"Este é o primeiro jogo de minha nova vida", afirma o repórter de rádio Rafael Henzel, sobrevivente da tragédia aérea que dizimou o elenco da Chapecoense e que neste sábado trabalhará na primeira partida do pequeno clube catarinense após o acidente, um amistoso contra o Palmeiras.
Henzel, 43 anos, é uma das seis pessoas que sobreviveram ao acidente que deixou 71 mortos em final de novembro, nos arredores de Medellin, onde a Chapecoense deveria disputar a final da Copa Sul-Americana contra o Atlético Nacional.
Os outros sobreviventes são três jogadores do clube -o zagueiro Neto, o lateral Alan Ruschel e o goleiro Jackson Follmann-, e dois tripulantes bolivianos, Ximena Suárez e Erwin Tumiri.
Para Follmann, o drama significou o fim de sua carreira de jogador. O goleiro precisou amputar uma das pernas. Neto e Ruschel, porém, estão em fase de recuperação e esperam voltar a vestir a camisa verde Chape nesta temporada que se inicia.
Enquanto não têm condições de entrar em campo, os sobreviventes desempenham um papel de ligação entre o espírito da equipe anterior -protagonista de uma epopeia que levou o clube da 4ª a 1ª divisão em cinco anos- e do novo elenco, reconstruído em tempo recorde.
Neto, que era o único titular da equipe anterior, teve papel essencial neste processo. Em 6 de janeiro, voltou ao vestiário da Chape, de muletas, para receber os jogadores recém-recrutados, antes do primeiro treino da pré-temporada.
"Quando encontrei com Neto pela primeira vez, foi um momento muito marcante na minha vida", contou à AFP Rui Costa, novo diretor esportivo da Chapecoense e que já trabalhou no Grêmio.
"Sou um cara muito racional, meu cargo exige isso, mas quando apertei a mão desse cara, tive uma descarga de energia, de coisas, boas, que é inexplicável",se emocionou o dirigente.
Há duas semanas, Neto comparece todos os dias, sem falta, à sede do clube para sessões de fisioterapia, e sua presença é fonte de motivação para os novos jogadores que se preparam para a árdua temporada.
"Sua recuperação está além das expectativas. Ele já consegue pedalar e fazer alguns exercícios", explicou à AFP Guilherme Carli, fisioterapeuta da Chapecoense.
"Ele sofreu uma ruptura do tendão rotular e uma lesão a nível da lombar. Vamos acompanhar a evolução de seu joelho, mas se ele não precisar ser operado, ele poderá voltar a jogar em três a quatro meses", prevê Carli.
Já Alan Ruschel se recupera nas instalações do Juventude, clube gaúcho, mas na sexta-feira viajou a Chapecó para acompanhar Neto, que começava a se sentir um pouco só.
"Normalmente, um jogador detesta as sessões de fisioterapia, mas eu adoro! Depois de tudo que passei, fico feliz em poder trabalhar todos os dias para tentar voltar a jogar o mais cedo possível", afirmou o lateral-esquerdo, em coletiva de imprensa.
"O clube precisa de nós e nós precisamos do clube", resumiu Ruschel, de 27 anos e que espera poder disputar em agosto a Recopa Sul-Americana contra o Atlético Nacional.
Os três jogadores sobreviventes estiveram presentes na Arena Condá neste sábado, antes do amistoso contra o Palmeiras, para receber o troféu da Copa Sul-Americana, atribuída à Chapecoense a pedido do clube colombiano.
Neto, Ruschel e Follman, este último em cadeira de rodas, entraram no gramado do estádio e foram recebidos com aplausos ensurdecedores.
Em seguida, receberam a companhia das esposas das vítimas, claramente emocionadas, que receberam as medalhas que pertenceriam aos maridos pelo título da Copa Sul-Americana.
Já Rafael Henzel foi responsável por anunciar o nome dos novos jogadores da equipe, um momento que o jornalista admitiu à AFP seria de muito nervosismo.
"Desde o acidente, aprendi a não me preocupar tanto com antecedência. Sei que quando o momento chegar as palavras sairão. Talvez essas palavras estarão impregnadas de lágrimas, porque não será fácil voltar a ver essa equipe com outros jogadores, mas será também um momento de felicidade", previa o jornalista.