A invasão do território ucraniano pela Rússia, há mais de dois anos, além de elevar os gastos globais com armamentos, consolidou um cenário de Guerra Fria em pleno calor de conflito bélico em andamento. A cada repreensão de líderes ocidentais, o presidente russo, Vladimir Putin, dobra a aposta na ação ofensiva, apesar da crescente insatisfação de sua própria população diante dos bloqueios comerciais e econômicos, e da falta de perspectivas de um acordo de paz na Ucrânia. Mesmo que a oposição seja calada à força, o regime totalitário de Putin não pode silenciar completamente o desagrado de parcela dos russos com suas decisões. E enquanto a diplomacia internacional não avança na direção da pacificação, a política interna surge como a melhor chance – ainda que improvável, no curto prazo – para reduzir o poder do Kremlin e recuar as tropas do solo ucraniano.
O aumento dos orçamentos militares, as ameaças de Putin aos aliados de Kiev e a pressão política sobre o presidente russo transformam a Europa num barril de pólvora prestes a explodir. Os discursos insensatos proliferam, no rastro dos bilhões de dólares gastos em mísseis e no desenvolvimento de tecnologias para a guerra – que se traduz em sangue e morte de milhares de pessoas, numa escala local. Em eventual trespasse das fronteiras ucranianas, a guerra na Europa pode significar o envolvimento de milhões de indivíduos, com repercussões gigantescas para a economia global.
A possibilidade de entrada de tropas da OTAN no território ucraniano disparou nos últimos dias, após a declaração do presidente da França, Emmanuel Macron, de que desejaria enviar ajuda bélica a Volodimir Zelenski. Outros líderes europeus correram para conter o alarme, desencorajando a sugestão, cuja concretização teria tudo para detonar uma Terceira Guerra Mundial, como disse o ministro das Relações Exteriores da Itália, Antonio Tajani. Para ele, a defesa dos ucranianos pode continuar sendo feita de longe, com recursos e armas, sem tropas. O temor de um alastramento do conflito ganharia contornos reais, caso Putin resolvesse responder aos ataques da França, da OTAN ou de qualquer outro exército, sobretudo através do arsenal nuclear de que dispõe.
O apoio à Ucrânia sem intervenção da aliança militar do Ocidente tende a crescer, com a continuidade da guerra. A França de Macron e a Alemanha prometem instalar fábricas de armamentos em solo ucraniano, embora os alemães rechacem, publicamente, a alternativa de envio de tropas. Para a Rússia, as palavras do presidente francês soaram quase como uma declaração de guerra, ao proclamar Putin como inimigo da Europa. “A Ucrânia precisa vencer”, afirmou Emmanuel Macron, frisando que o adversário não é o povo russo, mas o Kremlin.
Segundo ele, a discussão sobre o envio de tropas vem sendo travada na OTAN há meses, sem o alcance de um consenso – o que se traduz como tema controverso, no qual uns defendem, e outros, não. Caso um país membro resolva agir por conta própria, em defesa da Europa e da Ucrânia, será difícil frear uma escalada.