Quando se fala em patrimônio histórico na área de Suape é inevitável não lembrar dos fortes e das ruínas do Parque Armando Holanda, na Vila de Nazaré, no Cabo de Santo Agostinho. O que pouca gente sabe é que Suape também guarda vestígios do passado canavieiro de Pernambuco. São capelas, vilas e casinhas de engenhos de açúcar perdidos no meio do mato. Mas poderiam integrar um roteiro de visitações.
Todo esse patrimônio está mapeado no Plano Diretor de Suape, Decreto Estadual nº 37.160 de 23 de setembro de 2011. É lá que estão assinalados os Engenhos Boa Vista, Jurissaca, Algodoais, Rosário (no Cabo), Tabatinga, Penderama e Mercês (Ipojuca). Ou o que sobrou deles. “Embora não tenham um grande apelo turístico, são importantes para a preservação da memória canavieira do Estado”, afirma o arquiteto Geraldo Marinho.
De 2008 a 2010, ele participou da elaboração do Plano Diretor e percorreu o Complexo Suape no Cabo e em Ipojuca, municípios do Grande Recife, para identificar trechos de interesse histórico. “Não é impossível incluir os engenhos numa rota turística, só é uma operação delicada. As edificações são relevantes do ponto de vista arquitetônico e arqueológico”, declara o arquiteto.
No limite entre a zona industrial e o setor de preservação ambiental, encontramos o Engenho Tabatinga, com seu arruado antigo, uma vila dos anos 40 do século 20 e uma igreja dedicada a Santa Luzia com cobras de duas cabeças decorando a fachada. A capela antiga, na mata, desabou há anos, e até hoje os moradores da região visitam o local (70 metros acima do mar) numa procissão no dia dedicado à santa, 13 de dezembro.
Com portas e janelas avariadas, a Igreja de Santa Luzia precisa de reparos, afirmam Édson Barbosa e Ivoneide Maria da Silva, que vivem no local. “Enviamos ofício à prefeitura, pedindo ajuda, e até agora nada aconteceu”, diz ela. Édson abre as portas do prédio e mostra os danos causados por cupins nas tesouras de sustentação do telhado, de madeira.
“O risco de o teto cair é grande, o cupim comeu muita coisa. Não há mais condições de se rezar missa aqui dentro”, afirma Édson, pintor desempregado. Pedaço do reboco de uma das paredes laterais desabou na calçada da capela e foi consertado por populares. “A maioria dos engenhos está esquecida, só restam ruínas”, lamenta. A procissão sai da igreja nova às 16h e sobe a colina até a capela em ruínas, com o andor carregado nas mãos.
Perto da PE-60, nas imediações de Cidade Garapu, a Igreja de Santana com o cemitério anexo é outra relíquia. Pelas características, possivelmente é uma capela do século 20, diz Geraldo Marinho. “Não é muito antiga, mas é singela e muito singular, solta no meio do nada, perdida no matagal”, comenta. O prédio está destelhado, com paredes rachadas e árvores crescendo no piso.
Do Engenho Algodoais restaram apenas ruínas da capela e da fábrica onde se fazia o beneficiamento do açúcar. A capela e o casario do Engenho Mercês, na área industrial, também são legalmente protegidos, afirma Geraldo Marinho. “Suape e o governo do Estado têm responsabilidades no reconhecimento e na proteção do patrimônio, esse compromisso está definido no Plano Diretor”, destaca.
O Decreto nº 37.160 prevê a construção de um plano de preservação e uso para cada uma dessas áreas, classificadas como Setores de Proteção Cultural, com a contribuição de Suape, da Fundação do Patrimônio Histórico e Artístico de Pernambuco (Fundarpe) e das Prefeituras de Ipojuca e do Cabo. “É preciso definir uma política de conservação e uma estratégia de conjunto, não se pode tratar esses vestígios de forma isolada”, diz o arquiteto.
O Plano Diretor, observa Geraldo Marinho, indica o reassentamento de posseiros que vivem nos engenhos. “Como a retirada dos moradores não será de imediato, até lá o que se fará nesses locais?”
Coordenadora de Sustentabilidade do Complexo Suape, Rafaela Viana informa que a empresa fez acordo de cooperação com a Unesco para a elaboração de projetos de restauração e recuperação dos monumentos. O trabalho, com duração de 24 meses, começou pelo Parque Armando Holanda, que ocupa 270 hectares. Mas deverá contemplar os 13.500 hectares de Suape. Os primeiros projetos, diz ela, ficarão prontos até o fim de 2016.
O parque teve prioridade pela complexidade e degradação, acrescenta Nílson Monteiro, diretor de Planejamento da empresa. Segundo ele, parte do patrimônio identificado no Plano Diretor encontra-se na poligonal de expansão de Suape. “Isso significa que não podemos atuar nessas áreas, ainda, porque não temos a posse”, explica, citando como exemplo a capela do Engenho Mercês. O Plano, com linhas de ação até 2030, será revisado em 2017.