Marcelo Martelotte tem uma identificação com o Santa Cruz desde o início dos anos 90. Em 93, foi contratado junto ao Bragantino e foi peça fundamental para a histórica conquista do Estadual daquele ano. Anos mais tarde, voltava ao clube para ser treinador. Em 2013, logo de campeão estadual. Voltou em 2015 para levar o time coral à Série A. Em 2020, Martelotte voltou para levar o time de volta à Série B. O trabalho voltou a todo vapor. Mas, na hora decisiva, Marcelo Martelotte enfrentou problemas pessoais e não conseguiu levar o Tricolor de volta à Série B. Agora, ele começou a trabalhar visando aos jogos contra o Itabaiana-SE, que valem vaga no Nordestão. Depois desses compromissos fica a dúvida: fica ou não no Arruda. Conversamos com o treinador coral sobre as dificuldades, alegrias, tristezas e frustrações na atual temporada.
Blog do Torcedor - O que faltou para o Santa Cruz conseguir o acesso à Série B?
Marcelo Martelotte - É lógico que não tivemos no quadrangular final o mesmo rendimento técnico da primeira fase, onde mostramos o nosso melhor nível técnico. Mas, se você observar, o jogo crucial para nossa não classificação foi contra o Vila Nova, aqui no Arruda. Você pode observar que os resultados diante dos outros adversários foram dentro da normalidade. Mas contra o Vila, perdemos lá, num jogo atípico, de muita chuva. E, aqui no Arruda, estivemos muito abaixo tecnicamente.
BLOG - Mas você acha que o fato da classificação ter acontecido com antecedência acomodou o elenco? Faltou virar a chave para o momento decisivo?
MM - A nossa qualidade técnica e tática fez o nosso time ser o melhor da fase classificatória. Ficamos à frente dos adversários e praticamente não tivemos um jogo com um clima de decisão, de obrigação de vencer. Aí, quando viramos de fase, acabou que a parte técnica ficou em segundo plano. Os adversários se superaram para jogar contra a gente. Acreditamos que o que a gente estava fazendo bastava para conseguir a classificação. Enquanto os adversários tiveram uma nova postura, pois sabiam que se continuasse do jeito que estavam, não conseguiriam. A gente demorou para perceber isso. Ninguém achava que a gente teria que mudar nosso estilo de jogo para subir. O que aconteceu não foi uma coisa previsível. Quando o quadrangular final começou, o Brusque estava em baixa. Então, teve que superar todas as deficiências para conseguir o objetivo. A gente achava que não precisava. Só acordamos para isso na derrota para o Vila Nova, no Arruda. Já era tarde.
BLOG - Como você trabalhou a má fase de Pipico?
MM - A gente não desiste nunca de um jogador importante como é Pipico. Não existiu acomodação da parte dele. As coisas passaram a não acontecer justamente por falta de confiança. O que a gente fazia era passar essa confiança. Eu e o grupo confiamos muito nele. Usei muito Bruno Rangel ao lado dele para dividir essa responsabilidade. Rangel também teve uma crise pessoal e acabou se recuperando e fez grandes jogos na fase decisiva. Chiquinho cresceu, Paulinho também. Fiquei muito feliz quando Pipico fez o gol na partida contra o Brusque. Ele é um jogador que se dedica muito, que gosta do clube. Então, o nosso trabalho foi voltado para dar apoio, criar soluções e situações para que ele evoluísse.
BLOG - Em relação as escalações de Bileu e André... A imprensa e torcida queriam André e você sempre mostrou sua preferência por Bileu.
MM - É bom lembrar que chegamos a dez jogos invictos na Série C com Bileu sendo titular do time. Assim que cheguei, coloquei Bileu na lateral, substituindo Toty, já que não tínhamos outra peça. Depois, escalei como volante. André não faz o papel de Bileu. Para jogar do jeito que eu gosto, com mais ofensividade e marcação mais em cima, Bileu é uma peça-chave. Quando a gente tinha a posse de bola, o time ficava no 4-1-4-1. André é um baita jogador, jovem que tem um grande potencial, mas a sua saída do time foi por questão de característica. Ele não desempenha a função do Bileu, que teve uma importância grande no esquema que eu implantei. Ele foi expulso por um lance de impulsividade (contra o Ituano, no Arruda). Foi a única expulsão do time nesse período em que trabalhamos. Ele fez uma falta muito grande no jogo contra o Vila. A gente só tinha o Bileu com aquela função.
BLOG - Você viveu uma perda grande com o falecimento da sua esposa, em plena disputa da fase final da Série C. No mesmo dia, o volante Tinga perdeu o pai. Como o grupo reagiu a esses fatos triste?
MM - Foi muito difícil passar por isso no meio da competição. Eu consigo separar e vejo lados positivos: voltei rapidamente ao trabalho e me apeguei muito ao ambiente dos treinos, à relação com os jogadores e comissão técnica. Eu tinha viajado para São Paulo com o elenco. E fiquei com minha esposa até os últimos dia. Ela tinha uma cirurgia de muito risco para fazer no coração. A gente sabia disso tudo. Na véspera da cirurgia, ela foi entubada. Os médicos acharam que seria melhor para ela. Então, tudo estava encaminhado. Infelizmente, ela faleceu antes mesmo da cirurgia. Quando cheguei no Recife e estava no CT para o treino, minha filha me ligou e informou do falecimento. A questão minha e do Tinga, que perdeu o pai, deu um fortalecimento ao nosso grupo. A reação foi de tristeza, claro, mas nos unimos, ganhamos força para superar a adversidade naquele momento. O grupo é espetacular.
BLOG - E os salários atrasados atrapalharam?
MM - Não vejo interferência sobre a situação do salário no desempeno da equipe. O clube foi solucionando os problemas na medida em que os jogos. O Santa Cruz tem uma dependência muito grande da renda de bilheteria. É um clube que depende muito do seu torcedor no estádio. Se teve um clube que mais perdeu com essa pandemia, esse é o Santa Cruz. Além da questão financeira, tem a questão de incentivo ao elenco. Não tenho dúvidas que, em condições normais, a gente teria uma média de 40 mil torcedores nos jogos. Por baixo, o Santa Cruz deixou de arrecadar uns R$ 3 milhões. Isso resolveria todas as questões financeiras. Mas a diretoria fez o que pode para nos ajudar, para conseguir pagar os compromissos. Todos no elenco viram esse empenho. Então, acho que o atraso de salário não mexeu no elenco, até porque o grupo é repleto profissionais.
BLOG - E agora, vai ficar no Santa Cruz?
MM - Tenho vontade de ficar, sim. Quando falo do Santa Cruz é algo que vivi muito tempo, tenho uma relação com clube. Tem o fato de gostar de trabalhar com montagem do elenco, planejamento. Mas é difícil falar porque não depende só de mim. É algo que o clube tem que resolver. E isso só vai acontecer depois da eleição, que está prevista para o dia 10. Então, só resta aguardar.