Barchef é parque de diversões gastronômicas

Num casarão tombado, restaurantes, pub e delicatessen funcionam ao mesmo tempo
Bruno Albertim
Publicado em 11/10/2013 às 6:45


Não é esnobismo. Desde a incursão pelo Mercado Paul Bocuse, em Lyon, seus corredores coalhados de ostras, terrines, brancos, espumantes, ouriços comestíveis, mais ou menos aquartelados em ambientes distintos, não via um complexo gastronômico tão superlativo. O melhor: essa Disneylândia do paladar dispensa a passagem parcelada nas faturas do cartão de crédito. Fica na minha própria cidade.
    Deleite, primeiro, para os olhos cansados numa cidade tão velozmente verticalizada, o Barchef funciona num casarão de 400 metros quadrados, tombado, memória concreta de um Recife patriarcalmente açucareiro, numa das equinas onde o Poço da Panela encontra a Avenida 17 de Agosto, em Casa Forte. Prédio branco, ladrilhos, varandas e um jardim enorme para os piqueniques quase proibidos nas áreas públicas. De quebra, apaixonado que é por arte contemporânea, Gilberto Bezerra, sócio com os irmãos Hélder e Bueno, forrou as paredes dos dois andares com obras de alguns dos mais interessantes artistas locais. Gente como Jeims Duarte ou Raul Córdula, todos com as peças à venda.
    Na casa, quatro ambientes de operações independentes se complementam. Se vai pela primeira vez, é preciso alguma orientação. Não é difícil se perder um pouco até entender a geografia local.
    No quintal, construção recente, funciona a delicatessen. Além de comida para se levar para casa, grifes da indústria gastronômica mundial que provocam desejo imediato de consumo, mais de mil rótulos de diferentes de vinhos. Na área externa da “deli”, poucas mesas com ombrelones para sanduíches, saladas, comida mais rápida, além de um elogiado atum selado, alto. O espaço abre às 8h, já para o café da manhã.
    Dentro do casarão, a comida, entretanto, ganha seus códigos mais gastronômicos. São dois ambientes, ambos sob o comando da chef Raline Aragão, pernambucana que talhou o talento em anos recentes de trabalho, in loco, na cena gastronômica espanhola contemporânea.
    O espaço Vinoteca é mais informal, aliás, elegantemente informal. Música alta, balada subliminar, o cardápio é basicamente uma série de petiscos para os drinques feitos com devoção de alquimista pelo mixologista Luciano Guimarães, paulista agora a serviço dos drinks pernambucanos. Mesmo os pouco devotos de misturas (como eu) se deixam levar por resultados sensuais, como o do Long Summer (sumo de tangerina, vodca, grenadine e gengibre). Vale, ainda que para abrir bem a noite.
    Aqui, predominam as tapitas: pequenas porções, para estimular o fôlego entre os goles. Os pequenos hambúrgueres de rabada, cozida, desfiada e refeita, com maionese caseira (R$ 15), valem cada dentada. Com guacamole, o tartar de atum é lindamente cortadinho, peixe (pelo menos quando provado) fresco. Ou seja, nada da textura palhosa que estraga o melhor peixe do Ocidente. Queijos e presuntos podem ser demandados diretamente do estoque.
    No outro ambiente, um pouco (apenas) mais de formalidade. No Italian Grill, Raline Aragão dá uma ligeira “contemporanizada” à cozinha italiana, fugindo da obviedade de se ater apenas a massas e risotos – embora o risoto de pato confit, soltinho, molhado, amido bem liberado (R$ 56) e o fetuccine Alfredo (R$ 42), mereçam o lugar de clássicos. Já ouvi reclamações do Alfredo da casa, mas, sinceramente, a massa estava numa profusão de manteiga, creme e parmesão delicada e insinuante. De fazer querer voltar.
    Tanto no Vinoteca como no Italian, eles servem um steak tartar com fritas de fazer corar os fãs desse prato ancestral. O filé é rigorosamente picado na ponta da faca, temperado com ervas e livre do excesso de molho inglês que apaga o sabor incomparável da carne crua.
    Pois, o cardápio vai além das obviedades. Macio, tenro, o carré de cordeiro (R$ 68) vem numa crosta de ervas e molho de tinto. Cativante, a costela suína rosticciana (R$ 42) marina com calma antes de ser cozida em baixa temperatura para desprender seus sucos. É acompanhada de milho cozido e temperado.
    Mas valha-se, se tiver uma única escolha, de um bom branco fresco, gelado, para passar ótimos momentos diante da mesa. Servida apenas de sexta a domingo, a cascata refrescante (R$ 68) é uma cama de gelo com lulas, camarões, lagostins, mexilhões, ostras, refrescantes, marinhos, e molhos como azeite de ervas, aioli e um vinagrete de maçã verde que é de tirar a gente do sério.
    Terminado o jantar, não precisa ir embora. No antigo porão da casa, funciona um pub tipo irlandês, música vibrante, alta, nada careta. É mesmo um parque de vários brinquedos.
 Barchef – Avenida 17 de Agosto, 1.893, Casa Forte. Informações: 3204-8500.

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