Se realocar os ambulantes que atuam nas ruas do Recife sempre é motivo para queda de braço entre a categoria e a prefeitura, no entorno dos hospitais acontece o inverso: os comerciantes querem sair das calçadas, mas o município não consegue retirá-los. Um dos grandes desafios da Secretaria de Mobilidade e Controle Urbano (Semoc) é multiplicar o projeto executado no Hospital da Restauração (HR), pelo governo do Estado, que construiu uma praça de alimentação no estacionamento da unidade em 2011, com jardins, mesas, bancos e quiosques padronizados.
Enquanto a solução não vem, o que se vê no entorno dos hospitais são calçadas totalmente ocupadas por barracas dos mais diversos tipos e tamanhos e alimentos sendo manipulados no meio da rua, sem qualquer infraestrutura. Em frente ao Hospital Agamenon Magalhães, no bairro da Tamarineira, Zona Norte da capital, carroças de fruta chegam a parar na via. “Em campanha, Geraldo Julio disse que ia fazer como no HR, mas ficou na promessa”, reclama a ambulante Ivanise Correia, 38 anos, há 11 anos trabalhando no local.
“A gente quer ceder a calçada para a mobilidade dos pedestres, mas também garantir nosso espaço”, afirma a diretora de articulação do Sindicato dos Trabalhadores e Trabalhadoras do Comércio Informal (Sintraci), Jô Cavalcanti. “Na gestão anterior, a prefeitura nos apresentou projetos de praças de alimentação em todos os hospitais, fez promessas, cadastrou todo mundo e nada. Já sugerimos até um financiamento popular, para os ambulantes pagarem pelas barracas”.
O Hospital das Clínicas, ligado à Universidade Federal de Pernambuco (UFPE), recuou uma parte de sua área para dar espaço a 50 barracas (outras 70 estão projetadas para o entorno da UFPE) e desde o início do ano passado aguarda que a prefeitura faça a sua parte, instalando os quiosques. “O projeto está pronto e aprovado. Com isso, resolveríamos o desordenamento atual, haveria uma fiscalização da Vigilância Sanitária e os acompanhantes de pacientes poderiam se alimentar com maior segurança”, afirma o gerente administrativo-financeiro do HC, Marcos Viegas.
O secretário de Mobilidade e Controle Urbano do Recife, João Braga, diz que o ordenamento no entorno dos hospitais é uma de suas prioridades e não foi feito até agora por falta de recursos. “Mas estamos estudando uma solução para cada local. Até o próximo mês vamos começar a resolver o entorno do Hospital de Câncer de Pernambuco (HCP), em Santo Amaro, por meio de parceria com o empresariado”, informa. “Estamos formando comissões nas demais unidades para discutir o assunto. Já temos o cadastramento de todos. Esse comércio é necessário nos hospitais públicos”.
Um antigo cadastramento feito pelo Sintraci indicava 120 ambulantes no HC/UFPE; 36 no Hospital Barão de Lucena; 41 no Agamenon Magalhães; 10 no Getúlio Vargas e 20 no Oswaldo Cruz. Mas os próprios comerciantes afirmam que, com o desemprego, esses números aumentaram. O tema foi discutido em audiência pública no dia 5, por solicitação do vereador Ivan Moraes (Psol).
Diferentemente dos outros hospitais públicos do Recife, na maior unidade de emergência do Estado – o Hospital da Restauração – a praça de alimentação ocupada pelos antigos comerciantes da calçada é uma realidade. Inaugurado em junho de 2011, o espaço abriga 38 boxes e dispõe de mesas, cadeiras, lixeiras, bancos, jardins, água, energia elétrica e vigilância. Do lado de fora, outros ambulantes se arriscam a ocupar a calçada e a rampa da unidade, em alguns horários.
“A praça de alimentação faz a diferença em um hospital, mas é preciso ter gestão. Construíram isso aqui e deixaram largado, as plantas morreram e o local estava cheio de ratos e baratas, então a gente fez uma comissão e agora quem cuida somos nós”, relata o comerciante e administrador do espaço, Giovanni da Silva, 48 anos.
Segundo ele, a manutenção é feita com o pagamento semanal de uma taxa de R$ 35 por cada comerciante. “No café da manhã, almoço e jantar aqui está sempre lotado”, comemora. A única queixa de Giovanni são os camelôs que atuam do lado de fora. “Eles sabem o horário que a fiscalização vem, então chegam depois, por volta das 17h30 e ficam até as 23h. Quando saem, jogam o lixo pro lado da gente”.
Acompanhantes, médicos e demais funcionários do HR fazem uso do espaço. “O atendimento é melhor, tem mais conforto (a gente se senta), higiene e segurança”, avalia a técnica de enfermagem Edilene dos Santos, 31. Já a amiga de trabalho Karla Cristina de Barros, 29, diz que tem saudade das barracas na calçada. “Lá, era tudo mais barato. O ruim é que não tinha nem conforto nem segurança, como aqui”.