Crime por homofobia no Brasil é 80 vezes maior do que no Chile

De janeiro até hoje, foram 218 mortes de LGBT no país, dos quais 71 por tiros, 70 a facadas, 21 espancados, 20 por asfixia, 11 a pauladas e seis apedrejados
Da ABr
Publicado em 30/09/2014 às 17:21
De janeiro até hoje, foram 218 mortes de LGBT no país, dos quais 71 por tiros, 70 a facadas, 21 espancados, 20 por asfixia, 11 a pauladas e seis apedrejados Foto: Foto: Tânia Rêgo/Agência Brasil


Enquanto no Chile, onde a população total é de quase 18 milhões de pessoas, ocorreram quatro assassinatos de transexuais, travestis, lésbicas, bissexuais ou gays no ano passado, no Brasil, com mais de 200 milhões de habitantes, o número foi de 313 homicídios, segundo levantamento feito pelo Grupo Gay da Bahia (GGB). “Comparei esses índices e vi que a chance de um LGBT ser assassinado aqui é 80 vezes maior”, explicou o antropólogo Luiz Mott, um dos pioneiros do movimento no país.

Mott é o responsável pela pesquisa feita há mais de dez anos e baseada em notícias divulgadas pela imprensa e denúncias coletadas principalmente em cidades do interior do país, onde as estruturas de garantia de direitos humanos é mais precária. Segundo ele, 44% dos casos de homofobia letal identificados em todo o mundo ocorrem em território brasileiro.

Só no último mês foram registradas 16 ocorrências. De janeiro até hoje, foram 218 mortes de LGBT no país, dos quais 71 por tiros, 70 a facadas, 21 espancados, 20 por asfixia, 11 a pauladas e seis apedrejados, entre outros.

Apesar dos números apontarem que a maior parte dos casos envolvem gays (124), Mott explicou que os transexuais são, proporcionalmente, os mais afetados pelos crimes. “Enquanto os gays representam 10% da população, cerca de 20 milhões, as travestis não chegam a 1 milhão e têm número de assassinatos quase igual ao de gays”. Este ano, 84 travestis foram assassinadas, número bem superior ao de lésbicas (5) e bissexuais (2).

“Nunca se matou tantos gays e, sobretudo, lésbicas, que teve um número muito maior de assassinatos do que em anos anteriores”, lamentou Mott. Ele acredita que a única forma de redução de ocorrências fatais seria a criminalização da homofobia. Luiz Mott ressaltou que há um Brasil cor-de-rosa das paradas gays e um Brasil vermelho “que pode ser representado pelos crimes e por amostras dadas por pessoas públicas como (o candidato à Presidência da República) Levy Fidelix (PRTB). Se ele tivesse falado metade do que disse sobre negros já estaria preso”, destacou.

Fidelix declarou em um debate na TV Record, no domingo (28), que homossexuais precisam de atendimento psicológico e comparou a homossexualidade à pedofilia. Desde que a declaração foi feita, quase 3 mil denúncias de violação dos direitos da populac a o de transexuais, travestis, le sbicas, bissexuais e gays foram registradas pela Secretaria de Direitos Humanos da Presidência da República (SDH/PR) por meio de números como o Disque 100 e o Ligue 180, segundo assessoria de imprensa do órgão. A reportagem da Agência Brasil tentou contato com os responsáveis pela estatística, mas até o fechamento da matéria não foram indicados nomes que pudessem comentar os números e por que foi feita a relação entre a declaração do candidato e o volume de denúncias.

No Congresso Nacional, tramita, desde 2006 um projeto que altera a Lei 7.716, de janeiro de 1989, que trata dos crimes de preconceito de raça ou de cor, criminalizando a homofobia e incluindo a prática na lei. O texto está na Comissão de Constituição e Justiça do Senado desde o final do ano passado aguardando votação.

No cenário internacional, o Brasil liderou, ao lado de Uruguai, Chile e Colômbia, uma resolução que foi aprovada na semana passada pela Organização das Nações Unidas (ONU), estabelecendo que a entidade apresente um estudo sobre as violações contra homossexuais ocorridas no mundo. Essa resolução é um segmento de uma outra apresentada em 2011 sobre o mesmo tema”, explicou Camila Asano, coordenadora de Política Externa da organização não governamental Conectas Direitos Humanos, que desde janeiro de 2006, tem papel consultivo na organização.

Segundo ela, depois da apresentação do primeiro estudo sobre casos de violência, elaborado pela ONU, o tema perdeu espaço nas discussões da organização. Para Camila Asano, a nova resolução é uma maneira de assegurar as conquistas de três anos atrás. “Os grandes feitos dessa resolução, que o Brasil foi líder junto com a África do Sul, foram reconhecer como direito humano a orientação sexual e a identidade de gênero e de condenar a violência e a discriminação”, explicou.

A coordenadora da Conectas, que acompanhou as negociações na reunião deste ano, em Genebra, lembrou que a diplomacia brasileira precisou redobrar esforços para aprovar o texto que foi aprovado num placar de 25 votos favoráveis, 14 contrários e sete abstenções. “A resolução acabou gerando uma ira muito forte de países conservadores, como alguns africanos que criminalizam os homossexuais, como os islâmicos. O Brasil teve que usar de toda sua capacidade e vantagem diplomática para fazer a negociação e fazer com que o texto fosse aprovado. É uma vitória histórica”, disse.

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