Os atos golpistas de 8 de janeiro de 2023, que provocaram o maior de todos os atentados contra os edifícios-sedes do Congresso Nacional, Palácio do Planalto e ao Supremo Tribunal Federal, que se encontram alicerçados na Praça dos Três Poderes, em Brasília-DF, jamais poderão ser esquecidos pela história e por aqueles que se preocupam com os destinos do Brasil. De forma planejada e arquitetada por quem tinha e tem interesse em demolir o atual presidente da República, democraticamente eleito pela maioria do povo brasileiro, aqueles lamentáveis episódios praticados por milhares de pessoas dispostas a mudar os rumos da democracia brasileira, na realidade, deram causa a uma série de vandalismos, invasões e depredações ao patrimônio público nacional, espetáculo degradante e incongruente com a vontade da maioria do povo brasileiro.
Os estonteantes atos de selvagerismo e de extremo desleixo com o patrimônio público, que desencadearam o trucidamento dos três edifícios que representam o emblema significante da nossa democracia e o do Estado de Direito, felizmente, provocaram uma reação demorada, mas eficiente da Força Pública, quando 2.182 pessoas foram presas no dia seguinte às atrocidades, todas elas autuadas em flagrante delito e acusadas pela prática de ilícitos penais contra o sistema democrático do país.
Realizadas as audiências de custódia, presididas por juízes designados pelo ministro Alexandre de Moraes, muitos permaneceram detidos por força da decretação de prisão preventiva, mas, contudo, uma grande quantidade de acusados foi solta, outros tantos foram submetidos às medidas cautelares substitutivas da prisão. O que se sabe é que, passados 30 dias dos atentados, somente cerca de 280 pessoas continuam recolhidas em estabelecimentos prisionais e em unidades militares, sob a custódia do Supremo Tribunal Federal.
Com a conclusão das investigações realizadas pela Polícia Federal, a Procuradoria Geral da República ofereceu denúncia-crime contra cerca de 1,3 mil pessoas que estavam acampadas em frente ao Quartel-General do Exército, em Brasília, que ali permaneceram até que foram detidas e remetidas aos presídios do Distrito Federal. Com o recebimento das denúncias oferecidas pelo Ministério Público Federal, o plenário virtual do Supremo Tribunal Federal acolheu as acusações, dando início, assim, aos processos penais propriamente ditos. Todos os réus - presos e soltos - tiveram a oportunidade de se defender, por escrito, das acusações lhes imputadas, seja através de advogado privado, seja pelas Defensorias Públicas. Muitos dos processos criminais instaurados já estão prontos para julgamento perante o Supremo Tribunal Federal.
Três dos muitos acusados já foram julgados pelo plenário presencial do STF, todos condenados pela prática dos crimes de tentativa de golpe de estado, abolição violenta contra o Estado Democrático de Direito, associação criminosa, dano qualificado e deterioração do patrimônio tombado.
O julgamento dos três primeiros réus, num universo de mais de 1 (um) mil acusados, durou cerca de 3 dias, equivalentes a 6 sessões, haja vista a necessidade, para cada réu, da leitura do relatório pelo ministro-relator, sustentações orais pelo Ministério Público e pela defesa e, finalmente, prolação do voto de cada um dos 11 ministros, sem contar os naturais e constantes debates entre os julgadores. A demora é mais acentuada, nesse caso, porque cada ministro há de individualizar a conduta do réu no fato delituoso e, em caso de condenação, há de demonstrar as provas da autoria, da existência do crime e a dosimetria da pena. Como cada ministro pode ter uma opinião diferente, a demora no julgamento é deveras agravada.
Sabe-se que todos os tribunais de Justiça (estaduais, regionais federais e superiores) possuem o seu Regimento Interno, disciplinando regras sobre o seu funcionamento, mormente em relação à sua composição e à sua competência jurisdicional. Hoje, o julgamento dos mais de 1 (um) mil acusados deve de ser realizado pelo plenário do STF, composto por 11 ministros. Como está no Regimento Interno do STF, na atualidade, certamente não menos de 1 (um) ano será necessário para que todos sejam julgados. A solução para evitar esta morosidade está na mudança do seu Regimento Interno, dando poderes às Turmas (hoje existem duas, compostas, cada uma, por 5 ministros), evitando os graves prejuízos aos processos de competência do pleno. Outra sugestão está na realização dos julgamentos pelo plenário virtual, sem contar que os acordos de não persecução penal, realizados entre o Ministério Público e a defesa dos réus, se homologados pelo ministro-relator, com certeza reduzirão o número de julgamentos.
O que se espera, todavia, é que todos os envolvidos na tentativa do golpe sejam efetivamente julgados, com ampla defesa e contraditório, mas, acima de tudo, que o Brasil jamais assista à uma nova tentativa de menosprezo à nossa capenga democracia.
Adeildo Nunes, juiz de Direito Aposentado, Professor da UNISÃOMIGUEL, Doutor e Mestre em Direito, Advogado Criminalista, Membro da Academia de Letras e Artes de Gravatá-PE.