Unicef ouve mães de bebês com microcefalia para elaborar políticas de apoio

Iniciativa contou com roda de diálogo com mães, pais, profissionais de saúde e gestores, no Recife
Da ABr
Publicado em 19/04/2016 às 22:26
Iniciativa contou com roda de diálogo com mães, pais, profissionais de saúde e gestores, no Recife Foto: Foto: Diego Nigro / JC Imagem


Falta de atendimento, de organização, de apoio no trabalho. Os problemas enfrentados pelas famílias de bebês diagnosticados com microcefalia são muitos e agora estão sendo investigados por organizações ligadas às Nações Unidas em uma roda de diálogo com mães, pais, profissionais de saúde e gestores, no Recife.

A atividade é organizada pelo Fundo das Nações Unidas para a Infância (Unicef) e terá como resultado um relatório com recomendações elaborado pelos participantes. Durante o encontro, pais, enfermeiros, secretários de Saúde e pesquisadores deram testemunhos sobre os desafios no atendimento aos bebês que nasceram com a malformação.

A especialista em programas do Unicef, Tati Andrade, disse que as instituições que cuidam das crianças com microcefalia precisam se integrar para que as famílias não tenham que fazer grandes deslocamentos para fazer exames, consultas e terapias. “Ficou evidente a necessidade de articular melhor o trabalho entre as organizações para otimizar o trabalho. Esse trabalho tem sido muito grande, árduo, com bons resultados, Mas, principalmente para poupar as famílias de idas a várias organizações diferentes, é preciso uma melhor articulação.”

A representante do Unicef reconhece que o aumento expressivo da demanda, por causa da relação da microcefalia com o vírus Zika – que aumentou o número de nascidos com a malformação – exigiu resposta rápida dos serviços de saúde. No entanto, segundo Tati Andrade, ações simples, como o envio de exames feitos em uma instituição para a outra onde o bebê faz terapia, já ajuda as famílias a poupar tempo.

 

ATENÇÃO À FAMÍLIA

Outro ponto levantado durante o encontro é o atendimento mais humano às crianças e aos pais. “Por mais que o atendimento seja bom do ponto de vista profissional, em alguns serviços existe a necessidade de melhorar a humanização do atendimento”, acrescentou a especialista do Unicef.

Além da preocupação e cuidados com os bebês, a saúde mental e os direitos das mães também foram lembrados durante a atividade. “Todas as ações e propostas de políticas púbicas precisam ter a mulher como seu sujeito, e não objeto. Por mais que seja relevante tratar da criança e exterminar o vetor, não se pode esquecer que a mulher tem que estar no centro disso no sentido de garantir seus direitos sexuais reprodutivos, autonomia econômica e social”, disse a consultora regional da ONU Mulheres, Linda Goulart.

Segundo Liana, compartilhar o tempo de cuidado da criança com o pai é fundamental, assim como os trabalhos domésticos. “Ouvimos muito das mães que o tratamento da criança toma todo o tempo dela, de segunda a sexta, e quando ela chega à noite tem que cuidar da casa, dos outros filhos e até do marido”. Para que a divisão de tarefas no cuidado com os bebês com microcefalia seja justa também é necessária a colaboração dos empregadores, que muitas vezes não liberam as mães do trabalho sequer para levar o filho em uma consulta importante.

Uma das instituições ouvidas pelo Unicef foi a Fundação Altino Ventura (FAV), referência no tratamento dos bebês com deficiência visual decorrente do vírus Zika, transmitido pelo mosquito Aedes aegypti.

 

ATENDIMENTO ADEQUADO

A presidente da FAV, Liana Ventura, diz que uma das dificuldades para o desenvolvimento dos bebês com microcefalia é a demora no início do acompanhamento especializado.

“O que estamos comunicando à Secretaria de Saúde é que tem crianças que estão perdendo as janelas importantes do tempo de neuroplasticidade [capacidade de adaptação do sistema nervoso], que não estão em nenhum serviço fazendo reabilitação. Elas já estão com oito meses, nove meses, e nós sabemos que o desenvolvimento visual principal ocorre nos primeiros três meses a cinco meses de vida. É muito importante juntar esforços para que os setores envolvidos possam dar oportunidade a esses bebês uma maior qualidade de vida”, alerta.

A organização diagnosticou 256 bebês com problemas visuais, mas só pôde receber 130 em seu programa de intervenção precoce e reabilitação. “Nós temos espaço físico, e com a ajuda da sociedade temos condições de ampliar nossa capacidade. Precisamos de recursos humanos”, disse Liana Ventura.

Além de Pernambuco, também houve grupo de conversa sobre a microcefalia no Ceará. Entre as propostas que surgiram até agora das reuniões está a realização de um curso de férias em universidades para capacitar estudantes da área de Saúde a lidar com o tema. Segundo a especialista do Unicef, capacitar profissionais já formados também é um desafio. “Tem gente que tinha visto um ou dois casos de microcefalia na carreira, e agora precisam lidar com isso de forma rotineira”, comparou.

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