ARTIGO

Conjunção 'covid-19 e má governança' sufoca

Para uma economia que - desde 1981 - combina recessão, estagnação, pingos de crescimento, desindustrialização e produtividade padrão tartaruga, o presente não poderia ser mais desolador.

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Roberto Alves e Tarcisio Patricio

Publicado em 13/04/2021 às 5:46 | Atualizado em 13/04/2021 às 5:47
No total, o Brasil tem 502.817 mortos e 17.969.806 casos da doença - MICHAEL DANTAS/AFP

Para uma economia que - desde 1981 - combina recessão, estagnação, pingos de crescimento, desindustrialização e produtividade padrão tartaruga, o presente não poderia ser mais desolador. Os bicudos tempos atuais pegam um Brasil que tenta superar decênios de atraso. Há urgência de inovação institucional (em educação, meio ambiente, direitos civis, segurança social). Mas, a conjunção 'covid-19 e má governança' sufoca. Já se pode passar, ao final de abril, da tétrica marca de 400 mil óbitos. Muitas vidas poderiam ter sido preservadas, houvesse ação eficiente coordenada pelo Governo Federal - com participação de governadores e prefeitos - no combate à Covid-19. A verdade é que o sistema de saúde colapsou e pacientes morrem sem atendimento médico - inimaginável caos. E a vacinação segue lenta. Responsabilidades há, natural que sejam investigadas. Estranho é o frenesi nervoso face a tal possibilidade.

E qual o foco do Governo Federal neste momento? Com manobras do presidente do Senado, vêm aí decretos que ampliam significativamente o acesso a armas de fogo e munições de diversos tipos e calibres. Veja-se: nos EUA, busca-se enfrentar a insana liberdade de porte de armas (inclusive de guerra) - reconhecido o decorrente dano social; no Brasil, portarias de controle e rastreamento de armas, instituídas no âmbito do Exército, foram anuladas pelo presente governo. Os novos decretos deverão, vapt-vupt, entrar em vigor hoje. Vírus não se combate a tiros - o que se pretende combater?

Pois é. Depois de queda, coices. Eis que nos chega um 'mimo': "Entidades médicas definem critérios para triagem de pacientes em UTIs diante de colapso" [Folha de SP, 09/04/2021]. Impossível dar racionalidade e "ética" à escolha entre quem vive e quem morre, sufocado. Diz-se: o modelo de triagem "utiliza dados relativos à gravidade do quadro agudo do paciente, a presença de doenças avançadas e ao estado de saúde física" ... "a idade dos doentes não é utilizada como critério único de triagem". Lógica ferida: doenças avançadas e comorbidades são, em geral, vinculadas a maior idade e velhice, o real critério definidor. O presidente da Associação Médica Brasileira diz que que assim se dá transparência a prática adotada em hospitais. Ah, sim: 'a população pode ficar tranquila', há um método de escolha dos premiados com o escasso recurso da UTI - aqueles com maior chance de sobrevida - e dos que morrerão sem atendimento adequado. E ao 'quase morto' ainda não premiado é oferecida a chance de participar de novas rodadas de triagem. Cruel escárnio. A que ponto chegamos...

Roberto Alves e Tarcisio Patricio, professores aposentados da UFPE.

 *Os artigos são de responsabilidade do autor e não refletem necessariamente a opinião do JC

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