Ex-bolsistas defendem cotas para negros na carreira diplomática brasileira

Eles defendem mudanças na política, para que os resultados sejam mais expressivos
Da Agência Brasil
Publicado em 25/10/2013 às 18:09


Brasília - Ex-beneficiários das bolsas de estudo de R$ 25 mil concedidas pelo Instituto Rio Branco e pelo Conselho Nacional de Desenvolvimento Científico e Tecnológico (CNPq) a candidatos negros interessados em ingressar Itamaraty destacaram a importância de iniciativas que ajudem a ampliar o número de afrodescendentes na carreira diplomática. No entanto, eles defendem mudanças na política, para que os resultados sejam mais expressivos.

Ouvidos pela Agência Brasil, eles lamentaram os resultados obtidos pelo Programa Bolsa Prêmio de Vocação para a Diplomacia – aprovação de 19 dos 319 beneficiários de 530 bolsas de estudo concedidas ao longo de 11 anos - e defenderam que o instituto estabeleça um mínimo de vagas a serem preenchidas por candidatos negros que atinjam um resultado satisfatório no exame de admissão à carreira diplomática, a exemplo das cotas que o instituto destina anualmente a pessoas com deficiência.

Desde que foi criado em 2002, até 2012, o programa destinou R$ 10,975 milhões para custear os estudos de 319 beneficiários. O total de bolsas chega a 530 porque vários beneficiários foram contemplados mais de uma vez, o que é permitido pelo regulamento. O recurso permite gastos em cursos preparatórios, professores particulares e material de estudo dos beneficiários.

“Qualquer cidadão vai reconhecer que os atuais resultados do programa são ridículos. Acho que, se a sociedade souber disso, ou vai exigir que o governo acabe com o programa, ou que o aperfeiçoe”, comentou o físico Ernesto Batista Mané Júnior, confrontando o valor do investimento em bolsas concedidas entre 2002 e 2012, quase R$ 11 milhões, com o número de aprovados na carreira diplomática.

Formado há quase dez anos pela Universidade Federal da Paraíba, Júnior fez doutorado em física na Inglaterra. Em 2011, foi selecionado pela primeira vez para receber a bolsa de R$ 25 mil, graças à qual se mudou para Brasília, onde funcionam alguns dos cursos preparatórios mais procurados pelos candidatos ao Rio Branco. No fim de 2012, mesmo não tendo sido aprovado no concurso do ano anterior, conseguiu a renovação do benefício ao ser aprovado em nova seleção da bolsa, recebendo mais R$ 25 mil.

“Mas não sou uma exceção (entre os que solicitam a bolsa). E é justo, já que a maioria das pessoas que passam no concurso do Rio Branco vem de família com boas condições econômicas. São pessoas que podem se dedicar exclusivamente aos estudos por vários anos”, declarou o físico, ao ser questionado se não teria condições de competir sem a bolsa.

Para ele, a bolsa não é suficiente para garantir a aprovação dos beneficiários no curso de formação do Rio Branco, mas dá condições aos candidatos afrodescendentes de se prepararem melhor. Por isso defende que o Itamaraty implemente o sistema de cotas sem acabar com as bolsas de estudo.

“A cota não exclui a concessão da bolsa, que é muito importante para qualificar recursos humanos. Agora, é fato que, se a cota de 10% de candidatos negros fixada para a primeira fase fosse estendida para o concurso como um todo, teríamos, anualmente, mais aprovados que atualmente”.

Bolsista em 2010 e 2011, Neylor Caldas Monteiro, 28 anos, elogia a política de ação afirmativa do Instituto Rio Branco e reforça a importância de o Brasil ter mais negros na carreira diplomática, mas faz algumas sugestões de aperfeiçoamento da iniciativa.

“Junto com o aspecto racial, o instituto deveria levar em conta a necessidade econômica do candidato à bolsa. Seria importante estabelecer cotas para o ingresso de negros (na carreira diplomática), como já ocorre com pessoas com deficiência. Além disso, entrevista (para a bolsa de estudos) tem que ter critérios mais objetivos, já que é complicado avaliar um candidato com base na redação e nas respostas sobre a experiência como afrodescendente”, comentou Monteiro. Para ele, as restrições à renovação do benefício estabelecidas em 2011 ajudam a ampliar o número de beneficiários.

“Acho justo que, depois do segundo ano recebendo a bolsa, o candidato que não conseguiu passar na primeira fase do concurso dê a vez para outro. Até porque, ele já acumulou conhecimento e material para seguir estudando sozinho. Isso evita que o candidato se acomode. Eu mesmo, quando fui renovar minha bolsa, conhecia quase todos os outros candidatos que também tentavam a renovação”, acrescentou Monteiro.

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