Em 2002, o professor do Departamento de Morfologia e Fisiologia Animal da Universidade Federal Rural de Pernambuco (UFRPE) Anísio Francisco Soares deu início a uma jornada que mudaria sua vida acadêmica e, consequentemente, a de dezenas de estudantes que, naquela época, não haviam nem ingressado na universidade. Entre aquele ano e 2006, ele esteve na França, fazendo doutorado após conseguir uma bolsa pelo programa do Comitê Francês de Avaliação da Cooperação Universitária com o Brasil (Cofecub) da Coordenação de Aperfeiçoamento de Pessoal de Nível Superior (Capes). Hoje, depois de ver o quanto a experiência enriqueceu sua formação, ele integra a Coordenação de Assuntos Internacionais da Assessoria de Cooperação Internacional da UFRPE e já ajudou a viabilizar o intercâmbio de mais de 60 alunos para universidades francesas.
O professor Anísio e a França não se separaram mais desde o doutorado. Natural de Paudalho, na Zona da Mata Norte do Estado, ele diz que a oportunidade foi um ponto decisivo em sua formação. “Passar quatro anos aprendendo lá foi muito especial, mudou minha perspectiva e abriu horizontes. Quando voltei, passei a fazer parte da Coordenação de Assuntos Internacionais e começamos a trabalhar para que outros alunos também tivessem essa oportunidade. Eu quero que eles possam ter essa experiência, assim como eu, que fui aluno que dependia da Casa do Estudante. Muitas vezes é inimaginável para um aluno em vulnerabilidade social estar em outro país se especializando ou finalizando pesquisas, mas graças à parcerias como esta isso se torna possível”, conta.
Desde 2011 a UFRPE está com três projetos no âmbito do Programa Brafagri - Capes. As parcerias proporcionam trocas entre alunos e materiais com sete universidades francesas. Uma delas é a Montpellier SupAgro, na cidade de Montpellier, onde o zootecnista Hugo Nascimento passou um ano, em 2018. A experiência foi tão boa que agora, formado, ele pretende voltar ao país europeu para se especializar. “É uma oportunidade ímpar. O Ciência Sem Fronteiras é um dos poucos programas que ainda proporcionam intercâmbios. Sou grato a essa parceria da UFRPE. Além de aprender outro idioma, pude conhecer outro lado da minha profissão e do mercado”, explica.
O dia 15 de setembro está sendo aguardado com muita ansiedade pela estudante de medicina veterinária Anny Alves, 22 anos. Essa é a data de seu embarque para a cidade francesa de Toulouse, onde vai viver por 10 meses enquanto se especializa em produção animal sustentável, na École Nationale Supérieure Agronomique de Toulouse. O intercâmbio sempre foi um sonho da estudante, que se preparou desde o 3º período. “Quando soube das parcerias, comecei a me preparar, fiz até curso de francês da Universidade Federal de Pernambuco (UFPE). Chega a ser inacreditável, porque sei que não teria condições de fazer uma especialização dessa se não houvesse um programa como o Brafragi. Financeiramente eu não teria a menor condição.”
As parcerias não beneficiam apenas alunos brasileiros e não dependem apenas de convênios diretos. Graças a uma bolsa oferecida pela Organização dos Estados Americanos (OEA), a equatoriana Tania Ortega está no Brasil há dois anos e meio. Nesse tempo a veterinária concluiu o mestrado e está iniciando o doutorado. Segundo ela, a escolha do país se deu pela possibilidade de fazer especializações. “No Equador, as pós-graduações são muito caras até em instituições públicas. Aqui está valendo muito a pena porque tenho todo o suporte para, mesmo com dificuldades e cortes, realizar minhas pesquisas e incrementar meu currículo”, explica.
As instituições federais possuem parcerias individuais que proporcionam a alunos e professores a troca de conhecimentos, pesquisas, tecnologias e intercâmbios. “Todas essas universidades têm um histórico longo de parcerias com instituições internacionais. A prática é antiga e o modelo adotado é muito exitoso. A ideia é fortalecer ainda mais, mas já temos muitos convênios de sucesso”, explica professor Iure Paiva, coordenador da Rede Nordeste de Tecnologias Sociais, criada em agosto deste ano com a missão de expandir as relações entre as universidades do Nordeste e as possibilidades que as esperam no exterior.
Parcerias entre universidades brasileiras e internacionais já existem há muito tempo. No Nordeste, elas também já acontecem e têm rendido bons frutos, mas agora ganharam um reforço e tanto. Um convênio inédito entre as 18 universidades federais do Nordeste e uma universidade japonesa pretende abrir portas para novas possibilidades no campo da produção científica nordestina. Com o foco em tecnologias sociais e o impacto delas na vida das pessoas, a iniciativa deu o primeiro passo para o início dos incentivos com a criação da Rede Nordeste de Tecnologias Sociais das Universidades Federais.
“Este é um excelente ponto de partida porque queremos, por meio dessa rede, dar visibilidade e promover aquilo que a gente faz e tem interferência direta na sociedade. A partir dessa percepção das nossas capacidades pretendemos atrair mais universidades, organizações internacionais e até empresas que estejam dispostas a ajudar a transformar o Nordeste em um destino acadêmico internacional”, explica o professor Iure Paiva, coordenador da Rede Nordeste de Tecnologias Sociais.
A Universidade Soka, de Tóquio, no Japão, será a primeira parceira no incentivo ao desenvolvimento destas tecnologias. O convênio tem como base o compromisso no desenvolvimento da cultura de paz e da justiça social. Mais que aporte financeiro, que até o momento não está sendo discutido, a intenção é a troca de conhecimento e prática na formação dos estudantes e pesquisadores. “Independentemente de cortes de verba pelo governo federal, parcerias são sempre mecanismos importantes porque trazem consigo toda uma bagagem de outros interesses muito fortes para as universidades, que é a melhoria da formação das pessoas, a troca de culturas e o aprimoramento de técnicas e conhecimento”, pontua a professora Rita Maia, assessora de cooperação internacional da Universidade Federal Rural de Pernambuco (UFRPE), que também integra a Rede de Universidades Federais do Nordeste (RENE).
A ideia é que, além de material científico e equipamentos, as universidades dêem oportunidade para que seus alunos e professores viajem em busca de mais conhecimento, segundo a representante da Soka Gakkai Internacional no Brasil, Silvana Vicente. “Estudantes daqui do Brasil terão oportunidade de ir estudar no Japão, assim como alunos de lá poderão vir ao Brasil para complementar suas pesquisas. O intercâmbio é uma das formas escolhidas para colocar o convênio em prática porque é extremamente rico para a formação desses pesquisadores”.
O convênio foi firmado este mês e a cerimônia concedeu ao pacifista, filósofo e educador Daisaku Ikeda, presidente e fundador da Universidade Soka, o título de Doutor Honoris Causa por seus esforços para a promoção da paz, da cultura e da educação.