Rompendo estereótipos, dupla apresenta 'garotas-kaijins' como heroínas

Os ilustradores caruaruenses do estúdio Sapo Lendário criaram um crowdfunding para lançar 'GirlsJin', obra influenciada pelos tokusatsus
JC Online
Publicado em 18/07/2018 às 12:10
Os ilustradores caruaruenses do estúdio Sapo Lendário criaram um crowdfunding para lançar 'GirlsJin', obra influenciada pelos tokusatsus Foto: Foto: Divulgação


No mundo inteiro, há jovens fascinados pela cultura pop oriental. Gente que cresceu lendo mangás e assistindo a animes e tokusatsus. Estes últimos – para quem desconhece o termo – representam filmes e séries live-action de ação e fantasia produzidas no Japão com ênfase nos efeitos especiais. No Brasil, um grupo específico do gênero que se popularizou nos anos 1980 e 1990, sobretudo por conta das exibições na extinta TV Manchete, foi o Super Sentai. Os Power Rangers, por exemplo, são uma franquia “americanizada” do formato, que costuma trazer os sentais (equipes de três a cinco heróis, comumente cinco, cada um vestindo um uniforme de cor diferente) duelando contra os kaijins (monstros humanoides).

Fãs declarados da cultura nipônica, os designers e quadrinistas caruaruenses Júnior Ramos e Natália Lima, proprietários do estúdio de ilustração Sapo Lendário (como também se autodenominam), resolveram romper com a tradição dos tokusatsus, apresentando uma nova visão acerca dos vilões, os kaijins. “Para nós, os super sentais, os metal heroes, ultras e todos os outros tipos de super-heróis do gênero não são visualmente tão atrativos quanto os monstros”, declarou Júnior. Atrelando essa perspectiva à questão de que essas produções ainda trazem uma grande quantidade de heróis masculinos e/ou heroínas hiperssexualizadas, o casal desenvolveu o conceito “GirlsJin”, que, segundo o ilustrador, é a combinação de “garotas fodas mais monstros bonitos”.

As GirlsJin são as protagonistas de um projeto homônimo que engloba o primeiro volume de uma HQ (30 páginas), um manual gráfico com morfologia e habilidades das “garotas-monstro” (70 páginas) e o backstage (6 páginas), que traz um making of de atuação das personagens, como se elas estivessem dentro de um programa de TV. Na narrativa quadrinizada, os sentais são “os terríveis” e as “mocinhas”, 31 garotas da patrulha espacial, se transformam em kaijins para defender o universo. Uma inversão de papéis que ajuda a lançar luz sobre o estereótipo da vilania, a ressignificação de pensamento e a emergência de novos paradigmas na produção de conteúdo ficcional (o que não deixa de ser um espelho do cotidiano existencial).

“Todo nosso trabalho é cheio de referências às coisas em que acreditamos, dentro de um conjunto de símbolos, ideias e críticas”, afirmou o ilustrador, enfatizando que a dupla sempre procura ter mulheres fortes em suas histórias. Quando questionado sobre o porquê desse número 31, Júnior explicou que as personagens surgiram a partir do projeto InkGirls, que ele e Natália vêm produzindo desde 2016 a partir do desafio #Inktober, no qual desenhistas são desafiados na internet a fazer uma ilustração por dia durante o mês de outubro. As GirlsJin, no caso, surgiram a partir da proposta lançada em outubro passado.

No traço, a influência da cultura nipônica é nítida, assim como o uso de elementos do folclore japonês no estudo de personagem, a exemplo dos acessórios e das vestimentas. O resultado exibe um desenho bem-acabado que mescla história e pesquisa com ambientação intergaláctica. “Eu cresci na frente da TV, acho que absorvi muito dessa cultura dos tokusatsus, mechas e do que conhecemos aqui como ‘do Paraguai’, sabe? Aqueles brinquedos pebas? Daí, quando eu conheci a Natália nos juntamos nisso e levamos para o nosso trabalho”, contou Júnior.

As referências para o desenvolvimento do “bio-manual”, bastante detalhado ao apresentar as estruturas biológicas das personagens, partem tanto de filmes, HQs, games, brinquedos e RPGs quanto de livros de botânica. “O manual é muito técnico, mas cada informação presente tem ligação com a história, nada está ali por estar. Muitas pessoas que nos acompanham já esperam por algo inovador quando lançamos um novo projeto e, por isso, dentro das nossas limitações, tentamos caprichar no design e criar algo fantástico, um universo próprio”, afirmou.

Diferentemente da maioria esmagadora das parcerias, no processo criativo do Sapo Lendário, não há uma divisão precisa de tarefas. “Para muita gente é difícil compreender nossa metodologia de trabalho, já que fazemos todas as etapas juntos, do rascunho à finalização. É claro que em certos casos um de nós acaba desenvolvendo algo sozinho. Natália está sempre um passo à frente com relação às tabelas de cores, mas ambos colorimos. Quando produzimos HQ, eu costumo estruturar toda a história, enquanto ela organiza os diálogos, mas juntos revisamos todos os detalhes”, explicou Júnior.

As páginas são ilustradas e finalizadas à mão com nanquim ou lápis Verithin e coloridas digitalmente. “Nós somos adeptos das ferramentas tradicionais e temos as nossas preferências, como as tintas guache e acrílica, mas como um quadrinho tem várias páginas, fica pesado colorir à mão”.

Crowdfunding

Para que o projeto ganhe vida, assim como o primeiro quadrinho do casal, Mono, de 2015, eles precisam de apoio financeiro. Por isso, criaram uma campanha de crowdfunding com recompensas robustas, que vão além dos já tradicionais cartões postais, pins, ímãs de geladeira, adesivos e marca-páginas. A dupla desenvolveu um board game chamado Invasão para que seus apoiadores possam interagir com o universo das GirlsJin, sendo simulados como tripulantes da patrulha dentro de uma perigosa missão. A ideia é que o livro, que aguarda financiamento no Catarse até este sábado (21) – tendo atingido mais de 60% da meta de arrecadação até o momento –, seja lançado durante a Comic Con Experience (CCXP), em dezembro na capital paulista.

“Mesmo que sejamos pernambucanos, nós nunca tivemos um bom incentivo por aqui. Neste momento, mais de 40% dos nossos apoiadores são de São Paulo, enquanto apenas 9% provêm de Pernambuco”, indicou o quadrinista, enfatizando que Sapo Lendário nunca obteve retorno financeiro em feiras especializadas realizadas localmente, com exceção da CCXP Tour, ocorrida em Recife em 2017.

Além do projeto GirlsJin, os caruaruenses estão para lançar a HQ Mosca, tendo já disponibilizado online um artbook com o concept dos protagonistas, que pode ser acessado através do Behance, plataforma que serve como portfólio da dupla. A previsão de lançamento é para 2019.

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