Os sinais de recuperação da economia, como a redução no desemprego e o aumento do Produto Interno Bruto (PIB), verificados nos últimos meses, ainda não foram suficientes para baixar o nível de endividamento das famílias brasileiras. Pelo contrário: as dívidas chegaram a um patamar recorde em agosto, alcançando 79% das famílias. No ano passado, no mesmo mês, o índice era de pouco menos de 73% - o que reitera a necessidade de se buscar políticas públicas capazes de reverter essa tendência que, na prática, joga para baixo qualquer chance de melhora do poder aquisitivo e da distribuição de renda.
A pesquisa realizada pela Confederação Nacional do Comércio de Bens, Serviços e Turismo ainda aponta o crescimento da inadimplência, abrangendo em agosto quase 30% das famílias. Tanto o endividamento quanto a inadimplência configuram recordes, em 12 anos de acompanhamento. Com a inflação ainda elevada e os juros mantidos em alta para tentar frear o descontrole inflacionário, as dívidas devem continuar a subir, apesar do esboço de crescimento econômico. A população vê as finanças corroídas e os escassos recursos comprometidos com as contas contraídas antes. Em muitos casos, é um beco sem saída, gerando, além do consumo pendurado em bases frágeis, queda na qualidade de vida, com mais estresse e menos condições orçamentárias para sair do aperto.
Se a economia estivesse saudável e próspera, o endividamento maior não representaria, em si, um problema, ao menos em países sem as desigualdades existentes no Brasil. Aqui, a estrutura desigual ainda precisa lidar com uma conjuntura instável, sem benefícios coletivos consistentes e sustentáveis. Um dos entraves para a economia brasileira, neste instante, é a criação de empregos com salários menores do que eram pagos antes da pandemia de Covid-19. Dessa forma, a recuperação será lenta, e demandará muito mais empregos, além de contar com elevado índice de informalidade. O endividamento detectado em agosto é um sintoma de limitação para a recuperação esperada para o próximo ano.
As dívidas que são formadas para dar conta das despesas rotineiras aparecem como um sinal oposto ao do crescimento do PIB. Os indivíduos endividados gastam mais para viver do mesmo jeito, até que as dívidas se tornam impagáveis, e a renda não muda. Sobretudo para a classe média, que não receberá o alívio do Auxílio Brasil do governo federal, as perspectivas não são nada animadoras - a não ser que a economia deslanche, os salários melhorem e as oportunidades surjam para a quitação das dívidas. A situação se complica com a adoção de carnês e cartões próprios pelas redes de varejo, oferecendo aos consumidores uma facilidade que se revela, depois, ilusória, com o endividamento.
No horizonte de um novo governo no próximo ano, mesmo com a renovação de mandato, espera-se da política econômica mais do que o que se tem feito até agora, para aliviar o peso das dívidas dos ombros - e dos bolsos - dos brasileiros.