Da Estadão Conteúdo
O presidente do Equador, Guillermo Lasso, declarou ontem estado de exceção por 60 dias em todo o país, após o assassinato a tiros do candidato presidencial Fernando Villavicencio. A medida foi tomada para garantir o primeiro turno das eleições gerais antecipadas, que foram mantidas para o dia 20. "As Forças Armadas estão mobilizadas para garantir a segurança dos cidadãos", disse.
Villavicencio foi assassinado na quarta-feira com três tiros na cabeça quando saía de um encontro com partidários em uma escola de Quito. Ele era candidato do Movimiento Construye, de centro. Crítico do ex-presidente Rafael Correa, ele prometia lutar contra a corrupção e denunciava o envolvimento do crime organizado com o aparato estatal.
Imagens de vídeo do momento do atentado indicam que cerca de 30 tiros foram disparados. Pelo menos nove pessoas ficaram feridas. Um dos atiradores foi abatido pela polícia no local. Outros seis suspeitos foram presos durante batidas realizadas em bairros da capital equatoriana. Todos eram colombianos - incluindo o morto
"Vivemos um filme de terror. Foram 30, 40 tiros disparados com metralhadoras. Vimos feridos caírem. Sei que há alguns mortos, e infelizmente o assassinato de Fernando", afirmou Galo Valencia, tio do candidato presidencial.
O corpo de Villavicencio foi levado para necropsia. No entanto, nem bem a polícia havia iniciado a investigação, o grupo Los Lobos, uma das maiores gangues do Equador, postou um vídeo no X, antigo Twitter, reivindicando a autoria do atentado. O motivo seria o descumprimento de um suposto acordo entre eles.
"Queremos deixar claro para todos: sempre que políticos corruptos não cumprirem suas promessas estabelecidas, quando receberem nosso dinheiro para financiar suas campanhas, eles serão executados", diz um porta-voz da gangue, rodeado de outros criminosos vestidos de preto, armados e com balaclavas escondendo os rostos.
O porta-voz da gangue ameaçou outro candidato presidencial, Jan Topic, a quem também acusou de ter recebido dinheiro dos Lobos. "Se você não cumprir sua promessa, Jan Topic, será o próximo." Topic é candidato por uma coalizão entre o Partido Social Cristão, de direita, e duas legendas de centro-esquerda, o Partido Sociedad Patriótica e o Centro Democrático. Não há provas sobre a existência desses acordos, nem de que o grupo realmente tenha assassinado o candidato.
Villavicencio estava em quarto lugar, segundo pesquisa Telcodata, divulgada no dia 5 - embora outras sondagens colocassem o candidato na briga pela segunda posição com outros três presidenciáveis, entre eles Topic. Quem lidera a corrida é Luisa González, do Movimento Revolução Cidadã, de Correa.
A tendência, segundo analistas, é de que o assassinato favoreça candidatos mais conservadores, que abraçam um discurso mais duro contra o crime organizado. Villavicencio batia de frente com o narcotráfico e vinha recebendo ameaças de morte.
"Esta onda de violência cria um terreno fértil perfeito para populismos de segurança", disse a especialista em segurança Carla Álvarez. "Por isso, as campanhas adotaram uma estratégia de mão forte como única solução."
Apesar de ter comprado briga com as gangues, Villavicencio rejeitava os conselhos para usar coletes à prova de balas. "Estou aqui. Que venham os capos do narco. Que venham os pistoleiros", disse o candidato em discurso 24 horas antes de ser assassinado.
Alguns dos rivais de Villavicencio suspenderam suas campanhas e pediram unidade diante da crise de insegurança e violência. "Estou indignado", disse o esquerdista Yaku Pérez, candidato indígena que ficou em terceiro lugar nas eleições de 2021.
O Equador vive uma crise política desde 2018, com o fantasma da ingovernabilidade assombrando Lasso e seu antecessor, Lenín Moreno. Enquanto as elites travam uma disputa pelo poder em Quito, a população é assolada pela violência em todas as partes do Equador.
Os equatorianos vivem sob uma onda de criminalidade, com o aumento da guerra entre facções ligadas a cartéis mexicanos, que transformaram o Equador em entreposto da droga, escoada para EUA e Europa pelos portos do país. O crescimento das gangues - em receita e poder de fogo - tornou mais fácil comprar alianças com o poder público, dificultando ainda mais o combate às organizações criminosas.