Prefeitura do Recife toma decisão sobre centro para população de rua alvo de protestos em Boa Viagem

Instalação do equipamento social provocou protestos da população de Setúbal, em Boa Viagem, no último ano
Katarina Moraes
Publicado em 30/03/2023 às 15:37
Moradores e políticos seguem pedindo pela mudança de endereço do Centro Pop Foto: CORTESIA


A Prefeitura do Recife manteve a intenção de instalar um Centro Especializado de Atendimento da População em Situação de Rua (Centro POP) no bairro de Boa Viagem, na Zona Sul da cidade, mesmo após protestos contrários feitos por moradores da região. A informação foi confirmada por fontes ao JC.

Organizações sociais têm sido convidadas pela equipe da Secretaria de Desenvolvimento Social e Direitos Humanos da capital pernambucana responsável por gerir o novo equipamento para iniciar os trabalhos. Uma delas é a Samaritanos Recife, que há 8 anos dá suporte ao público em vulnerabilidade.

"Tenho reunião marcada com a gestora. Estão com tudo encaminhado, só organizando os fluxos de dentro do equipamento para abrir ao público. Vai ser na mesma casa e a equipe já está se reunindo no local”, disse Rafael Araújo, presidente da ONG.


A casa em questão está localizada na Rua Sargento Waldir Correia, nº 247, em uma área circunscrita em Boa Viagem que é chamada de Setúbal. A residência foi alugada pelo município em 25 de março de 2022, segundo publicação no Diário Oficial do Município.

Quando a notícia chegou à população que vive nas proximidades, parte dela se mobilizou contra a instalação do Centro Pop, fazendo passeatas e até um abaixo-assinado com milhares de assinaturas. Ela temia que o espaço atraísse a criminalidade para a área, majoritariamente residencial.

A mobilização fez efeito ao menos por ora, e a instalação do Centro Pop - em uma casa alugada por R$ 156 mil pelos 24 meses contratados, com recursos advindos do Fundo Nacional de Assistência Social (FNAS) - foi paralisada até segunda ordem. 

CENTRO POP ESTÁ SENDO EQUIPADO

À imprensa, a gestão alegou, durante meses, que ainda não tinha uma resposta sobre se o endereço do equipamento seria alterado ou não. A resposta se repetiu no último contato feito pelo JC, na última semana.

Contudo, dessa vez, a Prefeitura afirmou que "no momento, apenas a equipe de servidores responsáveis por trabalhos externos estão utilizando o imóvel como ponto de apoio, e com certeza absoluta, não estão ocasionando nenhum transtorno ou perturbação à paz dos moradores do local."

Documentos internos confirmaram que há servidores sendo locados para o Centro, nomeado de José Pedro de Lima Filho, além de pedidos administrativos por carimbos, garrafões de água e outros itens para colocar o espaço em funcionamento.

 
 
 
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NOVAS MOBILIZAÇÕES CONTRA O ESPAÇO

Uma das manifestantes, que não quis se identificar, contou que está se mudando do local após 50 anos por medo de represálias. "Estamos com medo de pessoas em situação de rua e das pessoas na administração. Prejudicaram a vida de toda uma população que mora ali", reclamou.

Somam-se ao coro dos moradores os vereadores Ebinho Florêncio (Podemos)Paulo Muniz (Republicanos), que se reúnem com a gestão para alterar a localização ou a função do equipamento. Ebinho planeja, nas próximas semanas, apresentar um projeto de lei a fim de que o espaço seja usado, em vez de um Centro Pop, para a promoção de cursos profissionalizantes.

"Se a população de rua tivesse morando na Praça de Casa Forte, já tinham dado uma solução, mas há um preconceito às avessas contra Boa Viagem, achando que só existe gente rica. São pessoas comuns que com muito sacrifício têm suas casas ali e que não querem isso (o Centro)", disse o republicano.

Para Rafael, do Samaritanos, o espaço tem um efeito contrário. Em vez de aumentar a criminalidade, auxilia as pessoas que já estão na localidade a terem uma nova chance, já que Boa Viagem tem a segunda maior concentração de população de rua do Recife.

"Mesmo assim, é o lugar com menos equipamentos voltados para esse público, que basicamente concentrados no Centro e na Torre e na Madalena", afirmou.

CENTRO SE SOMA À ASSISTÊNCIA À POPULAÇÃO DE RUA

Os protestos iniciais, noticiados em primeira mão pelo JC, tiveram repercussão nacional, sendo comentado pelo padre Júlio Lancellotti, conhecido pelas ações que promove através da Pastoral do Povo da Rua de São Paulo, durante uma missa.

"Nosso carinho e nosso afeto a toda população em situação de rua. Nossa saudação a todos que no Recife lutam para que o povo da rua não seja descriminado. E aos irmãos e irmãs de Boa Viagem, acolham os irmãos de rua! Não os rejeitem!", pediu o religioso, à época.

Hoje, a cidade conta com três instituições do tipo: o Centro POP Glória, situado na Rua Bernardo Guimarães, nº 135, em Santo Amaro, área central, o Centro POP Neuza Gomes, na Rua Dr. João Coimbra, nº 66, Madalena, e o Centro POP Maria Lucia dos Santos, na Rua do Imperador, nº 38, em Santo Antônio.

O espaço oferta banho, alimentação, guarda de pertences e encaminhamentos para outros serviços da rede municipal para as pessoas em situação de rua - 1.400, segundo última contagem da Prefeitura do Recife. Lá, elas também podem retirar novos documentos e recomeçar a vida. 

Segundo a gestão, a rede de acolhimento institucional da Prefeitura Recife oferece à população em situação de rua 17 equipamentos em todas as regiões do município. Atualmente, a rede abriga 528 pessoas, sendo 67 delas acolhidas em dois hotéis sociais que fazem parte do Programa Recife Acolhe.

A Secretaria Executiva de Assistência Social reforçou "que o poder público não realiza retirada compulsória das pessoas que utilizam os espaços públicos da cidade como local de permanência", mas realiza busca ativa em todos os territórios da cidade para criar vínculos e encaminhá-las aos serviços da rede socioassistencial.

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