois ser pago ao profissional. A partir de agora, caso o clube prefira, ele pode fazer o repasse diretamente para cada elemento de seu elenco. Porém, também não exclui a possibilidade de cada equipe manter da maneira que vem sendo feita atualmente.
O último quesito modificado trata da questão de patrocínio de veículos de mídia aos clubes. Anteriormente, nenhum veículo - seja ele televisão, rádio, jornal, portal online e outros - poderiam anunciar ou firmar parcerias com os clubes. Caso isso acontecesse, a agremiação poderia sofrer duras punições, chegando até a exclusão dos campeonatos. Agora, a marca dessas empresas podem ser estampadas nos uniformes dos times, em placas de publicidade nos estádios, ou em outra forma de propaganda que o clube preferir.