A periferia será sempre o contraste do lockdown adotado nas cidades e estados. Pelo menos no Brasil. Em geral, moradores do subúrbio e de áreas mais periféricas dos municípios vão estar constantemente mais nas ruas do que aqueles que residem em bairros mais centrais e de classe média. Por isso, para quem monitora os índices do isolamento social - rígido ou não -, não é surpresa constatar aglomerações nas periferias e verificar a redução do percentual de cumprimento do lockdown nos dias úteis, como aconteceu na Região Metropolitana do Recife.
Depois de comemorar a primeira colocação entre os Estados e as capitais que mais respeitaram as regras do isolamento social rígido no País, Pernambuco, o Recife e as quatro cidades metropolitanas incluídas desde o sábado 16/5 no lockdown (Olinda, Jaboatão dos Guararapes, Camaragibe e São Lourenço da Mata) viram os índices de cumprimento pela população caírem. Enquanto no sábado (16) e no domingo (17), o percentual foi superior a 60%, na segunda-feira (18), todos os municípios ficaram na faixa dos 50%, segundo apontou o Painel Índice de Isolamento Social do Ministério Público de Pernambuco (MPPE), feito em parceria com a empresa de tecnologia In Loco.
No terceiro dia de proibição da circulação de pessoas e veículos - com exceção das que prestam atividades essenciais -, o Recife registrou 55,5% de isolamento, Olinda ficou em 55,4%, enquanto que Camaragibe, São Lourenço da Mata e Jaboatão dos Guararapes registraram 52,5%, 51,8% e 52,2% respectivamente. Nos dois primeiros dias, essas mesmas cidades tiveram índices que variaram de 58% a 62,1% - como foi o caso do Recife, sendo a capital brasileira que mais respeitou o #fiqueemcasa. Por ser o primeiro dia útil após o início das regras rígidas e o principal teste da medida, a redução do cumprimento pela população assustou.
E o susto foi embasado em dois aspectos. Em primeiro lugar, porque as autoridades de saúde afirmam que a taxa ideal de adesão ao isolamento é de 70% - o que ainda não foi alcançado por nenhuma cidade pernambucana e, pelos números, parece estar cada vez mais distante. Em segundo lugar, porque uma grande quantidade de pessoas circulando na periferia das cidades com lockdown se tornou um flagrante diário, principalmente no sábado e na segunda-feira.
Mas segundo o gerente de dados da In Loco, José Luciano Melo, isso vai sempre acontecer porque a periferia precisa estar e sair à rua com mais frequência do que a classe média, por exemplo. E, nos dias úteis, essa movimentação será ainda maior. É a hipótese que os analistas consideram. “Não há como ser diferente. A maioria das pessoas que residem nos bairros mais afastados do Centro, dos grandes corredores e avenidas, que estão no subúrbio, por exemplo, são trabalhadores de serviços essenciais, que precisam e têm autorização para sair de casa. Por isso essa redução, por exemplo, dos índices da segunda-feira em relação ao fim de semana. E não é um cenário verificado apenas no Recife ou em Pernambuco. É no País inteiro”, explica.
Pádua defende que os índices de isolamento precisam ser analisados por dias equivalentes. “Não podemos comparar uma segunda-feira com um sábado ou um domingo, por exemplo, quando já há uma redução natural da circulação de pessoas. Além disso, é preciso considerar a retomada do pagamento do auxílio pela Caixa Econômica Federal (CEF), que foi nesta segunda”, defende. Mesmo assim, apresentou dados que mostram que a primeira segunda-feira do lockdown teve mais respeito ao isolamento do que as duas segundas anteriores nas cinco cidades da RMR. “A taxa de isolamento da segunda (18) foi 9% maior do que a verificada na segunda (11) nessas cinco cidades. Mas voltamos a insistir. A Operação Quarentena é complexa e tem na fiscalização pela força policial apenas 10% do seu poder. Os 90% restantes dependem da conscientização da população”, alerta.