A Agência Nacional de Mineração (ANM), responsável pela fiscalização das barragens brasileiras, conta com apenas 35 profissionais capacitados para atuar nas 790 barragens de rejeitos de minério - como as de Brumadinho e Mariana - em todo o País. Além disso, esses funcionários não trabalham apenas com esse tipo de barragem, sendo responsáveis ainda por outras atividades relacionadas a mineração, de acordo com informações do jornal Estado de S. Paulo.
O governo federal usa só laudos produzidos pelas próprias mineradoras ou por auditorias contratadas, que atestam a segurança das estruturas. A autorregulamentação é definida na Lei Federal 12.334, de 2010, e é adotado também em outros países.
Na legislação, são previstos dois tipos de inspeção: uma regular e uma especial. A primeira é realizada pela própria empresa, enquanto a segunda fica sob responsabilidade de uma equipe multidisciplinar contratada pela empresa, de acordo com orientações da ANM.
Segundo o geólogo Paulo Ribeiro Santana, da ANM, ouvido pelo Estado de S. Paulo, o risco das barragens é potencialmente mais alto se não houver fiscalização. "É claro que não da pra fazer nem uma fiscalização por ano em cada uma", diz o especialista. As fiscalizações in loco são feitas quando há discrepância grave nos documentos apresentados pelas empresas, ou seguindo rodízio esporádico dos técnicos.
Ele afirma que os 35 profissionais não trabalham exclusivamente com barragens de rejeitos, mas também inspecionando outras atividades relacionadas a mineração, como minas, pesquisa mineral, entre outras coisas. Além disso, Paulo destaca que o quadro de funcionários da agência é reduzido. "É tão pequeno que eu, geólogo, respondo pela assessoria de comunicação", diz.
Para obter o licenciamento ambiental, o processo está sujeito a um problema de conflito de interesses. Para o pedido ser aprovado, a empresa controlada pela mineradora precisa elaborar um documento que é feito a partir de informações repassados por ela própria.
Outro profissional da área ouvido pelo jornal ressalta que os documentos são "extremamente complexos", e com infinidade de dados e milhares de páginas. "Não há corpo técnico no governo para avaliar tudo isso, não há contraprova. O jeito é confiar nas informações fornecidas pelas empresas", pontua o especialista em geomorfologia Miguel Felippe, da Universidade Federal de Juiz de Fora (UFJF).
Quando a barragem entra em operação, a dona da estrutura é responsável pelo monitoramento da estabilidade do depósito. Eventualmente, como no caso de Brumadinho, outra empresa pode ser contratada para atestar estabilidade. Mas esse laudo é feito com base em dados fornecidos pela mineradora.
O geólogo Álvaro Rodrigues dos Santos, ex-diretor de Planejamento do Instituto de Pesquisas Tecnológicas (IPT), diz que, “sob quaisquer circunstâncias, a responsabilidade é do dono da obra”, pois pode haver algum princípio de instabilidade não detectado a princípio. Mas, ele pondera que um acidente do porte do de Brumadinho ou Mariana não acontece de repente. "Há avisos, que podem ser detectados visualmente ou por instrumentação".