Neste sábado (2) completa um ano. Foram 365 dias que para uns passaram tão rápido quanto a velocidade com que, no dia 2 de maio de 2014, um vaso sanitário foi jogado do anel intermediário do Arruda e matou o soldador naval, Paulo Ricardo Gomes, de 26 anos. Para outros, que perderam um ente querido, o período se arrastou tão lento quanto a justiça que reclamam ainda não ter sido feita. Mas será. E o dia para isso já está pré-definido: 16 de junho de 2015. Data reservada pela 2ª Vara do Tribunal do Júri para começar, a partir das 9h, no Fórum Rodolfo Aureliano, em Joana Bezerra, o júri popular dos três acusados pelo crime.
O Jornal do Commercio apurou com exclusividade a informação que foi confirmada oficialmente, ontem, pelo juiz Jorge Luiz dos Santos Henrique, por meio da assessoria de imprensa do Tribunal de Justiça de Pernambuco (TJPE). Este é mesmo o dia previsto inicialmente para o julgamento de Everton Felipe Santiago Santana, de 23 anos, Luiz Cabral de Araújo Neto, 30, e Waldir Pessoa Firmo Júnior, 34, que vão responder por homicídio consumado e três tentativas de homicídio. Só falta o magistrado assinar o ato de designação de data de sessão do júri que, dependendo dos trâmites internos, deve ser feito na próxima semana.
Já tendo esperado 365 dias, a família de Paulo Ricardo agora vai contar os próximos 44 até o júri popular. “Estamos acreditando e confiantes. Desde o ocorrido, houve logo uma ação. A polícia trabalhou, a justiça trabalhou, até pela repercussão do caso. Estamos confiantes que o Ministério Público também vai fazer a sua parte. O país em que vivemos muitas vezes é injusto, a impunidade acontece, por isso tantos atos de barbaridade. Acreditamos que eles peguem a pena máxima para que seja abrandado esse sofrimento, essa dor”, disse o tio da vítima, Tiago Valdevino. No entanto, nada, nem a condenação do trio vai preencher o vazio que sente o pai do jovem (ver entrevista abaixo). Ainda muito abalada, a mãe não quis dar entrevista.
Naquela noite de 2 de maio 2014, a partida entre Santa Cruz e Paraná, pela terceira rodada da Série B do Brasileiro, terminou em empate por 1x1. Após o jogo é que veio a derrota. Do futebol pernambucano. Os integrantes da Inferno Coral, Waldir, Luiz e Everton, arremessaram dois vasos sanitários do Arruda. Um atingiu em cheio o “rival” da Torcida Jovem Paulo Ricardo que estava dando apoio à organizada coligada do Paraná. Ele morreu na hora. Outras três pessoas ficaram feridas. Os estilhaços da violência, no entanto, são sentidos por todos até hoje.
“Esse um ano não passou”
Há um ano José Paulo viu o filho sair de casa para não mais voltar. Nem parece. O quarto ainda está do mesmo jeito. Só que agora a prancha de surfe e a farda de soldador dividem espaço com a saudade, que preenche o vazio incômodo do recinto e do coração do pai.
JC – Como foi lidar um ano sem seu filho?
José Paulo – Passei 2014 e não soube o que foi Copa do Mundo, não tive Natal, nem Ano Novo. O ano não passou. Sempre é emoção falar dele (choro). Faz falta muito grande e não vai passar de jeito nenhum. É uma dor que não tem remédio que passe. O coração sempre está doendo. Eu não conhecia essa dor não. Toda hora você lembra. É como se ele tivesse feito uma viagem e vai voltar. Não acredito que ele morreu. Você nunca espera isso acontecer. Esse ano que passou sem ele é muito dolorido mesmo.
JC – O que o senhor lembra daquele 2 de maio de 2014?
José Paulo – Eu lembro que ele fez tudo o que gosta. Logo cedo fui surfar, depois ficou em casa. O jogo ia rolar e ele ainda estava dentro de casa. Ele foi para o jogo fazer a filmagem da torcida do Paraná. Ele não falou comigo, saiu sem se despedir.
JC – Na sua opinião, houve negligência por parte do Santa Cruz? José Paulo – Houve sim. Três indivíduos pegam uma bacia sanitária em um estádio de futebol e ninguém vê. O clube tinha que dar segurança. Inclusive, o pessoal do clube foi para a mídia dizer que ia procurar a nossa família e nunca ninguém veio aqui. JC – O que o senhor espera do júri que agora já tem data prevista?
José Paulo – Acho que quem comete um crime tem que pagar. Se ficar na rua provavelmente vai cometer outros. Quem é do mau só procura o mau. Eles cometeram um crime bárbaro que chocou não só o Brasil, mas o mundo. JC – Qual o seu desejo para o futuro do futebol?
José Paulo - Eu queria, não só no futebol, a paz em todo setor. Mas infelizmente está difícil porque está se matando por conta de uma camisa. Eu queria muito que acabasse essa violência porque futebol é alegria. Quem ganha sai e comemora. Quem perde, não pode fazer vandalismo. Como será o júri popular?
No dia 16 de junho, data prevista para o julgamento, sete pessoas da lista de convocados serão sorteadas para formar o júri. Defesa e acusação têm o direito de recusar até três, cada um. Formado o Conselho de Sentença tem início o depoimento das testemunhas. Depois começa o interrogatório dos réus e em seguida os debates de defesa e acusação. Após isso, os jurados votam, numa sala secreta, se consideram os réus culpados ou inocentes. Se houver absolvição, deixam o tribunal livres. Em caso de condenação, o juiz fixa a pena, considerando os agravantes ou atenuantes. Veja as linhas de defesa e acusação do caso. "O Ministério Público de Pernambuco vai sustentar que houve um homicídio com dolo direto. O ódio deles é com relação à Torcida Jovem e por isso arremessaram os vasos para atingir qualquer pessoa que estivesse ali naquele momento. Isso é muito grave. É um dolo direto, e não eventual”, sustentou o promotor Roberto Brayner "De todos os envolvidos no crime, o que teve a menor participação foi Everton. Não existem provas nos autos que o incriminem. Ele só fez arrancar e conduzir o vaso sanitário, mas não o arremesou. Nossa estratégia é retirar o dolo do crime, porque ele não teve a intenção de matar”, afirmou Adelson José da Silva, advogado de Everton
No Arruda, poucas mudanças Thiago Wagner Do Blog do Torcedor Um ano depois da tragédia que vitimou Paulo Ricardo pouca coisa mudou no Arruda. A principal medida foi o reforço das privadas, que agora são cercadas por blocos de concreto o que impede que elas sejam retiradas como feito há um ano.
A reportagem visitou o local nessa semana e constatou a falta de vigilância, mesmo às vésperas de um jogo importante como a final do Pernambucano, contra o Salgueiro, domingo. A equipe deu uma volta completa no anel inferior e entrou nos banheiros do Arruda sem ser barrada ou questionada por algum funcionário. Apesar disso, o presidente da Comissão Patrimonial do Santa Cruz, Antônio Luiz Neto, que presidia o clube em 2014, foi firme em dizer que o Arruda é um local seguro para a torcida. Segundo ele, o episódio da privada foi um caso isolado, que vitimou também o Santa. Além disso, ele cobrou soluções por parte das autoridades. “Acho que deveria ser feito um trabalho de identificação e punição dos marginais. Não é toda a torcida que é violenta”, disse.