Maciel Salú homenageia a rabeca, sua companheira de vida, em novo álbum autoral

Em entrevista, o cantor e rabequeiro fala sobre seu quarto disco solo, que grava este mês no Fábrica
Alef Pontes
Publicado em 25/05/2015 às 5:33
Em entrevista, o cantor e rabequeiro fala sobre seu quarto disco solo, que grava este mês no Fábrica Foto: Ricardo Labastier/ JC Imagem


Atualizada às 14h01, da segunda-feira (25).

Após mexer vários nomes dentro da panela para escolher – com um misto de apreensão e muita alegria – o cantor, compositor e rabequeiro Maciel Salú finalmente decidiu o nome do seu quarto álbum, que está gravando este mês no Fábrica Estúdios: Baile de rabeca. Neste novo trabalho, o herdeiro da tradição da rabeca, filho do Mestre Salustiano – uma das maiores referências do instrumento popular no Brasil e fora daqui –, decidiu homenagear a companheira de vida e carreira.

Com 11 músicas autorais, em que os gemidos das quatro cordas se fazem bem presentes, Baile de rabeca enaltece o instrumento que o acompanha desde o início da carreira musical, fazendo dele o protagonista da obra. “A rabeca faz parte da minha vida. Foi nela que eu comecei a compor as minhas primeiras músicas, quando entrei na banda Chão e Chinelo. E foi nela que eu comecei a mostrar o meu trabalho, de Pernambuco para o mundo”, contou o músico, emocionado, em entrevista concedida durante os intervalos das gravações, no Fábrica, e que devem seguir até a próxima semana. 

A importância da rabeca na vida de Maciel é tanta que ele é o único instrumento de cordas tocado pelo músico – apesar de confessar que tentou aprender outros. “É uma coisa que já vem da tradição do meu avô João Salú e do meu saudoso pai Salú, além de outros mestres com quem aprendi, como o Luiz Paixão, Pereira e Pitunga”, revela. 

A intenção do disco, segundo conta Maciel, é divulgar ainda mais o instrumento, que se popularizou nos anos 1990, a partir de grupos como a Chão e chinelo e Mestre Ambrósio, inspirados pelos sons que saiam dos terreiros de cavalo-marinho na Zona da Mata Norte do Estado.

“É um instrumento que tem um som que realmente mexe com a pessoa. Um som que só a gente que toca pode falar como ele mexe com a nossa alma, com o nosso coração”, revelou o músico, abraçado à sua companheira. Assim como nos discos anteriores (A pisada é assim, Na luz do carbureto e Mundo) e agora ainda mais forte, a tradição popular do instrumento continua flertando com a modernidade proporcionada pelas modulações dos efeitos eletrônicos. 

Apesar do pinicado da rabeca estar presente em todas as músicas, Salú revela que, em cada uma delas, o instrumento aparece com nova roupagem. Entre outras coisas, graças aos pedais de efeitos que entraram de uma vez por todas em sua carreira. “Estou trazendo algumas novidades de arranjos com pedais na música. Além disso, esse disco não vai ter bateria e metais, como nos anteriores, mas vai contar com muita percussão, vocais, guitarra, baixo, cavaquinho. E por aí a gente vai levando”, adianta.

Para ele, aliar a sonoridade da rabeca aos efeitos é mais uma maneira de difundir o instrumento e desconstruir a ideia de que ele pode ser utilizado unicamente nas brincadeiras populares. Porém, essa utilização não vem sem cuidados e muito estudo, garante: “Essa modernização é uma coisa que eu tenho muito cuidado quando vou usar, pra não acabar fazendo uma coisa que não tenha nada a ver comigo e que também não vá ferir o trabalho”, pondera o rabequeiro.

“Eu acho que é muito bom quando você experimenta algo diferente, mas você precisa saber também o que vai usar. Não é chegar e pegar qualquer pedal de efeito. É preciso saber usar e fazer o arranjo”, afirma. “Eu acho que isso mostra que a rabeca é capaz de ser aliada a pedais, guitarras e baixo, e que não tem aquela coisa de ‘Ah, a rabeca é regional, é popular ou é contemporânea...’. Seja no popular ou no contemporâneo, a rabeca está presente”, pontua.

Em Baile de rabeca, são muitos os ritmos que constroem o balanço, unindo a bagagem da tradição de terreiro às referências daquilo o que Maciel gosta de ouvir. E, em sua sonoridade, o álbum promete trazer novidades como samba e cumbia, além do já conhecido forró rabecado. “Eu tenho influência de vários ritmos, além da minha história com o maracatu, cavalo-marinho, mamulengos, ciranda, coco e forró de rabeca, que são muito fortes na minha vida, eu escuto outras coisas, muita música cubana, rock africano, afrobeat, as coisas daqui também”, lista. Um outro ritmo também marca forte presença no trabalho, mas ele preferiu deixar na surpresa para o público. 

Confira entrevista em vídeo com o músico:

PARCERIA

Para fazer essa mistura, Maciel conta com a troca de experiência com o seleto time de músicos que lhe acompanham, alguns há mais de uma década: Rodrigo Samico (que também assina a produção musical ao lado de Salu) na guitarra e cavaquinho, Rogério Victor no baixo, Emerson Santana e Zé Mário na percussão e Nana Milet no backing vocal e percussão.

“Os caras estão todos fazendo com amor. São grandes músicos, e já faz tempo que eu trabalho com a maioria deles. Eu acho que essa união da gente faz com que o disco venha sair com todo o carinho e cuidado necessário. Eu gosto muito de trocar o diálogo, e eu acho que isso é fundamental”, conta Maciel.

Para bancar o disco, o primeiro trabalho totalmente independente do músico, Maciel fará uso de ferramentas de crowdfunding. A partir de hoje, a plataforma Kickante recebe uma campanha de financiamento coletivo voltado para o trabalho. Entre as recompensas, o público pode adquirir o disco autografado em formato de pré-venda, camisetas e uma coletânea com os três álbuns anteriores.

RABECA DE IMBUIA

Foi durante uma palestra que realizou para um grupo de jovens rabequeiros do projeto Conexão Felipe Camarão, em Natal, que Maciel Salu conheceu o luthier e construtor de rabecas Eloi de Souza. Não imaginava ele que, desta conversa e troca de experiências, acabaria voltando para casa com o sonho de uma nova companheira e fermento para uma nova canção. 

“Ele me mostrou umas cinco rabecas e teve uma que eu fiquei apaixonado. Eu gostei muito do acabamento que ele dá e teve uma em especial que eu gostei muito, mas ele disse que já tinha dono”, revela Salu. A rabeca, feita de cedro e imbuia, era uma encomenda, mas o artesão afirmou que podia fazer outra nos mesmos moldes. “Eu voltei pra casa e essa rabeca me deu inspiração pra fazer uma música, a cumbia Rabeca de imbuia, que está presente neste disco.” 

“Eu não vi a rabeca ainda, só de foto. Ela está muito linda e eu estou ansioso pra caramba pra chegar lá, tocar e juntar com essa minha outra parceira de vida”, falou emocionado, mostrando o instrumento que já o acompanhada. “Eu tenho certeza que vai ser mais uma parceira pra botar músicas no mundo”.

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