Da numerosa família bovidae, o bos taurus, popularmente conhecidos como touros, bois e vacas, foi feito para servir à espécie humana. Várias serventias. Oprimidos, não sabem a força que têm. Se soubessem estaríamos ferrados pela “revolução dos chifres”.
Versáteis, em geral dóceis, os ruminantes têm marcado uma vasta presença na mídia nacional e estrangeira. Recentemente, foram personagens da COP26 por causa do pecado contornável: a emissão de metano decorrente da estrondosa flatulência global. Na imprensa brasileira é, involuntariamente, um dos vilões da inflação. Picanha, nem pensar.
Fora disso é meigo e afetuoso, exceto quando treinado para algumas malvadas diversões. Esse jeitão tranquilo deu origem ao livro O touro Ferdinando (1936). A Walt Disney adaptou para um curta-metragem que lhe rendeu um Oscar na categoria (1938).
O personagem, amável e introvertido, respondia ao pedido da mãe: “Ferdinando venha brincar como os outros tourinho”. “Mãe eu prefiro cheirar as flores”.
Atenção: Ferdinando era touro e não boi. O boi é castrado. Já o touro é uma máquina de reprodução, distribuindo sêmen pessoalmente ou exportando para inseminação e aprimoramento dos rebanhos. O bicho é brabo. Nem por isso merece o espetáculo das touradas em que o empertigado toureiro, esgotadas as forças do animal, cruelmente, surpreende a vítima com o golpe lancinante e mortal da espada afiada.
Respeito, mas não me agradam vaquejadas, rodeios, enfim, nada que resulte em danos para quem amamenta e alimenta grande parte da humanidade. O crescimento dos hábitos veganos e vegetarianos, além da preferência gastronômica, é uma espécie de protesto aos sacrifício dos animais
Bom lembrar: eles também divertem o espírito ao enriquecer o patrimônio cultural brasileiro com a lindeza da festa de Parintins e a toada que anima o colorido do Bumba-Meu-Boi.
Estes registros vieram à tona quando me deparei com a versão do “charging bull’ , o touro de bronze de Manhattan, instalado no centro de São Paulo, B3, rua Quinze de Novembro, dourado, para simbolizar “a força e a superação do povo brasileiro”. A força do nosso povo dispensa a linguagem simbólica: sobreviver é suficiente.
“O bezerro de ouro” e seus idólatras precisam aprender com a resistência do Boi Serapião: “Este campo, vasto e cinzento/não tem entrar nem sair/e nem de longe imagina as coisas que estão por vir/e enquanto o tempo não vem/nem chega milho ao paiol/solenemente mastigo areia, pedras e sol”. (Carlos Pena Filho, 1929-1960, grande poeta pernambucano)
Gustavo Krause, ex-governador de Pernambuco
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