Um dos ônus mais anacrônicos destes trópicos, o foro anual devido pelos ocupantes de imóveis "de marinha", no importe de 0.6% do valor do terreno, aparenta estar adentrando seu ocaso, ao menos para 413 dos 49.365 imóveis em regime de aforamento em Pernambuco.
A União Federal, através da sua Secretária de Coordenação e Governança do Patrimônio da União (SPU), editou normativo que franqueia aos titulares de imóveis em tal regime a remição total desse.
Aderindo ao programa "SPU " o contribuinte poderá adquirir a fração do imóvel pertencente à União (17% da área), com desconto de 25% para pagamento à vista.
Para além de exonerar o dispêndio anual com o foro, a remição o exime, ainda, do laudêmio em caso de alienação futura (5% do valor atualizado do terreno), a par de possibilitar que o imóvel possa doravante ser ofertado em garantia sem necessidade de anuência da SPU. Além de imóveis em PE, a fase inicial do programa engloba outros igualmente no ES, RJ, SC e SP.
Para se ter uma idéia do descompasso das "taxas de marinha" com as finalidades que a ensejaram, rememore-se que foi instituída no início do século XIX, em prol da Coroa, sob o mote de proteção da costa. Jungidas à mesma estariam os imóveis numa faixa de até 33 metros em direção ao continente, mensurada a partir das marés altas e baixas de 1831 ("preamar médio de 1831"), critério que abarca aterros e margens de rios e lagoas que sofrem a influência daquelas.
A métrica de 33, por sua vez, foi eleita a partir da distância que um tiro de canhão alcançaria (a Instrução n. 348, de 1832, menciona "quinze braças craveiras", que equivalem à dita metragem). A fragilidade do referido critério não decorre meramente de guerras atuais serem travadas com mísseis intercontinentais (os canhões seguem perfilados em desfiles subseqüentes), mas sim, dentre outras razões, pelo fato de que, desde a sua instituição, são incontáveis os aterros que alteraram o traçado das áreas costeiras e ribeirinhas.
Para além disso a segurança da costa é lastreada pelos impostos federais e não pelo produto dessas "taxas", que, aliás, sequer são assim conceituáveis, como já apontou a jurisprudência. Antes tarde do que nunca….
Erik Limongi Sial, advogado, sócio fundador do Limongi Sial & Reynaldo Alves Advocacia.