Mais um incêndio em palafitas do Recife, nas margens, ou melhor, dentro do Rio. Com tanta água por baixo e em volta como é que pega fogo? É simples. Basta entrar lá e sentir o fogo por perto. É questão de tempo, ou melhor, de uma faísca, de uma panela vazia esquentando em fogo brando e escaldando a fome.
Muito plástico e papelão. Madeira podre no piso, restos de coisas sobrantes dos lixos e arredores. Não temos todos os dias, incêndios nas palafitas, pois a natureza os protege. São os desiguais dos mocambos de antigamente e já foram favelados, ou melhor, “cidadãos de interesse social”.
O fato é que a cada quatro anos, há muitos anos, são massa de manobra para imagens do presente indigno e do futuro falso brilhante. É assim que é o retrato dos incêndios em palafitas. Por aqui, as margens do Capibaribe se acostumaram a assistir a mesma cena. Ouvir as mesmas providências – o apoio à família, o 'aluguelzinho' de um chão coberto de lama por aí, e uma consistente e falsa promessa das casas que serão imediatamente construídas.
Enquanto isso, um problemão para o passante que vai para a zona sul. O incêndio criou um grande engarrafamento e atrasou a hora do jantar.
Enquanto isso, as notas oficiais esquecem o que significa prioridade social. Fazem de conta, surpresos, que o incêndio precisa ser objeto de ampla, profunda e consequente investigação – “isso não pode mais acontecer”!
Ao contrário do dito no texto comum, vai continuar acontecendo no Rio Capibaribe, no Rio Tejipió, no Rio Pina, nos mangues e alagados. A propósito, os habitantes das palafitas dos Coelhos – Ilha do Leite denominada Favela do Papelão, há mais de 15 anos que sofrem incêndios. E, durante todo esse tempo, se constrói o conjunto habitacional Vila Brasil, filho do incêndio e fruto do descompromisso dos governantes e do cômodo silencio dos brasileiros-recifenses.
Na verdade, enquanto o Parque Capibaribe, no bairro das Graças, pertinho dos Coelhos e ao custo de R$ 45 milhões segue célere em obras para gerar belas imagens até a eleição de outubro. Palafiteiros, vocês são invisíveis, ou seja, bem mais que desiguais. Vocês não existem e vão continuar alimentando fogueiras para “atrapalhar o trânsito”.
Paulo Roberto Barros e Silva é desenhista.