Além da tensão com as Forças Armadas, Bolsonaro precisa administrar crise com policiais

Críticas do setor ao chefe do Executivo começaram a ganhar força no início do governo, com a reforma da Previdência, e ficaram mais intensas em 2021, com a aprovação da PEC Emergencial
Renata Monteiro
Publicado em 04/04/2021 às 9:00
Parlamentares bolsonaristas tentam usar a morte do policial militar Wesley Góes para se reaproximar de policiais Foto: Reprodução


Paralelamente à crise que está atravessando com as Forças Armadas, o presidente Jair Bolsonaro (sem partido) vem tendo problemas com outro grupo que o ajudou a chegar ao poder em 2018: as forças policiais. As críticas do setor ao chefe do Executivo começaram a ganhar força no início do governo, com a reforma da Previdência, e ficaram mais intensas em 2021, com a aprovação da PEC Emergencial, que trouxe consigo a possibilidade de congelamento dos salários de servidores públicos por um longo período.

Na última quinta-feira (1º), Luís Antônio Boudens, presidente da Federação Nacional dos Policiais Federais (Fenapef), afirmou que Bolsonaro "decepcionou" a categoria e que acredita que ele chegará a 2022 com menos de 20% de apoio entre esse grupo. Integrantes da União dos Policiais do Brasil (UPB), por sua vez, ameaçaram no início do mês até cruzar os braços por estarem se sentindo "humilhados" pelo governo federal. De acordo com o grupo, Bolsonaro não teria cumprido as promessas feitas à categoria durante a sua campanha.

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O estremecimento com a categoria neste momento acende um sinal de alerta para o presidente, que ainda tem nas bases das forças policiais brasileiras uma fonte de grande apoio político. Levantamento feito pelo Fórum Brasileiro da Segurança Pública em 2020 mostra que 41% dos soldados, cabos, sargentos e subtenentes (os praças) das polícias militares do Brasil fazem parte de fóruns bolsonaristas no Facebook. Deste total, 25% estão em grupos virtuais classificadas como "radicais" pelos pesquisadores.

Conscientes desse alcance, na última semana aliados do presidente tentaram, inclusive, incentivar motins nos Estados contra medidas de restrição impostas por governadores no combate à covid-19 para tentar se reaproximar dos policiais. Após a morte do policial militar Wesley Góes, da Bahia, que foi abatido após sofrer uma espécie de surto psicótico e realizar vários disparos no Farol da Barra, a deputada federal Bia Kicis (PSL) associou, sem nenhuma evidência, o caso a um ato de resistência contra o governador Rui Costa (PT).

Vice-líder do governo na Câmara dos Deputados, José Medeiros (Pode) chegou a chamar o militar baiano de "herói nacional" e o deputado estadual Soldado Prisco (PSC) tem usado as suas redes sociais para convocar militares a se manifestarem. "Sempre que há uma oportunidade, os apoiadores do governo instigam motins. Isso aconteceu quando houve a greve no Ceará, que foi uma coisa mais grave, e agora com o caso da PM da Bahia. Nesses casos eles sempre fomentam esse tipo de rebelião", observou o cientista político Vanuccio Pimentel, da Asces/Unita.

"O que os aliados do presidente têm feito, incentivando motins, é crime. A presidente da Comissão de Constituição e Justiça da Câmara, Bia Kicis, tentou fazer isso no Twitter, depois apagou o post. Se a intenção deles é tentar mobilizar essas forças de segurança para atuação a favor do governo, é muito improvável que isso aconteça", completou o cientista político Antônio Lucena.

De fato, depois das manifestações dos parlamentares bolsonaristas, poucas mobilizações militares foram registradas no País. O próprio governo da Bahia, estado onde o tema está mais quente atualmente, se pronunciou afastando, por ora, a possibilidade de rebelião dos policiais.

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