Duas frases. Foi como o Fundo Monetário Internacional se expressou após a vitória, no domingo passado, do partido de esquerda Syriza na Grécia, que recebeu do organismo o empréstimo mais importante da sua história.
Apesar do comunicado enxuto de segunda-feira, o FMI reafirmou o essencial: seu compromisso de seguir adiante na -turbulenta- relação com o país, que já dura cinco anos.
2010: o aliado incômodo
A história começa com um mau augúrio em 2010, quando o mundo inteiro olha angustiado a Grécia entrar em crise.
A missão parece feita sob medida para o FMI, que atua como salva-vidas de países a ponto de naufragar: empresta dinheiro para que eles voltem à superfície e exige em contrapartida uma revisão drástica de seu orçamento.
Curiosamente, os maiores críticos ao desembarque do FMI não se encontram neste momento em Atenas, mas em Bruxelas. Jean-Claude Juncker, então presidente do Eurogrupo, estima que não seria "prudente", enquanto o então presidente do Banco Central Europeu, Jean-Claude Trichet, rejeita essa solução, considerada "ruim".
A gravidade da crise no país afasta, contudo, esses receios. Em maio de 2010, a troika integrada por FMI, União Europeia e BCE estabelecem um plano de resgate para Atenas de 110 bilhões de euros.
2010-2012: primeiras desavenças
Os empréstimos, no entanto, não são entregues até que auditorias trimestrais verifiquem que Atenas cumpre com seus compromissos. Começam longas negociações nas quais o FMI desempenha o papel de vilão.
Enquanto elogia os avanços da Grécia, a instituição reitera que "falta muito por fazer" e cobra, a partir de 2011, a privatização para reduzir os déficits, ao mesmo tempo em que considera necessário "acelerar" as famosas "reformas estruturais".
Em maio de 2011, o FMI ameaça deixar de entregar o dinheiro do empréstimo caso falte "garantias" de reembolso.
Essa intransigência confere à instituição um lugar privilegiado nas manifestações contra a austeridade que se multiplicaram no país. Segundo uma pesquisa de maio de 2011, três de cada quatro gregos se opõe ao Fundo.
A direção do FMI muda em julho de 2011 mas a mensagem continua a mesma: o esforço da Grécia "não é suficiente", diz Christine Lagarde logo após assumir.
2012-2014: Negociação e mea culpa
Em março de 2012, os europeus e o FMI voltam a abrir a carteira e prometem um empréstimo de 130 bilhões de euros à Grécia, que continua em recessão.
Lagarde promete apoiar o país, mas fica cada vez mais difícil esconder sua impaciência. Em maio, menciona até uma saída "ordenada" do país da zona do euro antes de desatar fortes protestos quando pediu que os gregos que pagassem todos os impostos.
A tensão está no auge. A liderança da direita grega, Antonis Samaras, a ponto de virar primeiro-ministro, pede uma renegociação do plano da troika, o que lhe valeu uma resposta mordaz do FMI.
O tom muda em outubro de 2012, quando o Fundo se desculpa por ter subestimado o impacto da austeridade na Grécia. Menos de um ano depois, reconhece "fracassos notórios" no país.
As auditorias implementadas continuam parecendo extremamente árduas e os empréstimos são entregues com até um ano de atraso em relação ao calendário previsto.
Em abril de 2014 a calma se restabelece. Pela primeira vez em quatro anos, a Grécia retorna aos mercados e corta um excedente orçamentário. "A Grécia está no bom caminho", elogia Lagarde.
Mas novos bloqueios surgem e a aproximação das eleições gregas desperta crescentes necessidades de cortar os vínculos com o FMI.
2015: E agora?
No total, o Fundo emprestou aproximadamente 32 bilhões de euros a Atenas e em tese deve entregar mais 16,5 bilhões até 2016, para quando está previsto o fim da ajuda financeira.
A vitória do Syriza, que se opõe à austeridade e foi eleito com a promessa de renegociar a dívida, pode encerrar a complicada relação.