É improvável que se diga – e se escute – que um dos objetivos das guerras e da produção de suprimentos para a violência armada, seja a movimentação da economia. Como finalidade torpe ou consequência evidente, contudo, o fato é que há uma indústria do sangue derramado que abastece os conflitos, estimulando o círculo vicioso de intolerâncias que culminam em crimes violentos, e justificativas as mais diversas para a deflagração ou continuidade das guerras. E essa indústria belicosa obteve um faturamento global recorde no último ano, segundo o Instituto Internacional de Pesquisa para a Paz (Sipri), de Estocolmo, na Suécia: 2,24 trilhões de dólares, ou cerca de 11 trilhões de reais, pelo câmbio atual.
Para se ter uma ideia da dimensão desses valores, o Produto Interno Bruto (PIB) de Pernambuco, no ano passado, foi de R$ 255 bilhões. O do Brasil não chegou a R$ 10 trilhões. Tudo que se produziu no país com 214 milhões de habitantes foi menor do que o valor movimentado pelo comércio mundial de armamentos. Vale frisar: o resultado financeiro de equipamentos, armas e munições para a violência e as guerras foi maior do que o PIB de uma nação do tamanho do Brasil. Não é pouca coisa. E enquanto cifra jamais antes alcançada, expressa uma trajetória de gastos que aponta para uma tendência de autodestruição, despontando nos últimos meses com o retorno de ameaças da Guerra Fria, na forma de testes e exercícios militares com bombas nucleares – de tecnologia muito mais avançada que aquelas que caíram sobre o Japão, há quase 80 anos.
O desenvolvimento tecnológico de mísseis, bombas e artefatos de aniquilação é um capítulo hediondo da história humana, em pleno curso. O pior é saber que não faltam compradores, nem quem se disponha a utilizar as armas para dar vazão à produção. Apesar de ter tido um aumento de 640% nos gastos militares, a Ucrânia, palco da invasão da Rússia, não figura nem entre os dez países no topo da lista. Além da Rússia, a Europa elevou os gastos, no maior crescimento das últimas décadas, com os membros da Comunidade Europeia preocupados com a avanço dos russos, e fornecendo armas para os ucranianos. Mas a maior parte continua com os Estados Unidos, responsável por 40% de todas as transferências de armas e munições no planeta.
É possível que os números levantados pelo Sipri sejam menores do que a realidade, uma vez que as despesas com armamentos podem não vir inteiramente à tona, sobretudo por governos fechados como os da China e da Rússia. Mesmo assim, os valores disponíveis indicam a espiral da insanidade em que a humanidade parece ter despencado. Quando sabemos as dificuldades que populações no mundo inteiro passam para conseguir se alimentar, se abrigar, dispor de água, saúde e educação diariamente, a soma das despesas com o derramamento de sangue surge como o cúmulo da incoerência da espécie dominante sobre o planeta, e que se define como a única inteligente.