O professor Antônio Alves (UFPE), meu amigo há mais de 40 anos e comentarista de meus artigos, diz que o meu último ("Pobre escola!") ficou a dever uma continuação, "criando uma frustração sobre a solução do impasse". Preciso dizer àquele meu velho amigo que, primeiro, não fui eu quem criou o impasse - o que me dispensaria de propor a solução!- e, segundo, qualquer que seja a solução acho inapropriado que ela venha de uma consciência supostamente "esclarecida" que solucionaria dilemas educacionais, como se a relação educação/sociedade contivesse enigmas a serem decifrados pela teoria "correta".
Como Alves mostrou uma certeira preocupação com a "escola tecnológica", desagregadora da "convivência humana", eu retomo o tema lembrando uma frase que li recentemente: "As crianças nascidas no G5 terão certa dificuldade em diferenciar o real e o virtual" (Silvio Salomono, CEO da Consultoria Capgemini). Eis porque ao invés de apresentar uma "solução" para o impasse, apenas me aproximarei da beira do abismo! Salomono tem razão: eu também acho que a guerra que a escola travará (na verdade, a nossa relação com a "realidade") é sobre a distinção entre o real como "ontologia" e o real como "fantasia". Certas pessoas podem achar maravilhoso visitar Paris a pé, sem sair de sua poltrona, usando óculos especiais, mas o fato é que estaremos vivendo aquilo que Benjamin chamou de "empobrecimento da experiência" - não são parisienses reais, nem as ruas de Paris: são algoritmos formando imagens previamente programadas. Mas o fato é que o grande dilema da Filosofia, desde Parmênides, estará resolvido: a verdade e sua sombra, a realidade e sua falsa consciência, a objetividade e sua ilusão ideológica, o físico e o metafísico, o transcendente e o imanente... não estarão mais em campos opostos e, assim, a tarefa da Filosofia estará finalmente terminada: ao invés de nos conduzir à liberdade (Hegel, Marx), apenas mostrará que O REAL É ILUSÃO, A ILUSÃO É O REAL! Caberá à tecnologia a refundação da Filosofia... e a educação deverá "partir da irrealidade do aluno"!
A técnica não tende a um objetivo, não promove sentido, não salva, não redime, não revela a verdade: ela FUNCIONA! E porque seu funcionamento se tornou planetário precisamos rever os conceitos de indivíduo, identidade, liberdade, verdade, objetividade, consciência, assim como os de natureza, ética, política, história, dos quais se nutria a Idade Humanística. Mas, dirá meu amigo Alves, esta não é uma tarefa para a Filosofia?
(Para meu amigo Antônio Alves)
Flávio Brayner, professor da UFPE
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