Coletânea de contos do autor de Trainspotting chega ao Brasil

Requentando repolhos, do escocês Irvine Welsh, traz oito contos dentro do universo "junkie" escocês
Renato Contente
Publicado em 29/07/2012 às 9:47
Requentando repolhos, do escocês Irvine Welsh, traz oito contos dentro do universo "junkie" escocês Foto: Divulgação


“Jason! Não fica parado aí, porra, vai pegar as pernas da mamãe! Dá uma mão ali!”. É com esta ordem sórdida, dada ao filho de nove anos, que o escocês Mark reage ao ver que a esposa acabou de ter as pernas decepadas por um trem. Segundos depois da tragédia, enquanto via a mulher rastejar sem pernas até a plataforma da estação (“apoiada nos braços flácidos e deixando um rastro de sangue”), sua única preocupação era perder a final do futebol que assistiria mais tarde na tevê. A situação bizarra é o mote de uma das oito histórias reunidas em Requentando repolhos – contos de degeneração química (Rocco, 288 páginas, R$ 39,50), coletânea de contos do igualmente escocês Irvine Welsh.

Reverenciado por uns, constestado por outros tantos, foi a partir de Trainspotting (o aclamado romance de estreia de 1993) que Welsh ganhou da crítica o título de cronista da geração “junkie” dos anos 1990 – sobretudo a ambientada em Edimburgo, capital da Escócia, e arredores. Como em Requentando repolhos, lançado lá fora em 2009, praticamente todos os textos que vieram depois da bem-sucedida estreia recorrem a personagens imersos no mesmo universo de drogas pesadas, sexo e violência. Algumas personagens de Trainspotting, inclusive, foram requentadas para protagonizar histórias na coletânea referida e em outras obras.

O título despretensioso faz referência à origem dos textos. À excessão do inédito Eu sou Miami, todos os contos foram coletados de jornais e coletâneas literárias publicadas nos anos 1990 (no geral, segundo o Welsh, estas eram “aquelas antologias nojentas que exploravam as fraquezas dos escoceses ou o tema das drogas”, onde o próprio autor se inclui). Com oito contos – alguns com largura de novela –, a compilação passeia por temas como escatologia, abdução extraterrestre, homofobia, misoginia e alterações mentais, todos narrados com o humor malicioso característico do autor de Trainspotting. Na edição brasileira, destaque para a tradução cuidadosa de Paulo Reis e Sérgio Moraes Rego, que se mantiveram fieis às características orais repletas de gírias de Welsh.

Culpa católica (Você sabe que adora isso) traz as angústias de um homofóbico que surta ao transar com a irmã gêmea do melhor amigo. O ódio por rapazes que diferem de sua orientação sexual, de tão entranhado em sua cabeça, virou reflexo capaz de interromper a respiração e fazê-lo suar frio. Quando perde o controle e calcula o risco de ser repreendido (suas vítimas recorrentes são travestis que estão na rua de madrugada), ele não hesita em executar a covardia para garantir satisfação imediata. Junto à história de abertura e Disputada, esta tem um dos melhores desfechos do livro e expressa o domínio de Irvine Welsh sobre o ritmo de narrativas curtas. Mais angústias vinculadas a neuroses desmedidas vem com O namorado de Elspeth, que apresenta um conturbado almoço em família em que um sociopata – na verdade Frank, de Trainspotting – implica com o novo cunhado. As histórias seguem com Beijando e fazendo as pazes, O incidente de Rosewell, A festa (o que melhor exprime a intimidade do autor com o universo junkie), Disputada e Eu sou Miami.

Requentando repolhos serve como um compacto manual do que é politicamente incorreto e humanamente absurdo (este, a depender do referencial). Os tipos retratados no livro – amorais, frios e egoístas –, não se limitam à ficção e, como no mundo real, vivem à espreita por alguma porção de afeto.

Leia a matéria completa, curiosidades e trechos do livros no Jornal do Commercio deste domingo (30), no Caderno C

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