Marcelo Falcão começa pelo Recife a turnê de sua estreia solo, Viver (Mais Leve que o Ar). Dia 6 de abril, ele se apresenta no Classic Hall, casa de show ligada a Luan Produções, que produziu O Rappa durante uma década e agora cuida da carreira do vocalista da banda:
“Recebi outros convites de empresários, mas era tudo o mais do mesmo, optei pela Luan por me proporcionar uma ótima estrutura, e por já trabalhar com o pessoal há tantos anos”, explica Falcão, que também lançou o disco pela Warner Music, com a qual O Rappa ainda tem contrato.
Aliás, a volta do grupo foi aventada por ele, não apenas como uma probabilidade: “Acho que voltaremos da mesma forma como o Los Hermanos está voltando”.
No repertório da turnê do novo disco, confirma Falcão, estarão também canções de O Rappa: “Claro que vou cantar. São também minhas. Tudo o que tenho devo a O Rappa. Se tenho uma tia sendo medicada em um bom hospital devo ao Rappa”, comenta Falcão.
Ele lança o que não é exagero se chamar disco de uma vida. As canções que formam o repertório de Viver (Mais Leve que o Ar) foram formatadas ao longo de muitos anos:
“Ia gravando coisa, chegou a 650 arquivos, precisava de um lugar de confiança para guardar aquilo. Deixei um HD com Constança Scofield e Felipe Rodarte, da Toca do Bandido, que encontrei por acaso na Gávea. Quando fui fazer o disco, de 600 e tantas gravações, passaram a 70, dai caiu para 47. Havia ideias completas, outras apenas esboços. Parte está neste disco, daqui a seis meses pretendo fazer mais dois”, diz Falcão, em entrevista por telefone.
Os fãs de O Rappa não devem esperar canções incendiárias nos raps e reggaes deste disco. A faixa de abertura é confessional. “Hoje eu acordei/ acordei/ e decidi esquecer/ broncas e mágoas de outrora/ abrir o coração e todas as portas” canta em Eu Decidi, em que expurga sentimentos negativos.
Pelo menos metade das canções tem o amor por tema. Feito na segunda faixa, Quando você Olhar pra Mim: “Quando você olhar pra mim/ verá que seu único amor fui eu”.
Falcão diz que com tanta polarização na política e nas redes sociais canções assim são necessárias: “Pessoas brigando, esta coisa de fake news. As pessoas brigando mais por um partido do que pelo bem comum. No Rappa nunca levantamos bandeira de partido. Pode-se ser político cantando o amor”.
Tocam com ele o baixista Bino Farias (Cidade Negra), os tecladista João Fera (Paralamas) e Hélio Ferreira (Cidade Negra), o percussionista Marcos Suzano, Felipe Boquinha (O Rappa).
No naipe de metais, Edésio Gomes (sax tenor), Eneas Pacífico (trompete) e Vinicius de Souza (trombone).
Entre os convidados especiais, o jamaicano Cedric Myton (The Congos), Lula Queiroga (parceiro em Mais Leve que o Ar, e nos vocais em Viver), Fernando Magalhães, guitarrista do Barão Vermelho, e o maestro Artur Verocai, que assina arranjos de cordas em Eu Quero Ver o Mar, um arranjo que lembra os Beatles do Álbum Branco, uma critica política e social explicita:
“Se fazer de vitima neste país não dá/ pois te matam na rua por causa de um celular”.
No palco este repertório deve funcionar melhor, com a inserção de hits de O Rappa. Algumas canções são apreendidas com as primeiras audições, caso da faixa inicial. A maioria não. Além do que 66 minutos de áudio acaba resvalando para o cansaço.
Diz Aí, a faixa com Cedric Myton, tem quase oito minutos, minuto e meio de vocalise, isto numa canção com uma melodia repetitiva, e letra de protesto social cheia de lugar comum. O disco só surpreende mesmo na faixa que o fecha.
Inspirado por Jorge Benjor e Jorge Aragão, o primeiro pelas louvações a São Jorge, o segundo por uma versão da Ave Maria, Marcelo Falcão gravou A Oração de São Francisco de Assis (“Senhor, fazei de mim um instrumento de sua paz”), em levada de reggae, com os backing vocals formados pela mãe (Maria Selma) e tias do cantor (Ivonete e Maria das Mercês).