Em torno de 33% das desapropriações previstas foram feitas oito anos após o início da execução do projeto de urbanização da Bacia do Fragoso, em Olinda, um grandioso pacote de obras que inclui o Canal do Fragoso, a Via Metropolitana Norte e uma lagoa de retenção. A constatação foi feita a partir de dados apresentados ao JC pela Companhia Estadual de Habitação e Obras (Cehab) e pela Prefeitura de Olinda.
Até agora, 800 de um total de 2.300 imóveis foram desapropriados pela Cehab para tocar o revestimento no rio e o sistema viário. Já a lagoa fica a cargo do município, que precisa retirar os 97 imóveis previstos. Isso significa que a população ainda deve esperar muito pela conclusão do projeto, já que a derrubada é o primeiro passo para início de novas etapas nas obras, que deveriam ter sido entregues em 2016.
“A Cehab nos disse que iria finalizar em 2022, mas adianto que isso não vai acontecer. Não há como estabelecer um prazo seguro, porque ela tem dificuldade para negociar com alguns imóveis que acabam indo para o judiciário”, explica o auditor do Tribunal de Contas do Estado (TCE), Alfredo Montezuma, que fiscaliza as obras desde o início.
O TCE estima que os custos para o projeto ultrapassem os R$ 414 milhões fora as desapropriações, orçadas em torno de R$ 100 milhões. Segundo Montezuma, a negociação de quatro imóveis foram entraves na primeira etapa das obras, entregue em março de 2020 com o revestimento de 2,3 quilômetros do Canal do Fragoso, da Avenida Coronel João Melo de Morais até a altura do Maxxi Atacado, e a construção de oito pontes.
Agora, está em fase de finalização a pavimentação de duas faixas de rolamento às margens do canal, que vão da altura da Avenida Coronel João de Melo Morais até a Rua Bom Jardim, no bairro Jardim Fragoso. Também estão sendo construídas as duas alças de acesso que vão da PE-15 até as marginais do canal do Fragoso, e a pavimentação das duas vias marginais, no trecho entre a rua Bom Jardim até a Avenida Sérgio G. Vasconcelos.
Segue em fase de licitação a obra do trecho entre a ponte de Rio Doce e a Avenida Sérgio G. Vasconcelos, enquanto o trecho entre a Ponte de Rio Doce até a Ponte do Janga ainda aguarda liberação de recursos do Governo Federal.
Enquanto isso, o revestimento de 2,1 km do canal e a pavimentação de duas faixas de rolamento ainda dependem da conclusão das desapropriações entre a Avenida Sérgio G. Vasconcelos até a ponte do Janga.
Para a população que terá de deixar as casas, o principal embate são os valores pagos pelo poder público, como relata o pedreiro Lindemberg Cardoso, de 41 anos. “Minha casa tinha mais de 100m² e era no valor de R$ 160 mil, mas me deram R$ 86 mil; e isso porque fiquei lutando. Morei dois meses de aluguel porque tive que sair de lá com 15 dias quando deram o dinheiro", conta.
Montezuma, no entanto, pontua que, a região das obras foi sendo irregularmente ocupada com o passar dos anos, e cobra controle urbano no município.
"Nem todo mundo está nessa situação de morar há décadas em um local precisar sair. Quando vemos imagens de drone do Fragoso comparando com anos atrás, vemos uma expansão da ocupação. Por isso criticamos a prefeitura, porque se não fizer um controle adequado, vamos ficar enxugando gelo. Desapropriam, não atacam logo e as pessoas invadem novamente", disse.
O atraso prejudica os moradores do entorno, que todos os anos sofrem com intensos alagamentos nos períodos de chuva, que seriam minimizados com a urbanização. É o caso da autônoma Andreia Neves, 35, que constantemente perde móveis e eletrodomésticos para as águas.
"Não dá mais para chover e a gente ficar se tremendo. A obra está em passos de tartaruga. Buracos e buracos que se abrem e que ficam cheios de água, ficamos à mercê dos mosquitos."
Desapropriações para a lagoa de retenção
Após deixar o endereço antigo para construção do Canal, Lindemberg ergueu uma nova casa nas proximidades, sem saber que também seria marcada para desapropriação - dessa vez para construção da lagoa de retenção. Os moradores da região do Sítio Marreta receberam a notícia de surpresa no último mês, e estão desesperados com a possibilidade de saída.
“Tiraram-me de lá e agora estou aqui, no mesmo estado. A conversa é que vai esticar mais a lagoa, e ninguém sabe como é. A gente não tem moradia digna, porque saem tirando. Estamos sem sossego. Querem que a gente vá para uma favela?”, questionou o pedreiro.
Atualmente, a Cehab-PE realiza um estudo de impacto da desapropriação da área, mas a execução será pelo município, que é o responsável pelas obras da lagoa de retenção.
A lagoa custará R$ 4,5 milhões e tem previsão de término em 12 meses a partir do início dos serviços. Uma empresa já venceu a licitação, mas a Prefeitura de Olinda diz aguardar a autorização do Ministério do Desenvolvimento Regional (MDR) para dar início aos trabalhos. Por nota, informou que não será necessária nenhuma desapropriação na primeira frente de trabalho.