Se já era desassistida, a população em situação de rua pode, agora, perder o pouco de atenção que recebia. Isso porque 51 coletivos que atuam em prol dela no Recife vão sair do ponto de apoio que tinham há mais de dois anos no antigo Liceu de Artes e Ofícios de Pernambuco, no Centro da cidade.
O espaço foi cedido pela proprietária, a Universidade Católica De Pernambuco (Unicap), no início da pandemia da covid-19, em parceria com a ONG Novo Jeito e a Prefeitura da Cidade do Recife. Mas o imóvel terá de ser devolvido pelo Unificados pela Pop Rua, que passou a geri-lo, ainda agosto deste ano. Foram dados 20 dias para saída.
“A Unicap permitiu que ficássemos 6 meses para atender pessoas em situação de rua; já estamos há mais de 2 anos. Sabíamos que era temporário e que precisaríamos sair em algum momento, mas não temos outro ponto para atuar”, afirmou Rafael Araújo, presidente do Unificados.
No imóvel, são preparadas, diariamente, refeições para serem distribuídas pelas ruas da cidade por dois ou três grupos. Ainda, são oferecidos serviços de saúde, atendimentos jurídicos e capacitação profissional com cursos para cerca de 270 pessoas por semana.
Através dele, já foram distribuídas mais de 345 mil refeições, 320 mil litros de água mineral, 5 mil cestas básicas e 29 mil kits de higiene. Além disso, os atendimentos de higienização ultrapassaram 31,5 mil, e os de saúde, 1,5 mil.
A preocupação dos coletivos é que haja perda da assistência social voltada às pessoas sem teto - população que aumentou visivelmente na capital pernambucana nos últimos anos, ainda que esse aumento não tenha sido quantificado e divulgado.
Um trabalho que deveria ser feito pelo próprio poder público, mas que, pela ineficácia dos governos em mudar a realidade social do País, recai sobre essas instituições.
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“O espaço foi essencial para conseguirmos realizar essa ação de forma estruturada na pandemia e com todos os projetos envolvidos. Durante as últimas chuvas, fizemos um trabalho enorme, abrigamos 35 pessoas durante 20 dias e distribuímos muitas doações. Vai ficar um vazio muito grande se não pudermos atuar”, pontuou Rafael.
O imóvel, que até ser ocupado pelos coletivos estava abandonado, possui uma sala de artes onde o projeto Aurora de Estrelas realiza oficinas de pintura e artesanato e outra sala onde o projeto Fábrica Fazendo Arte oferece oficinas de dança e teatro.
O Aurora de Estrelas, por exemplo, mantém um ateliê aberto no local, com informações artísticas, além de oferecer oficinas de pintura, dança, artesanato, música e fala para quem vive nas ruas. Um trabalho que possibilita esses cidadãos - muitas vezes invisibilizados - a se expressar e contar a própria história.
“A gente está tirando projetos que fazem serviços que deveriam ser de responsabilidade do Estado e os jogando na rua. Isso vai ter um impacto também na violência urbana”, opinou o artista plástico Manoel Quirino, que faz parte do coletivo.
Grupos buscam soluções
Representantes das organizações pedem pela prorrogação do prazo para desocupação do imóvel e pela ajuda do poder público e da sociedade civil para que seja cedido uma nova sede. Interessados em ajudá-los podem enviar um e-mail para o unificadospsr2020@gmail.com.
“Tínhamos vários coletivos atuando com a população em situação de rua, mas piorou tudo na pandemia e essa mobilização se fez necessária. A gente se organizou no Liceu. Não é um favor, é uma missão social. Agora, o que vai acontecer com os projetos?”, questionou o artista.
Por nota, a Unicap esclareceu que "o pedido para a saída dos movimentos que estão no prédio do antigo Liceu se deve à necessidade de interdição para manutenção corretiva devido às fortes chuvas. Para a realização dos trabalhos, é preciso a desocupação total do edifício por uma questão de segurança."
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