Desde a 0h desta quinta-feira (2/11), encontram-se disponíveis no Globo Play os dez episódios de Treze Dias Longe do Sol. A minissérie de Luciano Moura, escrita por Elena Soárez e estrelada por Selton Mello, deveria estrear somente em janeiro, na TV aberta, mas aí a Globo achou que precisava de uma grande atração para comemorar o segundo aniversário de sua plataforma digital de streaming.
Selton Mello faz Saulo, o engenheiro responsável pela construção de um prédio enorme. O primeiro episódio chama-se Falha Estrutural e, de cara, Saulo, que está sendo cobrado para inaugurar logo o prédio, pede ao operário que coloque mais argamassa para tapar aquela rachadura no pilar. "Já colocamos", diz o mestre de obras. "Coloquem mais", insiste Saulo. O horror, o horror, o prédio vem abaixo. A partir daí, a narrativa desenvolve-se em duas frentes. No subsolo do prédio, onde estão os poucos sobreviventes, incluindo Saulo e a filha do dono do prédio, que veio fazer a vistoria - interpretada por Carolina Dieckman -, e na superfície, onde os responsáveis pela firma buscam um bode expiatório, a quem culpar pelo desabamento.
Para todos os efeitos, o povo lá embaixo está morto. Fazendo a ligação entre as duas partes, está o herói da história - Saulo é o anti-herói. Tão obsessivo quanto ele, o chefe dos bombeiros não desiste de escavar nos escombros buscando sobreviventes. Fabrício Boliveira é quem faz o papel. "P... ator, não é?", comenta o diretor Moura. "É uma das coisas de que mais me orgulho nesse trabalho. Ter colocado o 'Bolivar' nesse grande papel. Estamos vivendo um momento de afirmação das identidades e é bom que nosso herói seja um homem negro."
Selton Mello não chega a ser um anti-herói, mas ele transgrediu uma linha e foi num caminho sem volta que resultou na implosão. "A situação-limite faz com que apareça o melhor e o pior das pessoas. Vamos saber mais sobre o Saulo, o que o levou a cruzar essa linha, mas lá embaixo, ao iniciar a subida, ele estará buscando a remissão", explica a roteirista Elena Soárez.
"E aí, gostou?" é a primeira coisa que Selton Mello quer saber, numa entrevista por telefone, de Roma. Selton está na capital italiana participando do Festival de Roma com O Filme da Minha Vida. "Nunca estive num festival como Cannes e isso aqui está sendo um barato. O Festival de Roma é bem grande. Estamos participando da mostra principal, competitiva, com os Irmãos Taviani e Steven Soderbergh. O Filme da Minha Vida já teve sua sessão oficial, com direito a Q&A (pergunta e resposta) no fim da exibição. Deu para sentir que o público ficou motivado".
Num ano difícil para o cinema de autor brasileiro, Selton Mello comemora como uma vitória os 300 mil espectadores que conseguiu com sua adaptação do livro do chileno Antonio Skármeta, de O Carteiro e o Poeta. "É muito menos que os 600 mil de O Palhaço, mas neste ano não dá para ficar reclamando. O filme já está nas plataformas de streaming, e a resposta do público é muito boa. As pessoas se ligam nas questões propostas pelo filme. Família, paternidade (o livro chama-se Um Pai de Cinema)".
"Embora os números não sejam espetaculares, o feedback para a gente sempre foi muito bom", continua. E o Treze Dias Longe do Sol? "Cara, voltei a trabalhar muito como ator recentemente, mas nunca tinha feito nada parecido. Um filme com muita ação física e elementos de disaster movie, embora não seja realmente um filme-catástrofe".
Ele considera Luciano Moura "um grande diretor". Elena Soárez "é essa superroteirista. Fizeram um trabalho muito bonito". Mesmo assim, Mello vacilou. "Sentei-me com ele mais de uma vez para longas conversas. O Selton temia até pelo risco físico, mas gostava do roteiro, e isso foi fundamental. Quando entrou, veio de cabeça, como todo o mundo", conta o diretor.
E Selton - "Luciano tinha uma consciência muito grande do que estava fazendo. Elena, também. Ela pesquisou muito para criar esses personagens, as situações. As curvas (dramáticas) são muito fortes". Para o público que começa a ver Treze Dias, será difícil não fazer a liga. O prédio que implode é o Brasil, a subida pelos escombros tem a ver com o esforço ético de reerguer essa nação.
O segundo episódio é Tem Saída. O País tem saída? "Olha, não vou dizer que a gente fez para refletir sobre isso, mas essas coisas estão no ar. Elena define essa situação como um caldo que entranhou na gente e do qual não conseguimos fugir", reflete Moura.
Há uma gama muito rica e variada de personagens secundários. São interpretados por atores recrutados de todo o Brasil. Os temas não são só a sobrevivência, a corrupção. Tem gente saindo do armário, casais implodindo com o prédio. Por que Selton Mello? "Porque eu precisava de um ator que segurasse a complexidade do personagem", diz Moura. E Selton, não tem vontade de dirigir na Globo? "Eles vivem me convidando, e acho que agora vai. Apresentei a sinopse de O Alienista, de Machado de Assis, que quero muito fazer. Vai ser uma minissérie também de dez capítulos".