A cada mês de março, todos os anos, constatamos que as reflexões acerca da história, dos papeis assumidos e da desigualdade persistente envolvendo o gênero feminino são, quase sempre, as mesmas. As mulheres continuam sendo discriminadas, violentadas, mortas, subjugadas - apesar das conquistas acumuladas nas últimas décadas, e das responsabilidades sobrepostas do sustento financeiro da família com a gestão das tarefas domiciliares. E não apenas no Brasil, onde sabemos o quanto a sociedade patriarcal e o machismo resistem como fatores culturais incidentes no imaginário e no comportamento coletivos. Em todo o mundo, inclusive nos países ricos, não faltam exemplos da desvalorização feminina.
Mas infelizmente, ao olhar para o ano que passou, precisamos encarar uma realidade ainda mais desafiadora para as brasileiras. Pelo terror que deveria causar, pela sensação generalizada de desamparo diante do ataque do coronavírus, a pandemia poderia ter gerado tão somente o efeito desejado de solidariedade, empatia e união em prol da saúde e da vida. Isso pode ter ocorrido em outros países. Mas não foi o que se deu, e não é o que acontece aqui. Mesmo não sendo a maioria, parcela expressiva da população insiste em desprezar a doença, engrossando a desinformação e elevando o risco de contágio e de óbitos.
Nesse cenário e insensatez, cidadãs que já são consideradas como de segunda categoria, mulheres comuns têm carregado o fardo da sobrevivência com coragem e resiliência durante a prolongada crise pandêmica. Se a conjuntura de restrição econômica impõe privações e estresse a todos, para as mulheres é pior: dos 5.163 empregos formais perdidos em Pernambuco em 2020, quase a totalidade - 5.137, ou 99,5% - era ocupada pelo gênero feminino. Se as mortes violentas cresceram 8,4% no Estado, no ano passado, os feminicídios aumentaram cerca de 27% nos primeiros 11 meses de 2020, em comparação a 2019. Sintoma de nossa violência estrutural, os crimes de proximidade, as agressões às mulheres, os estupros e feminicídios registraram aumentos no período da pandemia de covid-19.
Permanecem os problemas. Como se vê pelos números, alguns se agravaram. Mas a mulher não desiste. E emergirá dessa calamidade mais forte, pela capacidade do amparo, pela condição de luta e de luto, pela energia que não sabe de onde vem, mas que a faz ir além - enfrentando adversidades, reunindo o afeto e a esperança que possibilitam olhar para frente e viver.
Priscila Krause, deputada estadual.