Polícia investiga contrato de R$ 12,7 milhões do Governo de Pernambuco para compra de cestas básicas

De acordo com a investigação, há indícios de que a empresa não tenha capacidade técnica para um contrato deste porte
Cássio Oliveira
Publicado em 04/06/2020 às 10:49
Pernambuco também se destaca ocupando o primeiro lugar no Nordeste com a instauração de 3.753 inquéritos policiais e no número de inquéritos concluídos que são 2.397 Foto: DIVULGAÇÃO


Atualizada às 18h19

A Operação Inópia da Polícia Civil de Pernambuco investiga um contrato de R$ 12,7 milhões firmado entre a Secretaria de Desenvolvimento Social, Criança e Juventude (SDSCJ) do Estado e a empresa Juntimed Produtos Farmacêuticos e Hospitalares, para a distribuição de cestas básicas a famílias de baixa renda durante a pandemia do novo coronavírus. A informação foi confirmada pela delegada Viviane Santa Cruz, em coletiva de imprensa, na manhã desta quinta-feira (4).

Segundo a delegada, a investigação ainda está em fase inicial e apura se a empresa tem capacidade técnica para um contrato neste valor. "A empresa não é, principalmente, de gêneros alimentícios. Quando apuramos, inclusive, com a própria Polícia Federal, a empresa não teria em seu cadastro informações de existência de funcionários com carteira assinada e não tem nenhum carro registrado. Então, como uma empresa dessa, que antes era uma gráfica, e se tornou a quatro meses em farmacêutica, fez contrato com Pernambuco de cesta básica? Foram essas as suspeitas", afirmou Viviane Santa Cruz.

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O contrato investigado tem validade de 120 dias, foi firmado em maio e prevê a contratação de 200 mil cestas básicas para distribuição em diversos municípios, custando R$ 63,50 cada cesta.

Segundo o Portal Tome Conta, do Tribunal de Contas do Estado (TCE-PE), do valor total do contrato, cerca de R$ 7,5 milhões já foram liquidados e 2,7 milhões já foram pagos pelo governo do Estado até a publicação desta matéria. A diferença é que o valor liquidado é referente ao serviço que a empresa executou até o momento e, quando o fornecedor de fato receber o recurso, ele é considerado valor pago.

"Queremos deixar claro que tivemos a preocupação de fazer a operação o mínimo invasiva e temos de ter cuidado em ações iniciais. É uma secretaria importante para o Estado no momento e precisamos proteger os recursos gastos pela administração pública. Então, pedimos cautela para averiguar se os gastos estão sendo feitos devidamente pela empresa e se são devidamente entregues as cestas básicas", afirmou a delegada Viviane.

Na coletiva, a delegada também esclareceu que há a informação de que algumas cestas foram entregues, mas só no decorrer da investigação que mais detalhes poderão ser repassados, como a quantidade de cestas e em quais municípios. Uma das cestas chegou a ser apreendida para que seja averiguado se os itens que a compõe são os descritos no contrato. Segundo a polícia, ao chegar na sede da empresa, foi constatado que a mesma não tem uma placa e, sim, um papel com seu nome escrito à caneta e toda a operação seria muito "rudimentar" para uma empresa que tem contratos em valores vultosos. 

A operação teve a participação do Ministério Público de Pernambuco (MPPE), da Polícia Federal (PF) e da Controladoria Geral da União e cumpriu cinco mandados de busca e apreensão na Secretaria de Desenvolvimento Social, na sede da Juntimed, em Paudalho e em três endereços vinculados aos sócios da empresa, sendo um no Recife, e outros dois em Brasília e Goiás.

Nos locais, foram apreendidos celulares, computadores e diversos documentos. Além disso, na casa de um dos sócios, no Recife, foi apreendida a quantia de R$ 50 mil em espécie. A polícia não informou os nomes dos alvos da investigação, mas confirmou que são dois sócios da Juntimed. Além disso, segundo a polícia, nenhum agente público foi alvo da operação, até o momento.

"Apreendemos os R$ 50 mil, todo em notas de R$ 100, encontrado na casa de um dos sócios da empresa, mas a parte pode alegar a procedência do dinheiro e tentar restituir se tiver origem lícita", explicou a chefe do Departamento de Repressão à Corrupção e ao Crime Organizado (Draco), Sylvana Lellis.

Sobre o nome da operação, "Inópia", Sylvana explicou que faz referência à situação de escassez, de penúria, de miséria. "A gente quer que as pessoas que estão necessitando efetivamente recebam essas cestas básicas, já que o estado está desembolsando um valor tão alto", afirmou.

Olinda

A empresa Juntimed Produtos Farmacêuticos e Hospitalares já tem um contrato com a Prefeitura de Olinda para fornecimento de alimentos no valor de R$ 2 milhões que está sendo investigado pela Polícia Federal (PF) por contar com recursos da União. "Há um inquérito e vamos compartilhar as provas com o inquérito já em curso na Polícia Federal", explicou Mariana Cavalcanti, delegada Regional de Combate ao Crime Organizado da PF.

A investigação também encontrou divergência no valor da cesta, que para Olinda custou R$ 40 a unidade e para o Estado, R$ 63,50. No entanto, segundo a delegada Mariana, a diferença de valor pode ocorrer pelo fato de a distribuição em todo o Estado, até para municípios do Interior, custar mais no quesito transporte.

A Polícia Civil não pôde detalhar sobre a operação em Olinda, visto que a investigação está com a Polícia Federal. A reportagem entrou em contato e aguarda o posicionamento da empresa.

RESPOSTA DO GOVERNO DE PERNAMBUCO

Em nota, a Secretaria de Desenvolvimento Social, Criança e Juventude (SDSJC) informou que está à disposição da polícia e demais órgãos de controle nas apurações relativas à Operação Inópia, que tem como alvo a empresa Juntamed LTDA. Confira a nota:

O processo de aquisição de 200 mil cestas básicas não se deu sem licitação. Ao contrário, obedeceu todas as regras da lei 8.666/93, em seu artigo 24, e na 13.979/2020, em seu artigo 4. A Secretaria recebeu até agora 129.820 cestas básicas e já distribuiu 63.793 para 54 municípios, tendo pago R$ 2.717.800,00, dos R$ 12,7 milhões do valor total do contrato, que já inclui a logística de entrega em todos os municípios pernambucanos.

Ainda serão entregues pela empresa 70.180 cestas. Na manhã da última quarta-feira (03), a SDSCJ foi surpreendia com a Operação Inópia, da Polícia Civil com a participação da Polícia Federal. Foram entregues, em formato digital, a policiais civis a cópia completa do processo de aquisição dos produtos. Também foram disponibilizados vídeos e recibos que comprovam as entregas já realizadas até o momento.

A aquisição das cestas básicas se deu pela necessidade de atender demandas de grupos em situação de vulnerabilidade social no Estado, que, em meio à pandemia mundial, tiveram suas atividades e situação econômica afetadas. O recorte dessas famílias leva em conta a situação socioeconômica vivenciada por elas, dentro de critérios de vulnerabilidade, sendo possível a identificação prévia das pessoas beneficiadas.

Além de todas as medidas para conter o avanço do Coronavírus, o Governo de Pernambuco segue atendendo as demandas da população mais vulnerável durante a pandemia, com ações sociais de distribuição de cestas básicas, entrega de refeições prontas, de kits de higiene e máscara, além de medidas conscientização nas comunidades. O compromisso da gestão é com a vida das pessoas e as dificuldades das famílias vulneráveis.

A pasta continua à disposição da Polícia e dos órgãos de controle para prestar qualquer esclarecimento sobre o assunto, na certeza de que todo o processo está dentro da legalidade".

RESPOSTA DA PREFEITURA DE OLINDA

Por meio de nota, a Prefeitura de Olinda garantiu a "legalidade a transparência" do processo de compra das cestas básicas com a empresa Juntimed Produtos Farmacêuticos e Hospitalares.

Confira a nota:

"Em relação à contratação das cestas básicas realizadas pela Prefeitura de Olinda, o órgão garante a legalidade e transparência do processo, que foi realizado de forma correta. Os itens foram contratados com o preço da menor cotação conseguida dentro de um contexto de escassez de produtos, devido à grande procura por outros órgãos e Prefeituras. Os produtos, por sua vez, foram entregues de forma organizada e devidamente registrada.

Sobre a empresa, o CNAE secundário lhe garante licença para venda de produtos alimentícios e seu capital social é maior que todo o montante contratado pela Prefeitura.

A Prefeitura de Olinda ressalta que não recebeu qualquer notificação de inquérito seja por parte da Polícia Civil, seja por parte da Polícia Federal . A Prefeitura preza pela transparência e legalidade nos processos e se coloca à disposição dos órgãos competentes para quaisquer esclarecimentos". 

Resposta da empresa

Também por meio de nota, a empresa a empresa Juntimed LTDA defendeu-se afirmando que é uma "empresa idônea", há 10 anos em funcionamento. Também afirmou que, apesar de ter como atividade principal o comércio varejista de produtos farmacêuticos, "possui autorização legal para outras atividades secundarias, entre elas a de alimentos em geral", o que explica ter participado da licitação para fornecimento das cestas básicas de "maneira legal, obedecendo os critérios técnicos". 

"Por fim, esclarece ainda, quanto a diferença de valores da unidade da cesta básica comprada pelo Município de Olinda e a do Governo do Estado, foi devido a quantidade de itens constantes em cada cesta, bem como ao custo da logística e distribuição em vários municípios do estado de PE – e a respeito dos funcionários,
todos são temporários e recebem semanalmente, assim como os veículos são terceirizados", finaliza a nota. 

Veja a íntegra da nota:

"A empresa Juntimed LTDA, alvo da operação Inópia deflagrada na manhã da última quarta-feira em conjunto pelas Polícias Civil de PE e Federal, esclarece se tratar de empresa idônea, constituída há quase 10 anos, e que tem como atividade principal o comércio varejista de produtos farmacêuticos, porém, possui
autorização legal para outras atividades secundarias, entre elas a de alimentos em geral – motivo qual participou da licitação objeto da referida operação, de maneira legal, obedecendo os critérios técnicos; ressaltando ainda que já cumpriu com a entrega de mais de 60% das cestas básicas, todas mediante recibos, e o Governo do Estado até então apenas realizou o pagamento da quantia equivalente a 20% do
contrato.

Por fim, esclarece ainda, quanto a diferença de valores da unidade da cesta básica comprada pelo Município de Olinda e a do Governo do Estado, foi devido a quantidade de itens constantes em cada cesta, bem como ao custo da logística e distribuição em vários municípios do estado de PE – e a respeito dos funcionários,
todos são temporários e recebem semanalmente, assim como os veículos são terceirizados". 

Paudalho

A Prefeitura de Paudalho não é alvo da operação e enviou uma nota enfatizando isso. "A Prefeitura do Paudalho informa que a Operação Inópia, deflagrada pela Polícia Civil não teve como alvo a Prefeitura da cidade. A empresa que está sendo investigada tem sede no município, entretanto não tem qualquer ligação com a Prefeitura do Paudalho. A administração ressalta que segue no comprometimento com a verdade, legalidade e transparência".

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