Computador com cara de celular tenta levar informática a países pobres

Solução está em fase de arrecadação de recursos no site de financiamento coletivo Kickstarter
Folhapress
Publicado em 21/04/2015 às 14:59


Um computador com processador e aparência de smartphone (até com os ícones de apps, que funcionam até quando não se está conectado à internet). Essa foi a solução criada pela empresa Endless para o problema da dificuldade de uma parcela enorme da população mundial de comprar um computador.

De acordo com pesquisa realizada pelo Pew Research Center Technology em 32 países pesquisados, apenas 38% da população tem computador em suas casas. No Brasil, o índice é de 55%.

O Endless Computer, que está em fase de arrecadação de recursos no site de financiamento coletivo Kickstarter, utiliza um processador de smartphone, que além de baratear o custo de produção, deixa o computador com uma cara parecida ao aparelho celular, já conhecida entre os compradores. Além disso, o computador, que pode ser conectado à televisão, consegue funcionar off-line.

"É preciso ter em mente que os nossos usuários têm uma vida bem diferente da nossa. Às vezes eles têm acesso à internet, e outras vezes não. Por isso, desenvolvemos o computador para funcionar também off-line", diz Marcelo Sampaio, sócio e cofundador da empresa.

Segundo a pesquisa da Pew, uma média de 24% das pessoas entrevistadas e que eram dos países emergentes usam a internet por meio smartphones

Para atender essa demanda, o computador já tem alguns aplicativos em seu sistema e que funcionam sem a conexão da internet. Os diversos apps abordam temas como sobre saúde, educação e games.

"A educação é um grande pilar para nós", conta Sampaio. "Além do Wikipédia, também colocamos no sistema conteúdos da Khan Academy. São mais de 700 vídeos de curta duração sobre os mais variados temas", diz ele.

PESQUISA

O processo de elaboração do projeto foi acompanhado por uma série de pesquisas desenvolvidas pela empresa, e que foram feitas com os possíveis compradores do computador.

"Não adianta fazer essas pesquisas de longe, tem que estar perto das pessoas", diz Sampaio. Ele conta que alguns moradores das regiões em que eles atuam acabam trabalhando para a empresa na área das pesquisas.

Com base no Rio de Janeiro, a empresa também atua na Guatemala, no México e, recentemente, na Índia, Dubai, Jordânia, Líbano e Taiwan e pretende expandir sua atuação para mais países no futuro.

KICKSTARTER

Em menos de quatro dias depois do início da campanha de financiamento, o projeto já havia arrecadado o valor da meta proposta inicialmente (US$ 100 mil). Até esta terça-feira (21), US$ 112 mil haviam sido coletados.

Para Sampaio, Kickstarter funciona mais como uma forma de marketing, para dar mais visibilidade à máquina em diversos países -as recompensas para quem contribui com a arrecadação variam de canecas e camisetas até o próprio Endless Computer (para ter o produto, é preciso doar ao menos US$ 169).

Também será possível encomendá-lo nas lojas virtuais da empresa. Sampaio diz ainda que pretende estabelecer relações com o governo brasileiro para levar os computadores para a rede de escolas públicas do país.

ANÁLISE

No ano passado, a reportagem testou uma máquina da Endless que tinha o mesmo sistema operacional do PC lançado agora.

A proposta de oferecer um mini PC que possa ser usado até por quem nunca mexeu em um computador é cumprida. Embora o didatismo exagerado às vezes irrite -no começo, caixas de texto explicativas pulam na tela a cada clique- o sistema é simples, rápido e fácil de navegar.

O segundo objetivo, de oferecer a experiência completa de um desktop, mesmo quando não há conexão com a internet, deixa a desejar. Apesar de ser baseado em Linux, uma plataforma aberta e com milhares de desenvolvedores de aplicativos, o Endless só permite que sejam instalados aplicativos que estão em sua loja oficial -que, nos testes da reportagem, com uma versão desatualizada do sistema, eram pouco mais do que os 150 que já vêm embarcados.

Os fabricantes dizem que, conforme identificarem demanda, vão adicionar mais apps de Linux à loja. No futuro, também prometem abrir a plataforma para desenvolvedores. Por enquanto porém, os usuários terão que se contentar com a oferta limitada de aplicativos, voltados, em sua maioria à educação e saúde.

A decisão de restringir os aplicativos parece contraditória com o discurso dos fabricantes de que um computador barato não deve sacrificar a experiência de uso. "Eles [habitantes de países pobres] querem [consumir] o mesmo que nós [habitantes de países ricos], disse o fundador Matt Dalio em entrevista a revista "Wired".

Já a ideia de oferecer aplicativos que funcionam off-line para que o computador possa ser usado mesmo sem internet é interessante, mas não inédita. Um dos maiores atrativos do Endless, por exemplo -ter parte do acervo da Wikipédia disponível off-line- é oferecido por um aplicativo gratuito de Android, um sistema operacional que outros mais de 1 milhão de aplicativos desenvolvidos.

Fora as próprias limitações, o Endless terá que enfrentar a concorrência de ecossistemas já estabelecidos.

No código aberto, o maior exemplo é o Raspberry Pi, pioneiro dos computadores ultrabaratos, que já teve 5 milhões de unidades vendidas por US$ 35 cada.

Mais recentemente, as gigantes da tecnologia também entraram na disputa. A Microsoft tem uma parceria com fabricantes para vender computadores compactos por cerca de US$ 200. Um modelo da HP com configurações similares e custa US$ 179, com a vantagem de vir com uma versão completa de Windows instalada.

Já o Google, além dos seus Chromebooks -linha de notebook baratos- e dos smartphones Android, anunciou que lançará ainda neste ano um computador em forma de pendrive que custará menos de US$ 100.

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