Quando se fala da produção cinematográfica e de seus diretores, os nomes que vêm à mente são, em geral, masculinos. Em Pernambuco, a situação não é diferente e, apesar da intensa participação das mulheres na área, ainda há um desequilíbrio na representatividade de gênero no cinema do Estado. A presença das mulheres no audiovisual, e mais especificamente como diretoras, portanto, é mais vigorosa do que a falta de visibilidade e atenção a essas produções podem sugerir. Obras que partem da vivência e dos olhares delas destacam o protagonismo feminino e ganham espaço na grade da nona edição do Janela Internacional de Cinema, propiciando uma (ainda pequena) mostra da pluralidade das realizadoras locais, nacionais e internacionais.
Dirigido, escrito e produzido pela alemã Maren Ade, de Todos Os Outros (2009), Toni Erdmann venceu o prêmio da crítica em Cannes, este ano, e tem sido apontada como um dos melhores exemplares da comédia alemã recente. O longa conta a história de uma reaproximação entre pai e filha e tem exibição hoje, às 14h30, no Cinema São Luiz.
Primeiro curta da jornalista Fabiana Moraes, Dia de Pagamento problematiza a ideia de desenvolvimento que pautou mudanças no interior de Pernambuco. A diretora acompanhou a dinâmica de Rio da Barra, povoado de Sertânia, cortada por obras da transposição do Rio São Francisco, e como essa grande construção modificou, positiva e negativamente, a vida dos habitantes.
“Foi interessante ter passado por lá durante e após as obras porque pude observar o impacto da chegada e da saída. O filme é ambíguo, procuro não apontar o que é certo ou errado. Por um lado, você encontra pessoas que compraram a primeira casa, a primeira moto, que montaram um negócio por conta do movimento da construção. Por outro, não é um legado que fica. Uma das pessoas que conheci, por exemplo, chegou a ganhar cinco mil reais por mês durante as obras e, depois, passou a ganhar R$ 500. É uma contradição”, ressalta Fabiana.
O trabalho de Fabiana foi premiado como melhor curta no PirenópolisDoc – Festival de Documentário Brasileiro e ganha a primeira sessão em Pernambuco amanhã, às 16h45, no São Luiz, com reprise segunda, às 15h20, no Cinema do Museu.
Atualmente montando seu segundo trabalho audiovisual sobre a transexual Joicy, cuja rotina e transição Fabiana relatou em reportagem especial para o Jornal do Commercio, vencedora do Prêmio Esso, a realizadora observa que a ideologia patriarcal permeia todas as esferas da sociedade, inclusive o meio artístico.
“Quando se fala no cinema pernambucano, dificilmente se ressalta a produção de diretoras Adelina Pontual, Kátia Mesel, Dea Ferraz. É um recorte muito fechado nos trabalhos dos diretores”, aponta.
Dea Ferraz, cujo documentário Câmara de Espelhos estreou no 49º Festival de Brasília e será exibido segunda, às 19h35, no São Luiz, compartilha da visão de Fabiana. À época do lançamento do filme, que trata justamente do olhar masculino em relação às mulheres e das violências simbólicas e reais que o machismo produz, ela falou ao JC que, apesar de trabalhar com audiovisual há 15 anos, somente há pouco tempo teve dimensão da força feminina no cinema pernambucano.
“Em geral, é difícil você ver as mulheres em destaque e isso dificulta até que a gente se conheça e se articule. Atualmente, temos 18 realizadoras circulando com seus filmes por festivais do País e do mundo e isso tem que ser exaltado. Estamos nos articulando”, ressaltou ela, que é uma das integrantes do movimento Mulheres no Audiovisual PE.
Dentro desse contexto pulsante do audiovisual produzido por mulheres no Estado, outro destaque que integra a programação do Janela é Bárbara Wagner. A artista apresenta o curta Estás Vendo Coisas, que tensiona a questão do jogo de imagem e dos desejos dentro da cultura da música brega. O trabalho foi apresentado na Bienal de São Paulo deste ano. A projeção acontece segunda, às 17h30, no São Luiz.
Na mostra competitiva de longas, A Cidade Onde Envelheço, da mineira Marília Rocha, é um dos mais aguardados. Uma coprodução com Portugal, a obra foi a grande vencedora do Festival de Brasília deste ano, levando os troféus de melhor longa-metragem, direção, atriz e ator-coadjuvante. É exibido amanhã, às 19h, no São Luiz.
Materializando em discussão da representatividade feminina, o festival sedia, quinta, às 16h, no primeiro andar do Cinema São Luiz, a mesa Um Cinema Tomado Por Mulheres, com as presenças de Déa Ferraz, Juliana Lima, Marília Hughes, Nara Normande e a distribuidora Silvia Cruz. A mediação do debate feita pela jornalista e integrante do júri do Janela Carol Almeida.
A diretora Lucrecia Martel, um dos principais expoentes do cinema argentino, participa de uma conversa sobre a sua produção, terça, às 17h, no Cinema do Museu. A atividade será mediada por Kleber Mendonça Filho, idealizador e curador do Janela. Destaque do cinema latino-americano, Lucrecia é diretora dos longas O Pântano (2001), A Menina Santa (2004) e A Mulher sem Cabeça (2008). Inicialmente enquadrada no chamado “novo cinema argentino” dos anos 2000, a argentina circulou por diversos festivais, entre eles Cannes e Sundance. Seu filme mais recente, Zama, é uma coprodução com vários países, entre eles a Espanha, através da El Deseo, de Pedro Almodóvar. O épico, com Matheus Nachtergaele no elenco, encontra-se em fase de pós-produção e vai estrear em 2017.