OPINIÃO

CHUVAS EM PERNAMBUCO: causa indignação esse caos se repetir, tal e qual, 50 anos depois

Estamos, agora, vivenciando outra tragédia, das que se repetem sempre. Por isso, uma tragédia anunciada, porque está no DNA da nossa geologia.

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ROBERTO PEREIRA

Publicado em 30/05/2022 às 14:04 | Atualizado em 30/05/2022 às 14:05
PREVENÇÃO Tecnologia deve ajudar, principalmente, as pessoas que vivem em áreas de morro - DIEGO NIGRO/AFP

Que o Recife tem o lençol freático muito superficial é consabido de todos os gestores recifenses.
Somos uma cidade construída, em priscas eras, através de aterros, desde os primórdios, muitos de forma apressada e sem estudos mais aprofundados sobre a mecânica do solo.
Estamos, agora, vivenciando outra tragédia, das que se repetem sempre. Por isso, uma tragédia anunciada, porque está no DNA da nossa geologia.
O Recife tem uma história sólida de trabalhos em defesa civil, mas em tempos escassos e pontuais. Por exemplo, partiu de Jaime Gusmão, então presidente da URB, de quem fui aluno, desenvolver a ideia de tratar os morros como uma faixa, do cume à base, e que para cuidar de uma barreira não basta conter as encostas, mas direcionar as águas através de drenagem, plantio de grama, para conter as águas.
É dúbia a assertiva de que a natureza parece se vingar dos maus-tratos de nossa gente, mas também, sobretudo, da falta de cuidado por parte dos gestores que não priorizam as obras de saneamento, de urbanização, de políticas públicas que possam construir uma base de prevenção ao escoamento das águas que impiedosamente vitimizam, principalmente, as pessoas mais simples, mais humildes, normalmente moradoras das palafitas, dos casebres, a população dos morros e dos alagados.
Pasmem os leitores: na data de hoje, há 50 anos, a Folha de S.Paulo publica matéria de capa, com a seguinte manchete: “63 mortos, 8 mil sem casa” e como subtítulo, o seguinte: “Caos total em Recife invadida pelas águas.”
Causa indignação esse caos se repetir, tal e qual, 50 anos depois, à falta de continuidade dos projetos cujos resultados foram positivos.
Percebe-se que não existe, desde há muito, uma política de casas habitacionais construídas num solo seguro, sem riscos, capaz de resistir às intempéries da natureza.
No plano das injustiças sociais, está o nosso déficit habitacional, uma mazela mostrada pelo caos das águas inclementes.
É muito nítida a ausência de uma política de urbanização, de medidas capazes de se pensar estratégias no bojo de um planejamento eficaz.
A aritmética se resume à mobilidade versus drenagem. As ruas recifenses não têm um sistema de drenagem apto ao escoamento das águas.
O lençol freático do Recife, por vezes, é tão superficial, que chega a aflorar. O solo perde a capacidade de absorção, daí o enchimento das ruas, provocando a interdição das vias, em prejuízo gritante à mobilidade.
A população é também muito responsável pela poluição das ruas e dos canais. A Prefeitura do Recife, na gestão de Roberto Magalhães, quando imaginou e levou à execução o Projeto Nassau, fez o revestimento dos Canais de Setúbal, do Jordão e o Caiara, deu um exemplo eficaz da limpeza e da higiene dos seus derredores. Todavia – todavia! –, faltou monitoramento e todo o trabalho realizado foi – e vai! – se perdendo ao longo do tempo.
Diante das tragédias repetitivas e anunciadas, pede-se, com urgência, que se faça uma campanha educativa para que a população zele pela limpeza, evitando a poluição das ruas e dos canais, reservando ao solo o seu poder de absorção das águas enviadas por São Pedro.


Roberto Pereira, ex-secretário de Educação e Cultura

 

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