Modernização, modernismo, modernidade e a Semana de Arte Moderna

O Movimento Modernista de 22 estava preocupado, na primeira fase, com ruptura estética e, na segunda fase, com "brasilidade cultural": "QUEM SOMOS NÓS E QUE PAÍS PODEMOS CONSTRUIR?"
FLÁVIO BRAYNER
Publicado em 22/02/2022 às 0:00
CENTENÁRIO Participantes da Semana de Arte Moderna de 1922 Foto: REPRODUÇÃO


Tenho lido constantemente, nestes 100 anos da Semana de Arte, que aquele "movimento modernista" ajudou o Brasil a se tornar "moderno". Sim e não! Quer dizer, é verdade que houve modernização do Estado nos anos 30 com Vargas, mas por uma "via prusssiana" (autoritária), assim como os intelectuais daquela década estavam "redescobrindo o Brasil" e falavam muito de "formação" e de "projeto nacional"! Mas, precisamos, inicialmente, fazer a distinção entre os termos deste artigo.

O que chamamos de MODERNIZAÇÃO se refere a aspectos tecnológicos, urbanos, produtivos, burocráticos..., mas não necessariamente sociais ou políticos: aquilo que Peter Eisenberg chamou de "modernização sem mudança", a respeito da passagem do engenho de açúcar para a usina no Nordeste brasileiro, mostra que tecnologia moderna pode estar associada a relações sociais pré-modernas; assim como certos países árabes de alto padrão tecnológico, mas com instituições que datam da época de Maomé (séc. VII d.C).

Ou seja, desenvolvimento das forças produtivas não altera necessariamente as relações de produção! Já o MODERNISMO é um movimento de ruptura com a tradição estética (poética, plástica, musical) em que não apenas a "função da arte" (um tema "moderno") como também a do "artista" perde seu caráter transcendente (Julien Benda considerava uma "traição"!) e se volta para os temas da vida ordinária. Não é a "representação" da vida, mas sua "transformação" que está em jogo, com temas relativos à sociedade da técnica, das lutas sociais, da urbanização, da multidão alienada... Já a MODERNIDADE é um projeto civilizatório centrado na figura do SUJEITO (liberdade, consciência e moralidade).

É um projeto de responsabilização secular do Homem pelo próprio Homem, tomando o futuro como dimensão privilegiada do tempo quando o "humano" se realizará, seja como progresso do espírito, seja como obra da revolução.

O Movimento Modernista de 22 estava preocupado, na primeira fase, com ruptura estética e, na segunda fase, com "brasilidade cultural": "QUEM SOMOS NÓS E QUE PAÍS PODEMOS CONSTRUIR?". Cabe, aliás, ao INTELECTUAL do tipo "orgânico", como Mário de Andrade, a condução do "processo" de autoconsciência nacional, diante do espetáculo de um povo "sem nenhum caráter". A relação Modernismo-Modernidade, pois, ainda não se realizou: continuamos lutando por uma Cidade com Cidadãos, uma República com Bem Comum, uma Democracia com Povo..., para o que a EDUCAÇÃO (Anísio Teixeira já sabia disso!) teria papel fundamental. Mas sejamos otimistas: vem aí o bicentenário!

Flávio Brayner, professor da UFPE

 

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