O secretário-geral da Organização para Cooperação e Desenvolvimento Econômico (OCDE), José Angel Gurría, afirmou nesta quinta-feira (5), que, com as finanças públicas sob pressão, o setor privado tem que fazer sua parte para ajudar no desenvolvimento do Brasil.
A declaração foi dada durante o seminário "Uma agenda positiva para o Brasil - Aprendendo com práticas internacionais", promovido pela Federação das Indústrias do Estado de São Paulo (Fiesp).
"Com as finanças públicas sob pressão, o setor privado tem de desempenhar um papel de destaque, mas para isso o governo deve assumir uma série de responsabilidades como facilitador de investimentos, assegurando uma estrutura regulatória e jurídica que seja apropriada aos investimentos produtivos de longo prazo", comentou. Ele explicou que o aumento de investimentos em infraestrutura pode dar sustentação à demanda no curto prazo e estimular o crescimento potencial no prazo mais longo.
Gurría reconheceu que o Brasil vive um momento decisivo, em parte em função do fim do super ciclo das commodities. "À medida que os ventos favoráveis dos preços elevados das commodities enfraquecem, e com a gradual normalização da política monetária dos EUA, as reformas estruturais tornam-se mais necessárias para um crescimento sustentável", alertou.
Segundo o representante da OCDE, uma agenda positiva pode ajudar a colocar o Brasil de volta em uma trajetória de crescimento mais sólida, justa e ambientalmente responsável. "É essencial um setor privado dinâmico, competitivo, produtivo, que esteja disposto a assumir seu papel na construção de um futuro melhor. Da mesma forma que o Brasil é um parceiro chave da OCDE, é indispensável que o setor privado seja um parceiro chave do governo", cobrou Gurría em discurso ao lado do presidente da Fiesp, Paulo Skaf, que tem criticado fortemente a política econômica do governo, em especial as propostas de aumento de impostos.
Gurría lembrou que, com o envelhecimento da população brasileira, o crescimento não será mais sustentado pela expansão da força de trabalho, como foi o caso dos últimos anos. Assim, "cada vez mais a produtividade passará a ser o principal fator de desenvolvimento".
Ele apontou, porém, que as evidências brasileiras nos últimos anos não são das melhores. Enquanto ao longo da última década a produtividade do trabalho dobrou na China e cresceu 33% na Colômbia e na África do Sul, no Brasil avançou apenas 12%.
"As reformas estruturais poderiam liberar um potencial inexplorado significativo para ganhos de produtividade, além de melhorar a competitividade, reduzindo o chamado custo Brasil", apontou. Entre essas reformas, estão a simplificação do sistema tributário, que é oneroso e muito complexo.
"O sistema atual tem muitos impostos indiretos, fragmentados, além de barreiras regulatórias e carga administrativa elevada para abertura e fechamento de empresa, registro de propriedades, execução de contratos e solução de insolvências", criticou.
Gurría salientou ainda que o Brasil não embarcou integralmente nas tendências globais que moldam a produção industrial. Segundo ele, o País é a economia menos integrada nas cadeias globais de valor entre os 40 países do banco de dados da OCDE e da Organização Mundial do Comércio (OMC).
O representante da OCDE disse que restaurar a confiança dos investidores deve ser uma das prioridades do governo. Ele também comentou que, mesmo em um momento desafiador, em meio à recessão, é importante atingir as metas de ajuste fiscal, fazendo isso de maneira favorável ao crescimento.
Ele disse que o governo já tomou uma medida importante nesse sentido, que foi estabelecer uma meta de superávit de 0,7% do PIB no próximo ano. "A determinação renovada do Banco Central em combater a inflação é também bem-vinda", acrescentou.
Gurría deixou claro que para manter os avanços no combate à pobreza e à desigualdade é essencial contar com boa gestão orçamentária. "O orçamento público é um contrato entre o Estado e os cidadãos, que descreve como os recursos serão alocados". Ele disse que os desafios são muitos, o tempo é curto e as apostas elevadas, mas com um diálogo construtivo é possível moldar as linhas de uma agenda positiva para a retomada do desenvolvimento brasileiro.